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CC BY 4.0 · Revista Brasileira de Cirurgia Plástica (RBCP) – Brazilian Journal of Plastic Surgery 2025; 40: s00451810585
DOI: 10.1055/s-0045-1810585
Artigo Original

Repercussão da abdominoplastia nos relacionamentos interpessoais e na vida social de pacientes dos Serviços Integrados de Cirurgia Plástica de São Paulo

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Authors


Suporte Financeiro Os autores declaram que não receberam suporte financeiro de agências dos setores público, privado ou sem fins lucrativos para a realização deste estudo.
Ensaio Clínico Não.
 

Resumo

Introdução

O aumento expressivo de sobrepeso e obesidade traz consigo um maior número de pacientes que se submetem a procedimentos estéticos, cirúrgicos ou não, visando um melhor contorno corporal. Além do bem-estar físico e mental, o cuidado com o corpo tem um impacto direto nas interações sociais.

Materiais e Métodos

Avaliou-se, por meio do BODY-Q, a opinião das pacientes sobre seus corpos no período pré- e pós-operatório tardio e o impacto da modificação corpórea em seus relacionamentos. Foram abordadas questões sobre avaliação sobre o próprio corpo, relações sociais e sexuais. O questionário foi aplicado em ambiente ambulatorial, após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

Notou-se ganhos importantes na percepção de bem-estar das pacientes no período pós-operatório em relação ao seu próprio corpo e maior confiança em relações sexuais. No quesito de relações sociais, as diferenças foram mais tênues tendo em vista que não havia grandes conflitos sociais no período pré-operatório.

Conclusão

A abdominoplastia mostrou-se eficaz em transformar de forma positiva os relacionamentos e o bem-estar dos pacientes, impactando em sua autoestima, círculo social e profissional, assim como em relacionamentos íntimos.


Introdução

A abdominoplastia refere-se a procedimento cirúrgico no qual realiza-se ressecção de pele e tecido celular subcutâneo da região infraumbilical além de plicatura das aponeuroses dos músculos retos abdominais através de incisão transversa baixa. A dermolipectomia tem por objetivo a diminuição do excesso cutâneo-adiposo e da flacidez abdominal, para proporcionar melhor contorno e relevo à região. Um resultado mais harmonioso é alcançado quando se obtém adequado posicionamento da cicatriz transversa e de suas laterais, da cicatriz umbilical e do púbis.[1]

Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, a dermolipectomia é o segundo procedimento cirúrgico mais realizado no âmbito da cirurgia plástica, juntamente a lipoaspiração. Grande parte dessa procura se deve ao aumento de sobrepeso e obesidade na sociedade atual.[2]

A grande procura por procedimentos estéticos, cirúrgicos ou não, envolvendo a região abdominal reflete a procura por corpos com menor quantidade de tecido gorduroso, menor flacidez e que possuam contornos mais suaves e harmoniosos. Essa busca por melhor qualidade de vida abrange autoestima, bem-estar, capacidade funcional e relações sociais.[3]


Objetivo

A proposta do trabalho é avaliar a influência da realização da abdominoplastia no bem-estar psicossocial das pacientes submetidas a abdominoplastia clássica nos Serviços Integrados de Cirurgia Plástica do Hospital Ipiranga. Além disso, demonstrar se o procedimento também é capaz de proporcionar melhorias nos relacionamentos e no convívio social dessas pacientes, além dos benefícios funcionais.


Materiais e Métodos

Trata-se de estudo prospectivo, com avaliação das pacientes por meio da aplicação da tradução para o português do questionário BODY-Q, desenvolvido pelos Drs. Andrea Pusic, Anne Klassen e Stefan Cano, da McMaster University, no Canadá. O questionário não foi aplicado de forma integral haja vista que o mesmo avalia diversas variáveis relacionadas a abdominoplastia. Focando nos impactos do procedimento na autoestima, nos relacionamentos interpessoais e convívios sociais.

Foram utilizados os seguintes elementos do BODY-Q: imagem corporal, composto por sete perguntas, com o intuito de avaliar a percepção do indivíduo sobre o seu próprio corpo; função sexual, que avalia o conforto do paciente em suas relações íntimas em cinco questões; assim como função psicológica e função social, compostos por dez questões cada, para a avaliação das modificações psicológicas e sociais.

Para realização da pesquisa contou-se com pacientes do sexo feminino, com idade entre 21 e 57 anos, submetidas a abdominoplastia clássica, sem associação a lipoaspiração, nos Serviços Integrados de Cirurgia Plástica do Hospital Ipiranga, em São Paulo. As pacientes aprovadas para o procedimento necessitavam apresentar índice de massa corporal (IMC) ≤ 26 kg/m2, flacidez de parede abdominal que justificasse o procedimento, assim como estabilidade clínica e psicológica. Foram considerados critérios de exclusão pacientes do sexo masculino e técnicas cirúrgicas diferentes da abdominoplastia clássica, como por exemplo, em âncora e mini.

O questionário foi aplicado nas dependências do Hospital Ipiranga em duas etapas. De abril a junho de 2023, as pacientes em fase pré-operatória o responderam após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. O mesmo questionário foi aplicado às mesmas pacientes após 6 meses do ato cirúrgico, de outubro a dezembro de 2023.


Resultados

A pesquisa abrangeu um total de 20 pacientes que foram submetidas ao BODY-Q durante a realização dos exames e análises pré-operatórios e após 6 meses da realização de abdominoplastia. Através dos dados obtidos pode-se observar as modificações obtidas nos âmbitos social e psicológico das pacientes. Trata-se de um questionário composto por afirmações onde a paciente assinala uma dentre as seguintes alternativas: “Discordo totalmente”, “Discordo um pouco”, “Concordo um pouco” ou “Concordo totalmente”. Isso é subdividido entre questões acerca da avaliação sobre seu próprio corpo (“imagem corporal”), sobre suas relações sociais (“função social”), avaliação psicológica (“função psicológica”) e sobre a função sexual.

O questionário inicia-se por questões acerca da avaliação pessoal sobre o próprio corpo. Para tal, lança-se mão de afirmativas como: “Eu me sinto confiante em relação ao meu corpo”, “Meu corpo não é perfeito, mas eu gosto dele”, “Estou feliz com o meu corpo”, “Eu tenho orgulho do meu corpo”, “Eu acho que meu corpo é atraente”, “Eu me sinto bem em relação ao meu corpo quando estou nua”, “Eu tenho o corpo que eu quero” ([Fig. 1]).

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Fig. 1 Imagem corporal pré-operatória.

A segunda etapa do questionário era composta por questionamentos acerca da função social, como “Eu me sinto à vontade em reuniões sociais com as pessoas que eu conheço”, “As pessoas escutam o que tenho a dizer”, “Eu me sinto aceito pelas pessoas”, “Eu me sinto incluído em reuniões/encontro sociais”, “Eu causo uma boa primeira impressão”, “Eu tenho controle da minha vida ao invés de ser somente levado por ela”, “É fácil para mim fazer amigos”, “Eu me sinto confiante quando estou em grupos”, “Eu fico relaxado ao redor de pessoas que não conheço”, “Eu me sinto confiante quando entro numa sala cheia de pessoas que não conheço”.

Em seguida foi avaliada a função psicológica com as seguintes afirmativas: “Eu acredito em mim”, “Eu tenho orgulho de mim”, “Eu me sinto feliz”, “Eu gosto de mim”, “Eu sou emocionalmente forte”, “Eu me sinto no controle da minha vida”, “Eu me sinto confiante”, “Eu me aceito como sou”, “Eu estou confortável comigo mesmo”, “Eu me sinto ótimo comigo mesmo” ([Fig. 2]).

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Fig. 2 Função psicológica pré-operatória.

Para finalizar, as pacientes respondiam a respeito de seu bem-estar quando em relações íntimas. O questionário sobre a função sexual é composto por cinco afirmativas: “Sexo é gratificante para mim”, “Eu fico a vontade em me despir (tirar minha roupa) na frente do meu parceiro(a)”, “Eu estou satisfeito(a) com minha vida sexual”, “Eu fico à vontade em ter a luz acessa durante o sexo”, “Eu me sinto sexualmente atraente quando eu estou sem roupa”.

O BODY–Q foi aplicado após 6 meses da realização de abdominoplastia, demonstrando uma melhoria na autoavaliação corporal, um ganho notável em relação a confiança e realização pessoal, além de ganho expressivo em relação a satisfação e conforto em relações sexuais. Notou-se menor ganho relacionado às questões sobre relacionamentos sociais, possivelmente porque menos pacientes demonstraram sentimentos negativos e dificuldade de estabelecer relações sociais no momento prévio as cirurgias.

No primeiro quesito avaliado, a respeito da imagem corporal, antes da cirurgia 100% das participantes responderam que não estavam felizes com o próprio corpo, não se sentiam atraentes e não tinham o corpo que desejavam. Após o procedimento, aos 6 meses, 12 pacientes responderam que se sentiam parcialmente ou completamente felizes com o próprio corpo, 15 pacientes se sentiam atraentes e 10 estavam com o corpo que desejavam ([Fig. 3]).

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Fig. 3 Imagem corporal pós-operatória.

De acordo com a avaliação de relações sociais, o impacto pós cirúrgico não foi importante devido ao fato de que a grande maioria das pacientes já se sentiam aceitas nos grupos de pessoas, tinham facilidade para fazer amizades e se sentiam confortáveis em reuniões e encontros sociais.

A respeito do impacto psicológico notou-se que todas as participantes da pesquisa acreditavam e orgulhavam-se de si mesmas no período pós-operatório. Em contrapartida, na avaliação pré-operatória 17 acreditavam em si mesmas e 18 sentiam orgulho. Demonstrou-se também que 19 pacientes responderam que se gostavam após a cirurgia, sendo que esse número era de apenas 13 no período anterior ([Fig. 4]).

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Fig. 4 Função psicológica pós-operatória.

No que tange a avaliação do relacionamento sexual, notou-se uma mudança vertiginosa nas respostas obtidas. Antes da cirurgia, todas as pacientes responderam que não se sentiam confortáveis em se despir na frente dos parceiros(as) e em acender as luzes durante o ato sexual, e não estavam satisfeitas com a vida sexual. As respostas obtidas na avaliação posterior demonstraram que cerca de um terço das pacientes se sentiam confortáveis em despir-se na frente do parceiro(a) ou ter a luz acessa durante o ato sexual, e 6 pacientes responderam que estavam totalmente satisfeitas com a vida sexual.


Discussão

Segundo pesquisas, a maior motivação para realização de abdominoplastia é estética, tendo como principais queixas a flacidez de pele, diástase abdominal e adiposidade local.[4] Cirurgias visando a melhora estética são capazes de promover melhora na qualidade de vida dos pacientes nos aspectos físico e mental, principalmente em relação à autoestima, independente de sexo, raça ou idade.[5]

Em relação a qualidade de vida, espera-se uma diminuição no primeiro mês pós-operatório devido às limitações impostas no período de recuperação. Entretanto, após os 30 primeiros dias há melhorias no estado geral de saúde, vitalidade e saúde mental. O impacto psíquico geralmente é evidenciado no terceiro mês após o procedimento.[6] Observamos ganhos nas diversas áreas aqui citadas, possivelmente porque a segunda avaliação foi realizada 6 meses após a abdominoplastia, não havendo influência da queda de qualidade de vida prevista no primeiro mês.

Segundo Pitanguy, a abdominoplastia indicada e executada corretamente promove uma melhora do estado geral das pacientes.[7] Essa constatação corrobora com o presente estudo onde se demonstrou aumento da autoconfiança, bem-estar e, consequentemente, melhores relações interpessoais no período pós-operatório tardio. É notável que quando as pacientes se sentem bem com seu próprio corpo, elas apresentam ganhos expressivos em seus relacionamentos sociais, principalmente em relacionamentos íntimos.


Conclusão

Quando bem indicados os procedimentos cirúrgicos são capazes de proporcionar melhora nas relações sociais e sexuais, assim como no bem-estar do paciente. A melhora na autoestima associada a relações interpessoais mais prazerosas corrobora para uma maior qualidade de vida.



Conflito de Interesses

Os autores não têm conflito de interesses a declarar.

  • Referências

  • 1 Caldeira AML, Duran C, Holguín JC. Outras tendências na abdominoplastia: novo desenho e importância da lipoabdominoplastia na cirurgia do contorno corporal. Rev Bras Cir Plást 2020; 35 (01) 60-71
  • 2 Puhl RC, Conte CHdR, Correa JPT, Rocha PAC, Storion MA, Pinto EBdS. Avaliação dos resultados estéticos de pacientes submetidas a lipoabdominoplastia com técnica de dupla plicatura longitudinal dos músculos retos abdominais. Rev Bras Cir Plást 2019; 34 (Suppl. 01) 104-106
  • 3 Santos NMdF, Castro GGd, Braga LM, Peres ALE, Nunes KCdF. Qualidade de vida e nível de satisfação corporal pós-cirurgia plástica. Fisioter Bras 2019; 20 (03) 426-433
  • 4 Santos NLd, Esteves-De-Oliveira IG, Tacani RE, Baldan CS, Masson IFB, Farcic TS, Machado AFP. et al. Percepção das pacientes sobre a atuação profissional e os procedimentos realizados no pré, no intra e no pós operatório de abdominoplastia. Rev Bras Cir Plást 2020; 35 (02) 189-197
  • 5 Spadoni-Pacheco LM, Carvalho GA. Qualidade de vida e autoestima em idosas submetidas e não submetidas à cirurgia estética. Rev Bras Cir Plást 2018; 33 (04) 528-535
  • 6 Rocha LR. Alteração da qualidade de vida e função da parede abdominal após abdominoplastia [Tese (Graduação em Medicina)]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2017
  • 7 Pitanguy I. Abdominoplastias. Hosp (Lond) 1967; 71: 1541-1556

Endereço para correspondência

Flávia Mesquita Soares
Rua Justo Azambuja 79, apto. 41, bloco Kauai, Cambuci, São Paulo, SP, CEP 01518-000
Brasil   

Publication History

Received: 13 April 2024

Accepted: 20 May 2025

Article published online:
09 October 2025

© 2025. The Author(s). This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution 4.0 International License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/)

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Bibliographical Record
Flávia Mesquita Soares, Luiz Eduardo Felipe Abla, José Octávio Gonçalves de Freitas. Repercussão da abdominoplastia nos relacionamentos interpessoais e na vida social de pacientes dos Serviços Integrados de Cirurgia Plástica de São Paulo. Revista Brasileira de Cirurgia Plástica (RBCP) – Brazilian Journal of Plastic Surgery 2025; 40: s00451810585.
DOI: 10.1055/s-0045-1810585
  • Referências

  • 1 Caldeira AML, Duran C, Holguín JC. Outras tendências na abdominoplastia: novo desenho e importância da lipoabdominoplastia na cirurgia do contorno corporal. Rev Bras Cir Plást 2020; 35 (01) 60-71
  • 2 Puhl RC, Conte CHdR, Correa JPT, Rocha PAC, Storion MA, Pinto EBdS. Avaliação dos resultados estéticos de pacientes submetidas a lipoabdominoplastia com técnica de dupla plicatura longitudinal dos músculos retos abdominais. Rev Bras Cir Plást 2019; 34 (Suppl. 01) 104-106
  • 3 Santos NMdF, Castro GGd, Braga LM, Peres ALE, Nunes KCdF. Qualidade de vida e nível de satisfação corporal pós-cirurgia plástica. Fisioter Bras 2019; 20 (03) 426-433
  • 4 Santos NLd, Esteves-De-Oliveira IG, Tacani RE, Baldan CS, Masson IFB, Farcic TS, Machado AFP. et al. Percepção das pacientes sobre a atuação profissional e os procedimentos realizados no pré, no intra e no pós operatório de abdominoplastia. Rev Bras Cir Plást 2020; 35 (02) 189-197
  • 5 Spadoni-Pacheco LM, Carvalho GA. Qualidade de vida e autoestima em idosas submetidas e não submetidas à cirurgia estética. Rev Bras Cir Plást 2018; 33 (04) 528-535
  • 6 Rocha LR. Alteração da qualidade de vida e função da parede abdominal após abdominoplastia [Tese (Graduação em Medicina)]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2017
  • 7 Pitanguy I. Abdominoplastias. Hosp (Lond) 1967; 71: 1541-1556

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Fig. 1 Imagem corporal pré-operatória.
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Fig. 2 Função psicológica pré-operatória.
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Fig. 3 Imagem corporal pós-operatória.
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Fig. 4 Função psicológica pós-operatória.
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Fig. 1 Preoperative body image.
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Fig. 2 Preoperative psychological function.
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Fig. 3 Postoperative body image.
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Fig. 4 Postoperative psychological function.