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DOI: 10.1016/j.rbo.2017.09.004
Função e qualidade de vida de pacientes com fratura do planalto tibial operados com placa bloqueada ou convencional: estudo comparativo[*]
Article in several languages: português | EnglishAddress for correspondence
Publication History
18 August 2017
19 September 2017
Publication Date:
01 March 2019 (online)
Resumo
Objetivos
Comparar resultados clínicos, funcionais e de qualidade de vida de pacientes com fratura do planalto tibial operados com placa bloqueada ou convencional e comparar os custos hospitalares dos implantes.
Métodos
Estudo comparativo de coortes transversal, retrospectivo, em uma série consecutiva de pacientes com fratura do planalto tibial tratados cirurgicamente entre agosto de 2015 e junho de 2016. Foram excluídos: menores de 18 anos; indivíduos incapazes de responder os questionários ou de comparecer para reavaliação; politraumatizados ou com lesões associadas no mesmo membro; pacientes não tratados com placa ou conservadoramente. Os autores compararam os custos dos implantes, a qualidade de vida (SF-12), o escore de Lysholm, a escala visual de dor e os parâmetros clínicos e radiográficos.
Resultados
Foram observadas 45 fraturas no período, das quais 11 foram excluídas. Dos 34 pacientes, dois não compareceram à entrevista (seguimento de 94%). O tempo de seguimento foi 15,1 ± 4,8 meses. O grupo A (placa bloqueada) incluiu 22 pacientes (69%), com custo hospitalar médio dos implantes de R$ 4.125,39 (dp = R$1.634,79/paciente). O grupo B (placa convencional) incluiu dez pacientes (31%), a um custo médio de R$ 438,53 (dp = R$ 161,8/paciente; p < 0,00001). Para os demais parâmetros avaliados, não foram observadas diferenças significativas entre os grupos, exceto por um maior degrau articular no grupo A (2,7 mm ± 3,3 mm vs. 0,5 mm ± 1,6 mm; p = 0,02; TE = 0,90).
Conclusão
O custo dos implantes bloqueados para o tratamento das fraturas do planalto tibial é significativamente superior aos implantes convencionais, embora não tenham apresentado vantagem clínica, radiográfica, funcional ou de qualidade de vida, nos pacientes dessa amostra.
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Palavras-chave
fraturas da tíbia - placas ósseas - qualidade de vida - escore de Lysholm para joelho - licença médica - custos e análise de custo - sistema único de saúdeIntrodução
As fraturas do planalto tibial representam 1 a 2% de todas as fraturas e aproximadamente 8% das fraturas em idosos.[1] [2] Um estudo de 2015 revelou que as fraturas do planalto tibial têm incidência de aproximadamente 10,3 casos por 100.000 habitantes. Acometem indivíduos de ambos os sexos, a maior incidência é em mulheres acima dos 50 anos e em homens abaixo dos 50 anos.[2] No Brasil, em 2015, foram feitas 11.071 cirurgias para o tratamento da fratura do planalto tibial pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a um custo de R$ 9.317.006,85 para o sistema.[3]
As fraturas de planalto tibial desviadas demandam tratamento cirúrgico.[2] Vários fatores parecem inuenciar no resultado desse tratamento, entre eles a qualidade de redução, o tipo de fratura, a idade, lesões associadas e o tipo de implante.[2] Embora possa existir variabilidade dos resultados conforme o tipo dos implantes e uma tendência atual na escolha de implantes bloqueados por cirurgiões ortopédicos, não está claro se o uso de um tipo específico de implante influencia no resultado clínico e funcional.[4]
Adicionalmente, existe uma preocupação crescente com o custo de implantes e o seu impacto nos sistemas de saúde tanto públicos quanto privados.[5] Para que estudos de custo-efetividade possam responder se o uso ou a adoção de determinado tipo de implante é adequado, são necessários estudos que comparem a efetividade de diferentes implantes e considerem diversos fatores, como dor, função, qualidade de vida e o tempo de afastamento de trabalho.[5] [6]
Em nosso meio, não encontramos estudos comparativos que ajudem a esclarecer as possíveis diferenças entre as fraturas de planaltos tibiais tratadas cirurgicamente com a placa bloqueada ([Fig. 1]) ou placas convencionais ([Fig. 2]). O objetivo deste estudo é comparar resultados clínicos, funcionais e de qualidade de vida entre os pacientes com fratura do planalto tibial operados com placa bloqueada ou convencional. Paralelamente objetivamos comparar os custos hospitalares dos diferentes tipos de implantes na amostra.




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Material e Métodos
Trata-se de um estudo comparativo de coortes retrospectivo em uma série consecutiva de pacientes com fratura do planalto tibial, tratados cirurgicamente com placa bloqueada (Grupo A) ou convencional (Grupo B), de agosto de 2015 a junho de 2016, em um hospital terciário de ensino que atende exclusivamente pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS).
Foram incluídos todos os pacientes internados por fratura de planalto tibial, no mesmo hospital, de agosto de 2015 a junho de 2016. Foram excluídos: pacientes menores de idade (< 18 anos), incapazes de responder os questionários de avaliação funcional ou de comparecer para reavaliação ambulatorial; indivíduos politraumatizados ou com lesões associadas no mesmo membro ou em outra região anatômica que afetavam de maneira decisiva a reabilitação funcional do membro; pacientes tratados sem placa; pacientes em que foi feito tratamento conservador. Os casos excluídos e os motivos são apresentados nos resultados.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o número 65959717.9.0000.5103 e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Os participantes foram submetidos prospectivamente, pelo mesmo avaliador, à avaliação clínica e funcional com questionários padronizados e validados. A análise das radiografias pós-operatórias também foi feita pelo mesmo avaliador, no momento do retorno. A qualidade de vida no momento da consulta de seguimento também foi registrada. Os prontuários físicos e eletrônicos dos pacientes e todos os exames de imagem disponíveis foram avaliados para coleta de dados referentes à demografia, eventos relacionados ao trauma, tipo de fratura, material usado e custos dos implantes para o hospital. Foram registradas também a função neurológica antes e após o ato cirúrgico, dados sobre infecção, mas com a ferida operatória, retardo de consolidação e outras complicações.
Os parâmetros: tipo de fratura pela classificação de Schatzker, qualidade da redução (presença de desvios articulares em milímetros, desvios angulares nas radiografias em AP e perfil), número de parafusos em cada placa, número de parafusos fora da placa, radiografia inicial, pós-operatória imediata e atual, foram colhidos e anotados em formulário padrão. Nas radiografias atuais também foram avaliadas o estado da consolidação, a presença de soltura ou falha do implante, desvio residual e sinais de artrose pela classificação de Alback.[7] [8] Os questionários aplicados no retorno foram: Escala Visual Analógica de dor (EVA), questionário clínico funcional Lysholm[9] e 12-Item Short Form Health Survey - SF12;[10] e exame clínico padronizado avaliou o arco de movimento do joelho, déficit de flexão e a extensão e situação da ferida operatória.
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Análise estatística
As variáveis quantitativas foram descritas pela média e pelo desvio-padrão e as variáveis qualitativas por frequência absoluta e porcentagens. Para testar diferenças entre os grupos em relação às variáveis quantitativas, foi usado o teste t de Student para amostras independentes ou o teste U de Mann-Whitney, quando apropriado. O tamanho do efeito foi avaliado pelo d de Cohen, foi adotada a seguinte classificação para interpretação: 0,20–0,49, pequeno; 0,50–0,79, moderado; ≥ 0,80, elevado.[11] Para testar diferenças entre proporções, usou-se o teste exato de Fisher, foi usado o V de Cramer como medida do tamanho do efeito, foi adotada a seguinte classificação para interpretação: 0,10–0,29, pequeno; 0,30–0,49, moderado; ≥ 0,50, elevado.[11] Calculou-se a razão de chances (OR) e o intervalo de confiança de 95% (IC95%). Todas as análises foram feitas no software estatístico IBM SPSS versão 20.0 (IBM Corp., Armonk, NY). O valor de p < 0,05 foi adotado para significância estatística.
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Resultados
Entre agosto de 2015 e junho de 2016 foram internadas 45 fraturas do planalto tibial, que foram incluídas no estudo. Houve 11 exclusões: sete devido a tratamento cirúrgico que usou apenas parafusos, uma por fratura côndilo femoral associada, uma por ter sido tratada conservadoramente, duas por dados insuficientes em prontuários. Da amostra inicial de 34 pacientes, dois não compareceram à entrevista, resultou numa amostra de 32 pacientes (seguimento de 94%) ([Fig. 3]). O tempo médio de seguimento foi de 15,1 ± 4,8 meses (de oito a 26).


Os dados demográficos relacionados aos grupos estudados e suas fraturas estão expressos na [Tabela 1]. Os grupos A e B se mostraram similares em relação a idade, sexo, lado acometido, mecanismo e tipo de fratura, tempo até a cirurgia e tempo de seguimento (p > 0,05). No entanto, parece existir uma relação entre a gravidade da fratura e o tipo de implante (p = 0,12; V = 0,31) de magnitude moderada, sob o ponto de vista prático. Ao considerar o tipo de implante como desfecho e a gravidade da fratura como fator de exposição, observa-se que 80% dos pacientes que apresentam Schatzker 5 e 6 têm implante com placa bloqueada contra 50% dos pacientes com Schatzker 1 a 4. Isso significa que a chance de os cirurgiões escolherem um implante com placa bloqueada é quatro vezes maior nos pacientes Schatzker 5 e 6 do que nos pacientes com Schatzker 1 a 4 (OR (IC95%) = 4,00 (0,83–19,32). Embora não significativo estatisticamente, esse resultado, sob o ponto de vista prático, apresenta um efeito de elevada magnitude conforme a classificação do V de Cramer.
Fator |
Grupo Bloqueado (n = 22) |
Grupo Convencional (n = 10) |
Todos (n = 32) |
p-valor |
---|---|---|---|---|
Idade (anos) |
45,9 ± 12,8 |
46,3 ± 16,4 |
46,1 ± 13,7 |
0,95[a] |
Sexo |
||||
Masculino |
14 (64%) |
09 (90%) |
23 (72%) |
0,21[b] |
Feminino |
08 (36%) |
01 (10%) |
09 (28%) |
|
Lado acometido |
||||
Esquerdo |
12 (54%) |
04 (40%) |
16 (50%) |
0,7[b] |
Direito |
10 (46%) |
06 (60%) |
16 (50%) |
|
Mecanismo |
||||
Moto |
10 (46%) |
05 (50%) |
15 (47%) |
0,37[b] |
Atropelamento |
03 (14%) |
04 (40%) |
07 (22%) |
|
Queda de altura |
02 (09%) |
00 (0%) |
02 (6,3%) |
|
Automóvel |
01 (4%) |
01 (10%) |
02 (6,3%) |
|
Queda da própria altura |
04 (18%) |
00 (0%) |
04 (12,5%) |
|
Outros |
02 (09%) |
00 (0%) |
02 (6,3%) |
|
Tipo |
||||
Unicondilar (Schatzker 1-4) |
06 (28%) |
06 (60%) |
12 (37,5%) |
0,12[b] |
Bicondilar (Schatzker 5-6) |
16 (72%) |
04 (40%) |
20 (62,5%) |
|
Tempo até a cirurgia (dias) |
13,5 ± 7,8 |
12,5 ± 7,1 |
13,2 ± 7,5 |
0,73[a] |
Tempo de seguimento (meses) |
15,2 ± 5,2 |
14,8 ± 3,8 |
15,1 ± 4,8 |
0,84[a] |
No grupo A houve 22 pacientes (69%) operados com placa bloqueada, com um custo hospitalar dos implantes de R$ 90.758,6 (média = R$ 4.125,39 ± 1.634,79/paciente). No grupo B, houve 10 pacientes (31%) operados com placa convencional com um custo hospitalar dos implantes de R$ 4.385,36 (média = R$ 438,53 ± 161,8/paciente) – [Fig. 4]. A diferença dos valores nos custos hospitalares do implante foi significativa a um p < 0,00001.


Os dados relacionados à internação e aos procedimentos cirúrgicos são apresentados na [Tabela 2]. Não foram observadas diferenças estatisticamente significantes entre os grupos quanto ao tempo de internação, número de placas usadas e número de vias de acesso, assim como em relação a complicações e necessidade de reoperação (p > 0,05).
Fator |
Grupo Bloqueado (n = 22) |
Grupo Convencional (n = 10) |
Todos (n = 32) |
p-valor |
---|---|---|---|---|
Tempo de internação (dias) |
17,9 ± 10,5 |
13,7 ± 7,0 |
16,6 ± 9,6 |
0,25[a] |
Número de placas |
||||
Uma |
13 (59%) |
07 (70%) |
20 (62%) |
0,7[a] |
Duas ou mais |
09 (41%) |
03 (30%) |
12 (38%) |
|
Número de vias de acesso |
||||
Uma |
13 (59%) |
07 (70%) |
20 (62%) |
0,42[a] |
Duas |
09 (41%) |
03 (30%) |
12 (38%) |
|
Complicações |
||||
Sim |
01 (4,5%) |
01 (10%) |
02 (6,3%) |
0,53[b] |
Não |
21 (95,5%) |
09 (90%) |
30 (93,7%) |
|
Reoperações |
||||
Sim |
03 (13,5%) |
00 (0%) |
03 (9,4%) |
0,53[b] |
Não |
19 (86,5%) |
10 (100%) |
29 (90,6%) |
0,25[a] |
A [Tabela 3] apresenta os dados da avaliação radiográfica. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes em relação ao tempo de consolidação, aos ângulos tibiais no pós-operatório imediato e sinais de gonartrose (p >0,05). Porém, o Grupo Bloqueado (grupo A) apresentou maior desvio articular comparado com o Grupo Convencional (grupo B) (2,7 mm ± 3,3 mm vs. 0,5 mm ± 1,6 mm, p = 0,02; TE = 0,90). Sob o ponto de vista prático, a diferença encontrada foi de elevada magnitude.
Fator |
Grupo Bloqueado (n = 22) |
Grupo Convencional (n = 10) |
Todos (n = 32) |
p-valor |
---|---|---|---|---|
Tempo de consolidação (dias) |
71,9 ± 23,1 |
68,5 ± 16,1 |
70,8 ± 20,9 |
0,67[a] |
Desvio articular |
2,7 ± 3,3 |
0,5 ± 1,6 |
2,0 ± 3,1 |
|
Ângulo articular da tíbia (anteroposterior) (∘) |
3,5 ± 4,3 |
2,7 ± 4,0 |
3,2 ± 4,2 |
0,19[a] |
Sinais de gonartrose |
0,1 [d] |
|||
Sim |
10 (45%) |
01 (10%) |
11 (35%) |
0,67[a] |
Não |
12 (65%) |
09 (90%) |
21 (65%) |
A [Tabela 4] apresenta os resultados clínicos, funcionais e de qualidade de vida. Não foram observadas diferenças estatisticamente significantes na avaliação funcional, dor e qualidade de vida (p > 0,05).
Fator |
Grupo Bloqueado (n = 22) |
Grupo Convencional (n = 10) |
Todos (n = 32) |
p-valor |
---|---|---|---|---|
EVA |
||||
Leve |
13 (57%) |
07 (70%) |
20 (62%) |
0,87[a] |
Moderado |
05 (24%) |
02 (20%) |
07 (22%) |
|
Intenso |
04 (19%) |
01 (20%) |
05 (16%) |
|
SF-12 |
||||
SF m |
21,4 ± 6,2 |
24,2 ± 3,6 |
22,3 ± 5,6 |
0,13[a] |
SF f |
16,3 ± 3,7 |
16,8 ± 4,2 |
16,5 ± 3,8 |
0,74[a] |
SF t |
37,8 ± 8,3 |
41,0 ± 7,5 |
38,8 ± 8,1 |
0,3[a] |
Lysholm |
||||
Excelente e bom |
12 (54%) |
07 (70%) |
19 (59%) |
0,7[a] |
Regular e ruim |
10 (46%) |
03 (30%) |
13 (41%) |
|
Mobilidade ADM |
121,4∘ ± 21,9∘ |
129,0∘ ± 19,1∘ |
123,8 ± 21,1 |
0,35[b] |
Déficit de flexão |
12,3∘ ± 17,2∘ |
9,0∘ ± 15,9 |
11,3 ± 16,6 |
0,61[b] |
Déficit de extensão |
4,6∘ ± 6,7∘ |
2,0∘ ± 4,2∘ |
3,8 ± 6,1 |
0,28[b] |
Na [Tabela 5] são observados os impactos socioeconômicos da cirurgia. Não foram observadas diferenças estatisticamente significantes entre os grupos em relação ao tempo médio de afastamento e a frequência de retorno ao trabalho (p > 0,05).
Fator |
Grupo Bloqueado (n = 22) |
Grupo Convencional (n = 10) |
Todos (n = 32) |
p-valor |
---|---|---|---|---|
Afastado do trabalho |
||||
Sim |
14 (63%) |
8 (80%) |
22 (68%) |
0,78[a] |
Não |
2 (9%) |
0 (0%) |
2 (06%) |
|
Aposentado |
6 (28%) |
2 (20%) |
8 (26%) |
|
Tempo de afastamento (dias) |
211,3 ± 126,5 |
174,3 ± 97,1 |
196,1 ± 113,5 |
0,53[b] |
Conseguiu retornar ao trabalho (sim/%) |
8 (50%) |
7 (87,5%) |
15 (62,5%) |
0,39[a] |
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Discussão
Nosso estudo confirmou a impressão de que existe uma tendência dos cirurgiões de escolherem placas bloqueadas em padrões de fraturas mais graves. Embora não tenha alcanç ado significância estatística, esse dado corrobora os achados descritos em uma recente metanálise.[12] Naquele estudo, não foram observadas diferenças entre os resultados clínicos, funcionais e de qualidade de vida entre os pacientes operados com diferentes tipos de implante. Nosso estudo chegou à mesma conclusão, exceto com relação aos custos.
Os custos diretos para o hospital das placas bloqueadas foram significativamente maiores do que os da placa convencional (aproximadamente dez vezes) (p < 0.0001). Esse achado também foi relatado em outros tipos de fraturas.[13] [14] Um estudo que comparou o tratamento cirúrgico das fraturas de olécrano mostrou um aumento médio de US$ 1.263,50 no custo dos pacientes operados com placa bloqueada.[13] No joelho, essa diferença nos gastos também foi encontrada, o que reforça a necessidade de discutir a real indicação desse tipo de implante.[14]
No âmbito do SUS, no qual a tabela de procedimentos é extremamente defasada e contempla atualmente essas fraturas com uma verba de R$ 252,08 para o pagamento do hospital, observamos ser inviável o uso indiscriminado desses implantes, pois o déficit por paciente (considerando apenas o custo do implante) seria de R$ 3.873,81. De fato, nosso estudo prova que o valor pago pelo sistema não cobre sequer o custo dos implantes convencionais. Portanto, no cenário atual, implantes especiais só deveriam ser usados nos casos em que forem realmente imprescindíveis, apesar de a literatura atual não apresentar indicações absolutas para uso de implantes bloqueados,[6] [14] o que reforça o hiato quanto o uso desses implantes no âmbito do SUS.
Em nosso estudo, ao avaliar os pacientes operados em ambos os grupos, observamos que os resultados clínicos, funcionais e radiográficos foram semelhantes, assim como em outros estudos na literatura.[14] [15] Em uma comparação de fratura tipo Schatzker II,[14] não foram observadas diferenças entre os dois tipos de placa, a não ser o custo. No entanto, aquele estudo não avaliou a qualidade de vida ou o afastamento do trabalho. Nosso estudo mostra que além de não haver diferença nos parâmetros citados inicialmente, o uso de placas bloqueadas também não trouxe diferenças significativas na qualidade de vida ou no tempo de afastamento do trabalho. O número limitado de nossa amostra não permitiu, entretanto, uma estratificação para identificar subgrupos específicos de pacientes que pudessem potencialmente se beneficiar dos implantes bloqueados.
As características demográficas de nossos pacientes se assemelham às de outros estudos. Encontramos que a principal causa de fraturas foram os acidentes de trânsito (76%,) e que a média de idade foi de 46 anos. Em outro estudo nacional[16] o principal mecanismo de trauma foi o mesmo e a média de idade foi de 45,5 anos, o que ajuda na validação externa dos nossos resultados. A implicação desses achados é que essas fraturas têm relevante impacto socioeconômico, pois acometem geralmente adultos em idade produtiva e provocam tempos prolongados de afastamento do trabalho. Observamos uma taxa de retorno ao trabalho de 72,7% em média até o fim do nosso seguimento, o que reforça esses achados. De fato, um estudo prospectivo aleatorizado multicêntrico demonstrou que, após 24 meses, apenas 30% dos pacientes consideraram que conseguiram retornar plenamente ao seu nível prévio de atividade.[17]
Alguns estudos demonstram que o principal fator relacionado ao prognóstico dessas fraturas é a qualidade da redução articular e que desvios articulares maiores do que 2,5 mm se relacionam a piores resultados.[15] Em nosso estudo, a média de desvio foi considerada aceitável (1,9 mm), embora no grupo de placas bloqueadas a média tenha ficado marginalmente acima desse valor. De fato, houve uma diferença significativa entre os desvios observados nos grupos bloqueado e convencional, em nosso estudo, o que favorece os implantes convencionais. Esse achado repete os de Abghari et al.,[14] que atribuíram essa pior redução à técnica indireta da redução nos casos operados por via minimamente invasiva (comum nos implantes bloqueados). Além disso, em nossa casuística, uma prevalência maior de fraturas bicondilares no grupo da placa bloqueada (não significante) poderia ter alguma relação com esse achado.
Em nosso estudo obtivemos 11 pacientes com sinais de gonartrose (34%) após 15 meses de seguimento em média. Essa incidência é semelhante a estudo publicado em 2016,[18] apesar de o tempo de seguimento não ser suficiente para identificar todos os casos que irão evoluir dessa forma.[19]
O presente estudo tem uma série de limitações. Em primeiro lugar, a sua natureza retrospectiva impediu a aleatorização dos pacientes e melhor homogeneidade dos grupos. No entanto, por avaliar os procedimentos feitos no contexto real, os achados têm maior probabilidade de ter validade externa e representar medidas de efetividade dos tratamentos. Outro ponto negativo foi o número limitado de pacientes, que impediu a exploração de subgrupos de pacientes, para os quais os potenciais benefícios de implantes bloqueados poderiam ser identificados. No entanto, a análise estatística mostrou uma baixa correlação dos escores EVA e Lysholm com o tipo de implante, o que indica que a falta de significância encontrada não está relacionada a erro tipo beta (falta de poder ou amostra insuficiente). Não obstante, os achados de nosso estudo demonstram que, para realidade de nosso hospital, os custos dos implantes bloqueados para fraturas do planalto tibial são proibitivos e que, a princípio, o uso de implantes convencionais não provocou resultados radiográficos, clínicos, funcionais ou de qualidade de vida, inferiores aos implantes especiais bloqueados. Isso não significa, no entanto, que esse tipo de implante seja prescindível, uma vez que pode ser necessário em indicações cirúrgicas específicas e parece ser bem aceito entre os cirurgiões.
#
Conclusão
Observamos que os custos dos implantes bloqueados para o tratamento das fraturas do planalto tibial são significativamente superiores aos dos implantes convencionais, sem, no entanto, apresentar qualquer vantagem clínica, radiográfica, funcional ou de qualidade de vida, nos pacientes de nossa amostra.
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Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse.
* Trabalho desenvolvido no Serviço de Ortopedia e Traumatologia, Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus (HMTJ), Juiz de Fora, MG, Brasil. Publicado originalmente por Elsevier Editora Ltda. © 2018 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia.
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