CC BY 4.0 · Revista Brasileira de Cirurgia Plástica (RBCP) – Brazilian Journal of Plastic Surgery 2024; 39(04): s00451801870
DOI: 10.1055/s-0045-1801870
Relato de Caso

Alternativa cirúrgica para leiomioma cutâneo pilar múltiplo de membro inferior: Relato de caso e revisão da literatura

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1   Departamento de Cirurgia Plástica, Hospital Daher Lago Sul, Brasília, DF, Brasil.
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Suporte Financeiro Os autores declaram que não receberam suporte financeiro de agências dos setores público, privado ou sem fins lucrativos para realizar este estudo.
Ensaios Clínicos Não. | Clinical Trials None.
 

Resumo

O leiomioma pilar, ou neoplasia benigna do músculo eretor do pelo, é uma patologia incomum, apesar de ser o tipo mais frequente de leiomioma cutâneo. Ocorre entre adultos jovens, acometendo igualmente ambos os sexos. Sua apresentação se dá em lesões dolorosas, isoladas ou múltiplas, papulonodulares vermelhas e castanhas. Apesar de não ter sido relatada nenhuma malignização dos tumores, é importante incluir essa patologia no diagnóstico diferencial de lesões cutâneas papulonodulares. O tratamento cirúrgico geralmente é reservado a casos extensos e sintomáticos, com relatos de recidiva. Nesse artigo, relatamos o caso de um paciente de 28 anos, do sexo masculino, com diagnóstico de leiomioma pilar em face lateral de coxa e perna direita submetido à ressecção de pele tangencial.


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Introdução

Os leiomiomas são neoplasias benignas de tecido mole que surgem a partir do músculo liso. O leiomioma pilar cutâneo é um tumor benigno raro, com incidência de aproximadamente 5%, podendo se apresentar de forma solitária ou múltipla (Ragsdale, 2009). As lesões solitárias são mais comuns que as múltiplas (Malhotra, 2010).

Essa doença é mais comum em adultos, apesar de existirem relatos de caso em crianças. Não apresentam predileção por sexo, apesar dos dados serem conflitantes na literatura (Raj, 1997).

O diagnóstico diferencial deve ser feito com neurofibroma, dermatofibroma, schawnnoma, fibromioma e hamartoma de célula muscular lisa (Latoni, 2000), principalmente nas lesões solitárias. O exame para confirmação de diagnóstico é a biópsia.

O tratamento destas lesões costuma ser refratário ao uso de analgésicos. Existem registros que sugerem a eficácia de medicações bloqueadoras do canal de cálcio (como a nifedipina), os bloqueadores alfa-adrenoreceptores (como a fenoxibenzamina), os nitratos e gabapentina (Raj, 1997). A ablação com laser de CO2 já foi usada em um relato de paciente com contraindicação clínica para cirurgia, apresentando bons resultados.


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Objetivo

Neste artigo, relatamos o caso de um paciente do sexo masculino de 28 anos de idade portador de leiomioma cutâneo múltiplo submetido à terapêutica cirúrgica.


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Relato de Caso

Paciente de 28 anos de idade, homem, de cor parda, apresentava lesões papulares marrom avermelhadas múltiplas, de tamanhos variados, isoladas em determinadas regiões e coalescidas em outras na região da coxa e perna direita. As lesões apareceram nos últimos 5 anos. Apresentava dor, principalmente em exposição ao frio, o que limitava sua movimentação e atividade laboral. Apresentou diagnóstico anátomo patológico confirmado em duas biópsias de leiomioma pilar. Não havia a possibilidade de ressecção de todas as lesões separadamente. O paciente foi operado no Hospital Público Regional de Sobradinho, Brasília, DF, em 18 de abril de 2022. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o número de protocolo 69524923.0.0000.0257.

Optou-se pela ressecção tangencial com faca de Blair em área de coxa com maior densidade de lesões com medida de 14 por 8 cm de face anterior ([Fig. 1]). Aos 8 meses de pós-operatório, o paciente referiu melhora da sensibilidade dolorosa da área operada, sem formação de cicatriz queloidiana ([Fig. 2]). Foi escolhida a ressecção ampla e tangencial de área da anterolateral de coxa e perna direita com o uso da faca de Blair ([Fig. 3]). Paciente evoluiu sem intercorrências pós-operatórias. Nos primeiros 6 meses, ele referiu melhora da dor e de qualidade de vida. Entretanto, apresentou recidiva de algumas lesões na área operada.

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Fig. 1 Pré-operatório.
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Fig. 2 Pós-operatório.
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Fig. 3 Ressecção ampla e tangencial da área afetada.

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Discussão

Os leiomiomas superficiais (cutâneos) representam tumores benignos do músculo liso que podem ter origem nos músculos eretores do pelo, nos músculos liso dartoico, vulvar e mamário, ou nos músculos lisos que envolvem os vasos sanguíneos dérmicos. Assim, eles são classificados em piloleiomiomas (solitários ou múltiplos), leiomiomas da genitália externa e angioleiomiomas (Kumar, Abbas e Fausto 2005). A primeira citação de um leiomioma cutâneo data de 1854, por Rudolf Virchow.

São neoplasias relativamente incomuns, mas sua incidência exata não é conhecida. A patogênese ainda precisa ser determinada, mas acredita-se que os piloleiomiomas surgiram a partir das células lisas no interior do músculo eretor dos pelos da unidade pilo-sebácea (Hoyt, 2015). Piloeliomiomas múltiplos podem ocorrer esporadicamente ou podem ser herdados de forma autossômica dominante (com penetrância variável) como um componente da síndrome de Reed.

Piloleiomiomas, ou leiomiomas pilares, podem ser solitários ou múltiplos, e em um paciente pode ocasionalmente haver centenas. Elas se apresentam como nódulos ou pápulas firmes, castanho-avermelhadas à cor da pele (Bologna, 2010). Piloleiomiomas solitários se desenvolvem principalmente durante a vida adulta e há uma distribuição similar entre os sexos. Quando múltiplos, o padrão de distribuição é mais comumente agrupado, linear, ao longo das linhas de Blaschko, mas lesões dispersas também são observadas ocasionalmente. A maioria mede de 1 a 2 cm de diâmetro e geralmente se desenvolvem nas extremidades e tronco (principalmente ombro). As lesões solitárias favorecem os membros e as múltiplas o tronco (Cizmeci, 2007). Estão frequentemente associados à dor espontânea ou induzida, como por exemplo com exposição ao frio.

O leiomioma pilar apresenta-se histologicamente como um tumor de células musculares lisas dispostas de forma espiralada e entrelaçada, sem apresentar atipias ou atividade mitótica.

A excisão cirúrgica é o tratamento indicado nos casos de lesões pouco numerosas, podendo ser curativa para tumores solitários ou limitados. Entretanto, nas lesões múltiplas, 50% dos casos recidivam entre 6 meses e 15 anos após o tratamento. Nos casos de piloleiomiomas numerosos e dolorosos, alguns autores recomendam abordagem medicamentosa, apesar de sua eficácia limitada.[11] São empregadas drogas como gabapentina, nitroglicerina oral ou tópica, lidocaína, nifedipina, verapamil, fenoxibenzamine, fentolamina, hioscina, analgésicos e antidepressivos. Crioterapia e eletrocoagulação mostraram pouco benefício (Suzuki, 2007).

O uso da ressecção tangencial é uma prática comum na atividade da cirurgia plástica para o debridamento de feridas, queimaduras ou retirada de enxertos de pele (Bolgiani e Serra, 2010). A recidiva de algumas lesões provavelmente é mais comum nas lesões localizadas na derme mais profunda, não ressecada tangencialmente. Podemos sugerir nesses casos uma nova ressecção tangencial mais delimitada ou uma complementação com laser de CO2.


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Conclusão

Não encontramos na literatura o uso da excisão tangencial para o tratamento do leiomioma pilar. A utilização dessa técnica no caso relatado aqui demonstrou eficácia no tratamento de lesões múltiplas, principalmente na remissão dos sintomas dolorosos. A combinação de tratamentos pode ser eficaz na prevenção da recorrência e garantir a cura sem complicações.


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Conflito de Interesses

Os autores não têm conflito de interesses a declarar.

Contribuições dos Autores

IMS: análise e/ou interpretação dos dados, validação, e redação – preparação do original; ASC: supervisão; LAA: análise formal; LVD, metodologia; MSV, curadoria dos dados; e SFAG: redação – preparação do original.


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Endereço para correspondência

Igor Moura Soares
Departamento de Cirurgia Plástica, Hospital Daher Lago Sul
Brasília, DF
Brazil   

Publication History

Received: 04 October 2023

Accepted: 29 September 2024

Article published online:
11 February 2025

© 2025. The Author(s). This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution 4.0 International License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/)

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Rua do Matoso 170, Rio de Janeiro, RJ, CEP 20270-135, Brazil

Bibliographical Record
Igor Moura Soares, Armando dos Santos Cunha, Lucas Albuquerque Aquino, Lucas Vargas Dalbosco, Marcela Santos Vilela, Saulo Francisco de Assis Gomes. Alternativa cirúrgica para leiomioma cutâneo pilar múltiplo de membro inferior: Relato de caso e revisão da literatura. Revista Brasileira de Cirurgia Plástica (RBCP) – Brazilian Journal of Plastic Surgery 2024; 39: s00451801870.
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Fig. 1 Pré-operatório.
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Fig. 2 Pós-operatório.
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Fig. 3 Ressecção ampla e tangencial da área afetada.
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Fig. 1 Preoperative period.
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Fig. 2 Postoperative period.
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Fig. 3 Broad and tangential resection of the affected area.