INTRODUÇÃO
Tumores cerebrais são doenças importantes em todos os grupos etários e dados atualmente
publicados sugerem que sua incidência vem crescendo.[1] Entre os infantes e crianças jovens, tumores cerebrais são o segundo tipo de neoplasia
mais comum, e entre adolescentes e adultos jovens, do quinto ao oitavo tipo mais frequente
de câncer.(2,3) Sua prevalência, nos Estados Unidos, é de 14,7 por 100.000 indiví-duos.(3)Portanto, independente da especialidade, todo médico terá contato com pacientes portadores
de tumores cerebrais, e muitas famílias terão ou tem um de seus componentes com tal
doença.[4]
Dentre os tumores cerebrais, os gliomas são os mais frequentes, e os astrocitomas
são os gliomas mais freqüentemente diagnosticados. Astrocitomas difusamente infiltrantes
correspondem a mais de 60% de todos os tumores cerebrais.(5,6) A classificação dos tumores astrocísticos e oligodendrogliais difusos en-contram-se
na[tabela 1].
Tabela 1
Tumores astrocíticos e oligodendrogliais difusos da Classificação da Organização Mundial
da Saúde, 2016(41)
Astrocitomadifuso, IDH-mutado
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Astrocitomagemistocístico, IDH-mutado
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Astrocitoma difuso, IDH-selvagem
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Astrocitoma difuso, NOS
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Astrocitoma anaplásico, IDH-mutado
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Astrocitoma anaplásico, IDH-selvagem
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Astrocitoma anaplásico, NOS
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Glioblastoma, IDH-selvagem
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Glioblastoma de células gigantes
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Gliosarcoma
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Glioblastoma epitelióide
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Glioblastoma, IDH-mutado
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Glioblastoma, NOS
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Glioma difuso de linha média, H3 K27M-mutado
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Oligodendroglioma, IDH-mutado e 1 p/19q-codeleção
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Oligodendroglioma, NOS
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Oligodendroglioma, anaplásico IDH-mutadoe 1p/l9q-codeleção
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Oligodendroglioma anaplásico, NOS
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Oligoastrocitoma, NOS
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Oligoastrocitomaanaplásico, NOS
|
Gliomas malignos geralmente ocorrem como tumores esporádicos, sem a evidência de tendência
familial ou a identificação de um risco ambiental. No entanto, tem sido observado
um aumento da inci-dência no contexto de síndromes neoplásicas familiares, usualmente
em associação com carcinomas de mama, sarcomas e leucemia.(1,7) A coexistência de astrocitoma e carcinoma colònico (Síndrome de Turcot) já foi relatada,
como também já foram diagnosticados astrocitomas em pacientes com distúr-bios familiais
clássicos, como esclerose tuberosa e neurofibromatose.(5,8)
Glioblastomas e astrocitomas anaplásicos são usualmente encontrados na substância
branca profunda dos hemisférios cerebrais e, apesar da maioria deles serem descritos
como originados de lobos específicos do cérebro, alguns com localização frontal e
occipital também acometem o lobo parietal, causando danos a mais de uma área funcional.Tal
tendência aumenta a dificuldade de ressecção da lesão, muitas vezes por sua proximidade
com estruturas como o tálamo e gânglios da base.[9]
Independentemente da extensão de ressecção de um glioma, em função de sua natureza
infiltrativa, a cirurgia nunca será considerada radical, do ponto de vista oncológico.
Tal fato pode ser confirmado pelos achados tumorais obtidos pela RNM com espectroscopia
ou pela tomografia com emissão de pósitrons (PET), mesmo quando a RNM convencional,
ponderada em T1 e T2, encontra-se normal.[10]
Além disso, em situações em que a lesão se localiza em áreas cerebrais eloquentes,
apenas a biópsia é possível. Portanto, em contraste a outras neoplasias em que o tratamento
pós-operatório é realizado no intuito de controle da doença microscópica, nos casos
de gliomas, a conduta adjuvante atua sobre a doença macroscópica e visa, não a cura,
já que virtualmente todos os pacientes apresentam recidivas tumorais, mas sim o aumento
da sobrevida, em con-dições clinicamente adequadas.[10]
Dentre as principais condutas adjuvantes à cirurgia, a radioterapia é comprovadamente
a mais eficaz. Estudos do Brain Tumor Cooperative Group (BTCG)(11)demonstraram aumento da sobrevida dos pacientes tratados com radioterapia pós-operatória,
em comparação com os tratados com cirurgia exclusiva. Com o advento da combinação
da radioterapia e quimioterapia adjuvantes, com temozolamida, este esquema tornou-se
o tratamento padrão no glioblastoma.[12]
Biologia molecular dos gliomas
Processos de auto-iniciação, proliferação, fuga da apoptose ou do sistema imunológico,
angiogènese e invasão são algumas das mais importantes habilidades dos gliomas. Outra
característica dos gliomas malignos é sua considerável heterogeneidade, em termos
patológicos e de alterações genéticas. Apesar disso, algumas modificações genéticas
dominantes são frequentemente observadas.(13,14,15)
Por exemplo, gliomas de baixo grau geralmente apresentam mutações do gene supressor
de tumor TP53 e aumento da expressão de receptores de fa-tor de crescimento derivado
de plaquetas (PDGF). A progressão para astrocitomas anaplásicos é marcada pelo acúmulo
de outras anormalidades genéticas, incluindo alterações na regulação do ciclo celular,
especialmente aqueles relacionados ao gene reti-noblastoma ou à amplificação da quinase
ciclina-de-pendente 4 (CDK4).[14]
Glioblastomas secundários, termo referente a tumores que progridem a partir de astrocitomas
de baixo grau, são associados com a deleção do cromosso-mo10, que inclui o gene supressor
tumoral PTEN. No entanto, a maioria dos glioblastomas são diagnosticados sem antecedentes
de baixo grau e por isso re-cebem a denominação de glioblastomas primários.[13]
Glioblastomas primários compartilham algumas anormalidades genéticas com os glioblastomas
secundários, como a perda do gene PTEN e a am-plificação da CDK4, mas também existem
algumas alterações genéticas que distinguem os glioblasto-mas primários dos secundários;
a perda do TP53 é característicamente encontrada nos gliomas de bai-xo grau, portanto,
nos glioblastomas secundários, enquanto glioblastomas primários geralmente apre-sentam
amplificação do receptor do fator de cresci-mento epidérmico (EGFR), usualmente não
observa -da nos glioblastomas secundários.(4,16) A avaliação do genoma e da metilação dividem o glioblastoma em quatro subgrupos distintos
- clássico, mesenquimal, pró-neural e neural.[17]
Gliomas malignos e apoptose
Apoptose ou morte celular programada é o resultado de uma resposta fisiológica que
leva a célula à sua au-to-destruição. É o resultado do processo de sinalização que
pode ser iniciado tanto na superfície celular, através de receptores de morte celular,
ou intrinsecamente, através de sinais intra-celulares, como danos extensos ao DNA.
Este processo envolve a ativação de uma cascata de proteínas, chamadas caspases, que
promovem a falència irreversível de componentes celulares, culminando com a morte
celular.(18,19)
No intuito de vencer a apoptose durante seu cres-cimento, os tumores geralmente inativam
as vias pró-apoptóticas ou ativam o aumento da expressão de genes que promovam a sobrevivència
celular. A inativação da proteína p53 impede a resposta pró--apoptótica celular, em
função de sua relação com genes responsáveis pela verificação do bom andamento do
ciclo celular (p21CKI), como também com genes pró-apoptóticos (Bax, Fas). O TP53 é
um gene supressor de tumor mutado em 30-50% dos glioblastomas, envolvido na tumorigenicidade.
No TP53 mutado observa-se também aumento da sobrevivência celular, diminuição da apoptose
e resistència a qui-mioterápicos em diferentes tumores.[20]
Outro mecanismo utilizado pelo tumor para se so-bressair à apoptose é a indução do
aumento de expressão de fatores que previnem a ativação da cascata apoptótica. Um
importante mediador anti--apoptótico que frequentemente encontra-se hiper expresso
em gliomas é o fator nuclear kappa B(NF-kB). Além de sua relação com a resposta inflamató-ria
e imunológica, ele também ativa a transcrição de proteínas que inibem a apoptose,
como a família dos membros de inibição da apoptose (IAP) (c-IAP, XIAP e survinina).
IAPs interagem diretamente com as caspases e bloqueiam sua função apoptótica. Além
disso, o NFkB pode induzir a expressão do Bcl-2 e Bcl-XL, encontrados na camada externa
da membrana mitocondrial; tal efeito diminui a permeabilidade da membrana, condição
essencial à apoptose.[21]
Embora o tumor desenvolva estratégias de combate à indução fisiológica da apoptose
durante seu cres-cimento, em muitos casos os agentes terapêuticos mantém sua capacidade
de sensibilização da célula à cascata apoptótica.
Quimioterapia e radioterapia induzem apoptose em gliomas e novos agentes pró-apoptóticos
vem sendo desenvolvidos. Um exemplo é o indutor de apop-tose relacionado ao fator
de necrose tumoral (TNF) (TRAIL), um ligante de receptores tumorais presentes na superficie
de células tumorais.[19]
Gene O-6-metilguanina-DNA metiltransferase (MGMT)
A habilidade em reparar danos ao DNA pode proteger células tumorais dos efeitos danosos
da quimioterapia. O gene MGMT codifica uma proteína de reparo do DNA que remove da
posição O-6 da guanina os grupos alquila produzidos pelos quimioterápicos alquilantes.
A proteína MGMT é consumida neste processo, e necessita ser reposta.(12,22,23)
No estudo fase III[12] conduzido pela European Organization for Research and Treatment of Cancer (EORTC)
e pelo National Cancer Institute of Canada Clinical Trial Groups, comparando radioterapia
exclusiva com radioterapia concomitante e adjuvante a Temozolamida (um agente quimioterápico
alquilante), a metilação do promotor do gene MGMT foi ana-lisada em amostras tumorais
coletadas de pacientes portadores de glioblastoma. Foi observado um aumento da sobrevida
global dos pacientes em que se encontrava expressa a metilação do promotor do gene
MGMT, quando tratados com radioterapia e quimioterapia, em comparação com os pacientes
submetidos apenas à radioterapia (sobrevidas medianas de 23,4 meses versus 15,3 meses,
respectivamente). Nos pacientes com ausência de metilação do promotor do gene MGMT,
não foi observado bene-fício do acréscimo da quimioterapia à radioterapia. Estes achados
provocaram o aumento do interesse pelo status da metilação do MGMT, como um marcador
de resposta à Temozolamida no tratamento de pacientes portadores de glioblastoma.
Gene isocitrato desidrogenase (IDH)
As mutações no gene IDH 1 e 2 são observadas frequentemente nos gliomas de baixo grau
e gliomas secundários de alto grau. Essas mutações ocorrem precocemente e alteram
as funções enzimáticas durante a oncogênese e interrompem a produção do fosfato de
dinucleótido de nicotinamida e adenina (NADPH). As mutações do gene IDH atuam atra-vés
de alterações nas hidroxilases, potencial redox, metabolismo celular e expressão gênica.
As muta-ções também estimulam a metilação em gliomas. Os gliomas com IDH1 e IDH2 mutados
possuem melhor prognóstico em comparação com o IDH tipo selvagem.(20,24,25)
Papel da radioterapia no tratamento do glioblastoma
O principal efeito celular das radiações ionizantes consiste em danos à molécula de
DNA, provocados por elétrons livres e espécies oxigênio reativas (EOR); estes últimos,
os mais importantes no caso das ra-diações comumente utilizadas na prática radiote-rápica.
EOR são altamente reativos, com vida curta, sendo caracterizados pela presença de
elétrons não-pareados e reativos. Radicais do solvente (água) po-dem participar de
algumas reações, particularmente na subtração do hidrogênio e na adição de ligações
de carbono-carbono insaturados e transformação de moléculas-alvo em EOR intermediários
de vida curta, que subsequentemente revertem-se para pro-dutos estáveis, porém danificados.
Para a radiação eletromagnética ionizante esparsa, dois terços do dano são atribuídos
à ação indireta, sendo o radical OH o de maior poder danificador. Danos pela ação
indireta podem ser modificados por agentes químicos, como o oxigênio, que fixa os
danos produzidos pelos EOR.(26,27)
Imediatamente após a exposição à radiação, o DNA intracelular apresenta danos extensos,
sendo estimado que, para cada célula morta por radiação eletromagnética ionizante
esparsa, há aproximadamente 1000 danos produzidos em bases, 1000 quebras simples (single
strand breaks, SSB) e 40 quebras de fita dupla (doublestrand breaks, DBS). O tipo
de dano ao DNA mais deletério induzido pela radiação ionizante e pelos agentes alquilantes
são as DBS’s, além das SSB’s reparadas de forma errònea resultando em DBS. Estas podem
desencadear os mecanismos de morte celular ou contribuírem para a formação de mutações
e aberrações cromos-sômicas em genes reguladores do ciclo celular e ou-tros processos.(26,27)
Entretanto, as células possuem mecanismos enzi-máticos os quais agem para manter a
integridade do seu material genético em face aos agentes que alteram a sequência de
bases ou a estrutura do DNA. Nas células normais, muitos danos induzidos por radiação
são reparados. A eficiência com que os mesmos são reparados é um fator importante
para a determinação de sua radiossensibilidade.
As vias de reparo do DNA atuam em conjunto com as vias de controle do ciclo celular
para manter a integridade do genoma das células danificadas, sendo cinco mecanismos
principais de reparo: 1. Reparo de pareamento errôneo (Mismatchrepair - MMR); 2. Reparo
por excisão de bases (BER); 3. Reparo por ex-cisão de nucleotídeos (NER); 4. Reparo
por recombi-nação não-homóloga e 5. Reparo por recombinação homóloga. A resposta ao
dano no DNA é sinalizada por proteínas quinases (ATM, ATR, DNA-PK) relacionadas a
família da fosfatidilinositol-3-quinase(PI3K), que atuam no início da cascata de sinalização.(26,28)
Resistência à radiação
Embora a radioterapia seja parte do tratamento dos gliomas malignos, tais tumores
apresentam características importantes de radiorresistència, já que a maior parte
das recidivas ocorre nas regiões tratadas com maior dose de radiação. Além disso,
estudos que testaram o escalonamento de dose acima de 6000cGy não evidenciaram melhores
resultados em relação ao controle da doença.[13]
É possível, portanto, que alterações moleculares observadas em gliomas malignos contribuam
para tal resistència à radiação. Duas das mais comuns anormalidades observadas em
gliomas malignos são a amplificação ou mutação do EGFR e a perda do PTEN, resultando
na inativação do PI3K. Células de glioma com diminuição da sinalização de EGFR são
mais sensíveis à radiação, enquanto que o aumento da expressão do EGFR produz radiorresis-tència,
primariamente pela ativação da via do PI3K. Vários inibidores específicos do PI3K
estão sendo desenvolvidos e serão futuramente testados em re-lação à sua capacidade
de sensibilização das células de gliomas à radioterapia, tal qual acontece com a Temozolamida.(20,
29)
miRNAs
Os miRNAs são moléculas de RNA fita simples de 19-25 nucleotídeos, não codificadores
de proteínas, que agem como importantes reguladores pós-trans-cricionais da expressão
gènica em plantas e animais.
Lin4 foi descoberto em 1993 como o primeiro miR-NA, sendo nesta época associado à
regulação do desenvolvimento larval em C. elegans. Os miRNAs exercem seus efeitos
regulatórios ligando-se à re-gião 3′ não traduzida de RNAs mensageiros (RNAm). Este
mecanismo de atuação permite a redução dos níveis protéicos de seus genes-alvo.[30]-[33]
Ainda não são esclarecidas todas as funções dos miRNAs, no entanto, sua descoberta
despertou interesse, pelas evidências sugestivas de que estas moléculas apresentam
papel fundamental em diversos processos biológicos. Em mamíferos, os miRNAs foram
associados à regulação da prolifera-ção, apoptose, diferenciação, hematopoiese, entre
outras funções.[30]-[33]
miRNAs e câncer
Após demonstrações iniciais de que os miRNAs 15a e 16-1 estão ausentes ou subexpressos
em células B de pacientes portadores de leucemia linfocítica crônica, outros estudos
evidenciaram expressões específicas de outros miRNAs em distintos tipos de neoplasias.[29]-[32]
A hiper-regulação do miR-17 e miR-21 em tumores de cólon, pulmão, estômago, próstata
e pâncreas já foi constatada e o miR-155 encontra-se hiper-regu-lado em neoplasias
de mama, pulmão e cólon. Ao contrário, o miR-29 encontra-se subexpresso em casos de
leucemia linfocítica crônica, leucemia mielói-de aguda, rabdomiossarcoma, colangiocarcinoma,
linfoma de células do manto e em câncer de pulmão, mama e fígado.[34]
Tais achados contribuem para a teoria de que miR-NAs super-expressos atuam como oncogenes,
en-quanto miRNAs subexpressos atuam como supres-sores tumorais.[30]
miRNAs e glioblastoma
O miR-21 se destaca como um dos mais altamente expressos em câncer ([Tabela 2]).
Tabela 2
Expressão dos miRNAs observada em estudos com glioblastomas
Hiperexpressos em >30% dos estudos com glioblastomas
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miR-21; miR-10b; miR-25; MiR-106b; miR-155; miR-210; miR-15b; miR-92a; miR-92b; miR-93.
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Hiperexpressos em <30% dos estudos com glioblastomas
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miR-9;miR-15a; miR-16; miR-17; miR-27a; miR-130b; miR-142-3p.
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Subexpressos em >30% dos estudos com glioblastomas
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miR-132; miR-218; miR-124; miR-128a; miR-138; miR-7; miR-128; miR-149.
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Subexpressos em <50% dos estudos com glioblastomas
|
miR-124; miR-129; miR-137; miR-203; miR-323; miR-323-3p; miR-329; miR-330; miR-379;
miR-410; miR-432; miR-433; miR-485p.
|
Está associado com piora do prognóstico em câncer de mama e um número importante de
genes-alvo do miR-21 tem sido identificados. A inibição do miR-21 em linhagens celulares
de glioma promove o acrés-cimo da caspase-3, sugerindo que sua ação é onco-gênica
em glioblastoma, através da supressão da apoptose. Este efeito também já foi observado
em tumores de mama e colangiocarcinomas.(28,34,35)
A expressão global de miRNAs em glioblastomas utilizando a técnica de microarranjos,
permitiu a iden-tificação de miRNAs cuja expressão é significativamente alterada em
tumores quando comparado à área cerebral periférica do mesmo paciente, incluin-do
o miR-221, altamente expresso neste tumor, e um conjunto de miRNAs (miR-128, miR-181a,
miR-181b e miR-181c) pouco expressos em glioblastomas.(28,34,35)
O let-7 pertence a um grupo de miRNAs que atuam na proliferação celular, diferenciação
celular e, também, como supressores tumorais. Sabemos que diversos miRNAs let-7 estão
hiperexpressos em linhagens de gliomas humanos irradiados. Atuam em KRAS, parte da
via de sinalização MAPK, sendo que o aumento da sinalização de KRAS promove radioresitência.
A muta-ção KRAS não é frequente em tumores cerebrais pri-mários, porém Ras está presente
na oncogênesedo glioblastoma. Estudos utilizando modelo animal de glioblastoma demonstraram
indução de glioblasto-ma após a ativação de KRAS. Em cerca de 90% dos glioblastomas
observa-se ativação de Ras em decor-rência a super-expressão e/ou mutações de ativado-res
a montante da via, tais como o EGFR.[28]
O EGFR encontra-se frequentemente amplificado em glioblastoma. Um estudo confirmou
que o EGFR é um alvo do miR-7 e que a ligação entre os dois em células de glioma,
resulta em diminuição da proliferação e invasão tumoral. Análises da expressão do
miR-7 em células de glioblastoma evidenciaram sua sub-ex-pressão, quando comparadas
ao tecido normal.[36]
Estudos demonstraram que os níveis do miR-128 se encontram geralmente sub-regulados
em glioblasto-ma, quando comparados com os do tecido cerebral normal. A hiper-expressão
do miR-128 leva à redu-ção da proliferação, tanto in vitro, quanto in vivo, de células
de glioma. O miR-128 tem como alvo o Bmi--1, um oncogene envolvido com vários tipos
de tumores, incluindo o glioblastoma. A principal função do Bmi-1 no desenvolvimento
normal é promover a renovação das células tronco, como também silenciar a expressão
de genes envolvidos com diferen-ciação e senescência.(371
Zhang et al. alteraram a expressão de 158 diferentes genes após o silenciamento dos
microRNAs miR-221 e miR-222, em linhagem celular de gliomaU251. A principal consequência
destas modificações foi observada na via de sinalização do IFN-alpha, presente na
cadeia de produção das proteínas STAT1 e STAT2.[38] Após o tratamento de linhagem de glioma M059K, com radiação, Chaudhry et al. verificaram
a super-expressão dos microRNAs miR-15a e miR-16 e concluíram pela possível relação
destes microR-NAs com a resposta à radioterapia da linhagem es-tudada.[28]
DISCUSSÃO
Atualmente, o perfil gênico de alguns tumores cerebrais tem sido utilizado para sua
classificação diagnóstica, determinação da melhor modalidade tera-pêutica e análise
prognóstica dos pacientes.(16,20,39)Um exemplo são os oligodendrogliomas, mais sen-síveis à ação de quimioterápicos que
outros glio-mas. A deleção cromossòmica dos braços 1p e 19q é frequentemente encontrada
nestes tumores e é considerada sua identidade molecular. Tal deleção está associada
com melhor resposta à quimioterapia, como também maior sobrevida livre de recidivas,
em pacientes portadores de oligodendroglio-mas anaplásicos.[40]
Outra marca molecular dos gliomas malignos é a mutação dos genesIDH-1 e IDH-2 (isocitrato
de hidrogenase), principalmente o IDH-1 comum em gliomas grau II e III, mas rara em
glioblastomas. O papel das mutações dos genes IDH no desenvolvi-mento dos gliomas
ainda não é completamente co-nhecido, mas elas podem interferir positivamente no prognóstico
dos pacientes, já que quase nunca ocorrem em idosos portadores de gliomas malignos,
o que justifica, parcialmente, a curta sobrevida destes pacientes.(20,24,25,41)
A proteína reguladora transcricional codificada pelo gene ATRX contém um domínio ATPase
/ helicase, sendo fosforilada dependente do ciclo celular, e, regula a matriz nuclear
e a remodelação da cromatina. As mutações neste gene estão associadas com uma síndrome
de retardo mental ligada ao X (XLMR) mais frequentemente acompanhada pela síndrome
de al-fa-talassemia (ATRX). Pode acontecer em até um ter-ço dos pacientes com glioblastoma
e aparece como promissor marcador prognóstico e terapêutico nos gliomas.(16,42)
O gene transcriptase reversa datelomerase (TERT) aumenta a atividade da telomerase
com a preserva-ção dos telômeros nas células tumorais e, por con-seguinte, da senescência
em gliomas. Há evidências que o gene TERT induza o glioblastoma, especial-mente IDH1
tipo selvagem.(42,43)
Algumas das características mais importantes do glioblastoma são: rápida proliferação,
angiogènese, hipóxia, necrose, heterogeneidade, resistència aos tratamentos e infiltração
do tecido normal adjacente. Tais achados representam o resultado final de inúmeras
vias de sinalização, ativadas por aberra-ções genéticas conhecidas.(4,16,20)
Estudos recentes têm evidenciado a relação da al-teração de sinal de vários miRNAs
e glioblastomas. Tais alterações incluem amplificação, deleção, meti-lação ou alteração
da transcrição.(28,35)
A radiação ionizante tem a capacidade de produzir diversos efeitos biológicos em células
e tecidos, den-tre os quais, danos à estrutura do DNA, mutações, alteração da expressão
de genes, instabilidade genômica e indução de carcinogènese e morte. O enten-dimento
de tais processos possibilita o desenvolvi-mento de novas estratégias terapèuticas.(13,28,29)
Em 2010, Chaudhry et al. publicaram os resultados de um estudo que avaliou a modulação
de diversos miRNAs através da radiação ionizante. Utilizando células de glioma maligno
M059J e M059K, extraídas de um paciente de 33 anos, foi verificado o comportamento
da expressão dos miRNAs 15a, 16, 143, 17-3p, 17-5p, 19a, 19b, 21, 142-3p, 142-5p,
155 e os da fa-mília let-7. As amostras foram irradiadas com 3Gy e a expressão dos
miRNAs foi verificada após 4, 8, 12 e 24horas da exposição à radiação. Entre outros
resultados, foi observado um aumento da expressão dos miRNAs 15a, 16, 143, 155 e 21
na linhagem M059K, após a exposição à radiação. Na linhagem M059J a expressão dos
miRNAs 15a, 16, 143 e 155 aumentou 4 horas após a exposição e então, diminuiu, na
análi-se de 8 horas. Os autores concluíram que a resposta do glioblastoma à radiação
ionizante envolve a mo-dulação de vários miRNAs e que as diferenças entre as modulações
destes diversos miRNAs podem ser a base da sensibilidade das células ao tratamento.[28]
Alterações da expressão dos miRNAs podem levar ao desenvolvimento de tumores, tanto
pela perda de controle dos miRNAs sobre oncogenes, quanto pela inibição de genes supressores
de tumores. Os miRNAs hiper ou subexpressos em neoplasias são, portanto, respectivamente
denominados de miRNAs oncogênicos ou supressores de tumores.
Dentre os miRNAs supressores de tumores encon-tram-se os miRNAs 15a e 16, relacionados
ao desen-volvimento de tumores hipofisários, prostáticos e pancreáticos. Já o miR-21
é conhecido como oncogê-nico e relaciona-se com o desenvolvimento de diversas neoplasias,
dentre as quais, linfoma e glioblas-toma.(28,35)
O silenciamento do gene MGMT é considerado um importante fator preditivo de resposta
à quimioterapia com agentes alquilantes no tratamento de pacientes portadores de glioblastoma
e astrocitoma anaplásico. A determinação do “status” da metilação do promotor do gene
MGMT representa um “sensor” de quimio-sensibilidade.(12,16,20,23)
No entanto, não apenas a informação sobre a metila-ção do promotor do gene, mas também
seu grau de expressão pode ter efeito no prognóstico dos pacientes, sendo que quanto
menor a expressão do gene, maior a sobrevida livre de progressão da doença, melhor
a resposta terapêutica e maior a sobrevida global, tanto na análise univariada quanto
multivaria-da. Estas são algumas das conclusões de um recente estudo envolvendo a
análise de amostras tumorais de 63 pacientes portadores de gliomas malignos.[23]
O estudo dos efeitos da radioterapia e quimioterapia sobre a ação de miRNAs envolvidos
com o processo apoptótico abre novas oportunidades no tratamen-to de pacientes portadores
de gliomas malignos. Diversos genes codificadores de proteínas são ativa-dos após
administração de terapias, e, na pós-trans-crição desses genes permitindo regular
sua ação.
Este é o lugar onde miRNAs como reguladores de genes inerentes poderá oferecer novas
possibilidades na manipulação da resposta clínica.Os marcadores moleculares como MGMT,
EGFR, IDH, 1p19q, ATRX, TERT, FGFR-TACC, e BRAF são empregados para classificar e
também buscamos possíveis alvos terapêu-ticos para os glioblastomas.[16]
Estudos fases II estão avaliando os miRNAs em na-nopartículas no tratamento do câncer.[28] Esperamos que a modulação de marcadores moleculares, in-cluindo os miRNAs, estimule
o surgimento de novas hipóteses que contribuam para uma melhor quali-dade de vida
e sobrevida neste intimidante cenário dos gliomas malignos.