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DOI: 10.5935/2177-1235.2024RBCP0877-PT
Síndrome de Mondor associada à mamoplastia de aumento: relato de caso
Article in several languages: português | English▪ RESUMO
A forma mamária da síndrome de Mondor é uma afecção rara e autolimitada que se caracteriza pela tromboflebite de veias superficiais da mama. Entender tal síndrome é de suma importância para o diagnóstico correto e o tratamento preciso e não iatrogênico, tendo em vista apresentar considerável relação com o carcinoma mamário. Esse relato de caso retrata o surgimento da síndrome de Mondor em uma paciente jovem de 22 anos, após uma mamoplastia de aumento. O sinal característico da afecção, o cordão fibroso, manifestou-se na mama direita a partir do vigésimo terceiro dia de pós-operatório, desaparecendo por completo após 10 semanas. O diagnóstico foi dado pelo cirurgião plástico que acompanhou a paciente mediante anamnese e exame físico, sem a urgência de um exame complementar, como a mamografia. Vale ressaltar que tal afecção rara pode acometer o sexo masculino - em menor frequência - e afetar outras regiões, como o pênis e o escroto. Ademais, é salutar reconhecer e diagnosticar a síndrome de Mondor, visto que as cirurgias com o fitoestético estão em constante crescimento na atualidade, com o escopo de conduzir os pacientes da melhor forma para um tratamento eficaz e menos invasivo (exceto na presença concomitante de câncer de mama, por exemplo), além de tranquilizá-los a respeito da afecção.
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INTRODUÇÃO
O presente artigo objetiva relatar o caso de uma paciente acometida pela síndrome de Mondor no pós-operatório de uma mamoplastia de aumento. A síndrome de Mondor é uma afecção rara, benigna e autolimitada em que ocorre tromboflebite dos vasos venosos periféricos da mama, podendo acometer até o sistema linfático da região, apresentando-se clinicamente como um cordão fibroso subcutâneo na parede anterolateral do tórax[1].
Assim, a importância do estudo urge em meio ao aumento exponencial das intervenções cirúrgicas estéticas no mundo, as quais, em 2019, atingiram 11.363.569 procedimentos, número 7,4% maior que em 2018, segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS)[2]. Ainda de acordo com a ISAPS, o Brasil, em 2019, era responsável por 13,1% dos procedimentos, totalizando quase 1.500.000 intervenções[2].
Somado a isso, a relevante associação da síndrome de Mondor com o carcinoma mamário requer preocupação para a doença[3]. Ademais, é fulcral orientar adequadamente os pacientes acometidos por essa afecção clínica, a fim de acalmá-los e tratá-los apropriadamente.
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RELATO DE CASO
M.C.G.M., paciente do sexo feminino, 22 anos, parda, estudante de medicina, natural de Sousa-PB e procedente de Natal-RN, realizou mamoplastia de aumento em 05/12/2020, tendo evoluído sem intercorrências no pós-operatório imediato.
No 23º dia pós-operatório, passou a queixar-se de dor progressiva (intensidade 5/10) e sem irradiação na região inferior da mama direita, com aparecimento de cordão fino subcutâneo de consistência endurecida e de temperatura elevada, sem fator desencadeante e de melhora, o qual direcionava-se ao quadrante superior direito do abdome, retraindo a pele ([Figura 1]).


Ao exame físico, confirmou-se a presença de um cordão fibroso que se iniciava na região inframamária e se estendia até o quadrante superior abdominal direito. O cirurgião plástico responsável pelo procedimento estético ao qual a paciente submeteu- se, apenas pelo exame físico, confirmou o diagnóstico de síndrome de Mondor.
A posteriori, o profissional orientou a paciente a fazer uso oral de Prednisona® 20mg uma vez ao dia, durante 7 dias, e a realizar compressa morna no local três vezes ao dia. Além disso, orientou a paciente a respeito da síndrome de Mondor - a qual reconheceu, portanto, o caráter autolimitado da afecção, conjuntura que reduziu o nervosismo da paciente e suas preocupações quanto à síndrome.
Houve remissão progressiva do cordão fibroso projetado sob a pele, o qual desapareceu por completo após 10 semanas, sem deixar quaisquer cicatrizes.
A paciente realizava terapia anticonceptiva sem orientação médica. No período de 8 meses antes da realização da cirurgia, estava em uso de Iumi®, um contraceptivo oral combinado.
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DISCUSSÃO
A síndrome de Mondor é quase dez vezes mais comum em mulheres do que em homens e atinge, primordialmente, a faixa etária média de 43 anos. Apresentando maior acometimento unilateral, com poucos relatos de surgimento bilateral, a síndrome de Mondor evidencia-se sem sinais sistêmicos[4].
Essa afecção apresenta associação, em até 12% dos casos, com o surgimento de carcinoma mamário, conjuntura que explica a preocupação em torno do seu diagnóstico[3] e torna eminente a necessidade de investigação da enfermidade causadora da patologia em discussão.
A etiologia relacionada ao desenvolvimento da síndrome de Mondor ainda não foi completamente esclarecida, com 50 a 60% dos casos tidos como idiopáticos[5]. Entretanto, sua fisiopatologia é similar à trombose venosa profunda (TVP)[6] e sua gênese também está relacionada à tríade de Virchow (estase, hipercoagulabilidade e dano endotelial)[7]. Acredita-se que a ação deficiente das válvulas venosas, por possibilitar o fluxo sanguíneo retrógrado, gera uma estase favorecedora da formação de trombos, que podem progredir com a agressão da parede vascular e a formação da fibrose venosa típica da síndrome em discussão[8].
O uso de anticoncepcionais orais eleva o risco de TVP à medida que aumenta a dosagem dos estrógenos. O estrogênio tende a aumentar os níveis de fatores de coagulação, reduz os níveis de antitrombina III e diminui o ativador de plasminogênio[9]. Alguns fatores de risco estão associados ao desenvolvimento da doença, como procedimentos cirúrgicos, câncer de mama, trauma, abuso de drogas injetáveis, seios pendulares, excesso de atividade física, gravidez, discrasia sanguínea, infecções e artrite reumatoide[9].
A lesão característica da síndrome de Mondor inicia-se com o surgimento de um cordão arredondado, doloroso e de coloração avermelhada, que progride para uma grossa linha fibrosa e indolor[10], cuja estrutura torna-se mais evidente com o movimento de abdução do braço. O aparecimento do cordão fibroso está limitado, preferencialmente, à região inframamária, tendo seu surgimento até a quarta semana de pós-operatório e remissão total até a oitava semana[4].
A priori, a clínica do paciente com síndrome de Mondor é caracterizada por dor, aumento do volume da mama e retração da pele na altura da lesão, a qual pode ser identificada como um cordão fibroso ou massa palpável, no exame físico. Além disso, o paciente pode ser assintomático ou até mesmo ter sintomas menos comuns, como febre, equimose e inflamação da pele[5].
A mamografia é um exame que pode ser solicitado, observando-se uma densidade tubular, dilatada, longa e superficial, dado um aspecto de “contas de rosário”, sendo, com isso, sugestivo de trombose da veia afetada[4]. A importância desse exame dá-se, sobretudo, pela possibilidade de diagnóstico de neoplasia mamária não palpável.
O tratamento da síndrome de Mondor é apenas sintomático. Geralmente, utiliza-se compressa morna no local da tromboflebite e recomenda-se o repouso, o uso de analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais. Ao médico e examinador, é essencial esclarecer ao paciente sobre o caráter benigno e autolimitado da afecção, acolhendo suas preocupações.
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CONCLUSÃO
À luz dessas considerações, conclui-se que a síndrome de Mondor é uma rara afecção e tem como principal característica a presença de um cordão fibroso ocasionado pela formação de um trombo, sendo a mama a região do corpo humano mais acometida -surgindo como uma complicação da cirurgia de mama, mas podendo acometer também o sexo masculino em menor proporção, atingindo preferencialmente regiões de pênis e escroto.
Por fim, vale salientar que é uma condição benigna e autolimitada (com início, meio e fim), mas que, em função de sua relação com o carcinoma mamário, requer atenção para seu diagnóstico.
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Conflitos de interesse:
não há.
Instituição: Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.
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REFERÊNCIAS
- 1 Faucz RA, Hidalgo RT, Faucz RS. Doença de Mondor: achados mamográficos e ultra-sonográficos. Radiol Bras 2005; 38 (02) 153-155
- 2 International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS). International Survey of Aesthetic/Cosmetic Procedures 2019. Mount Royal: ISAPS; 2019
- 3 Catania S, Zurrida S, Veronesi P, Galimberti V, Bono A, Pluchinotta A. Mondor’s disease and breast cancer. Cancer 1992; 69 (09) 2267-2270
- 4 Becker L, McCurdy LI, Taves DH. Superficial thrombophlebitis of the breast (Mondor’s disease). Can Assoc Radiol J 2001; 52 (03) 193-195
- 5 Pasta V, D’Orazi V, Sottile D, Del Vecchio L, Panunzi A, Urciuoli P. Breast Mondor’s disease: Diagnosis and management of six new cases of this underestimated pathology. Phlebology 2015; 30 (08) 564-568
- 6 Sobreira ML, Yoshida WB, Lastória S. Tromboflebite superficial: epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento. J Vasc Bras 2008; 7 (02) 131-143
- 7 Alvarez-Garrido H, Garrido-Ríos AA, Sanz-Muñoz C, Miranda-Romero A. Mondor’s disease. Clin Exp Dermatol 2009; 34 (07) 753-756
- 8 Khan UD. Incidence of mondor disease in breast augmentation: a retrospective study of 2052 breasts using inframammary incision. Plast Reconstr Surg 2008; 122 (02) 88e-89e
- 9 Favarin GJ, Favarin E, Rocha LPS, Horner C. Mondor’s disease, case report and literature review. Arq Catarin Med 2016; 45 (02) 102-106
- 10 Piccinato CE. Trombose venosa pós-operatória. Medicina (Ribeirão Preto) 2008; 41 (04) 477-486
*Autor correspondente:
Publication History
Received: 18 September 2023
Accepted: 30 April 2024
Article published online:
20 May 2025
© 2024. The Author(s). This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution 4.0 International License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/)
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MARIA CLARA GOMES DE MORAIS, KARLEY SILVA ALMEIDA, GABRIEL CARVALHO FIUSA, RAFAEL RODOLFO TOMAZ DE LIMA, KARLA PATRÍCIA CARDOSO AMORIM. Síndrome de Mondor associada à mamoplastia de aumento: relato de caso. Revista Brasileira de Cirurgia Plástica (RBCP) – Brazilian Journal of Plastic Surgery 2024; 39: 217712352024rbcp0877pt.
DOI: 10.5935/2177-1235.2024RBCP0877-PT
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REFERÊNCIAS
- 1 Faucz RA, Hidalgo RT, Faucz RS. Doença de Mondor: achados mamográficos e ultra-sonográficos. Radiol Bras 2005; 38 (02) 153-155
- 2 International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS). International Survey of Aesthetic/Cosmetic Procedures 2019. Mount Royal: ISAPS; 2019
- 3 Catania S, Zurrida S, Veronesi P, Galimberti V, Bono A, Pluchinotta A. Mondor’s disease and breast cancer. Cancer 1992; 69 (09) 2267-2270
- 4 Becker L, McCurdy LI, Taves DH. Superficial thrombophlebitis of the breast (Mondor’s disease). Can Assoc Radiol J 2001; 52 (03) 193-195
- 5 Pasta V, D’Orazi V, Sottile D, Del Vecchio L, Panunzi A, Urciuoli P. Breast Mondor’s disease: Diagnosis and management of six new cases of this underestimated pathology. Phlebology 2015; 30 (08) 564-568
- 6 Sobreira ML, Yoshida WB, Lastória S. Tromboflebite superficial: epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento. J Vasc Bras 2008; 7 (02) 131-143
- 7 Alvarez-Garrido H, Garrido-Ríos AA, Sanz-Muñoz C, Miranda-Romero A. Mondor’s disease. Clin Exp Dermatol 2009; 34 (07) 753-756
- 8 Khan UD. Incidence of mondor disease in breast augmentation: a retrospective study of 2052 breasts using inframammary incision. Plast Reconstr Surg 2008; 122 (02) 88e-89e
- 9 Favarin GJ, Favarin E, Rocha LPS, Horner C. Mondor’s disease, case report and literature review. Arq Catarin Med 2016; 45 (02) 102-106
- 10 Piccinato CE. Trombose venosa pós-operatória. Medicina (Ribeirão Preto) 2008; 41 (04) 477-486



