Palavras-chave
L-lactato desidrogenase - neoplasias ósseas - osteossarcoma - proteína C-reativa -
sedimentação sanguínea
Keywords
blood sedimentation - bone neoplasms - C-reactive protein - L-lactate dehydrogenase
- osteosarcoma
Introdução
O osteossarcoma é o tumor ósseo primário maligno mais comum, e afeta principalmente
crianças e adultos jovens. Apesar dos avanços nos protocolos de tratamento que incorporam
cirurgia e quimioterapia, o osteossarcoma ainda é associado a uma alta incidência
de metástases, em especial nos pulmões, o que contribui significativamente para o
prognóstico ruim observado em muitos pacientes.[1] A metástase é a principal causa de mortalidade no osteossarcoma. A taxa de sobrevida
em 5 anos é inferior a 30% em pacientes com doença metastática, e de cerca de 70%
em pacientes com doença localizada. A compreensão dos mecanismos subjacentes à metástase
e a identificação de biomarcadores que predizem o potencial metastático são cruciais
para a melhora dos desfechos clínicos.[2]
Uma área que tem recebido cada vez mais atenção nos últimos anos é o papel da inflamação
na progressão do câncer. A inflamação, como parte da resposta imunológica do corpo,
há muito tem sido implicada no início e no desenvolvimento de tumores, e um crescente
conjunto de evidências sugere que a inflamação crônica pode facilitar a metástase
tumoral.[3] Essa relação é mediada pelo microambiente tumoral, que inclui várias células imunes,
citocinas e outros mediadores inflamatórios que interagem com as células tumorais
para promover sua proliferação, invasão e migração.[4]
Neste contexto, marcadores inflamatórios sistêmicos, como a proteína C reativa (PCR),
a velocidade de hemossedimentação (VHS), a razão neutrófilo-linfócito (RNL) e a razão
plaqueta-linfócito (RPLR), surgiram como possíveis indicadores do prognóstico do câncer
e do potencial metastático em uma ampla gama de tumores malignos.[5] Esses marcadores refletem a resposta inflamatória sistêmica, que, quando desregulada,
pode contribuir para a progressão tumoral e o desenvolvimento de metástase. Níveis
elevados desses marcadores têm sido associados a desfechos clínicos desfavoráveis,
incluindo aumento da agressividade tumoral e disseminação metastática em alguns cânceres,
como colorretal, de mama e de pulmão.[6]
[7]
[8]
No osteossarcoma, o papel dos marcadores inflamatórios como fatores preditivos de
metástase é uma área de investigação ativa. Diversos estudos[9]
[10]
[11] sugeriram que níveis elevados de marcadores inflamatórios estão associados a piores
desfechos de sobrevida, o que sugere que esses marcadores podem ser ferramentas prognósticas
úteis na prática clínica. No entanto, os mecanismos precisos pelos quais esses marcadores
inflamatórios influenciam a metástase do osteossarcoma não são compreendidos por completo.
A compreensão da relação entre inflamação e metástase no osteossarcoma pode ter implicações
clínicas significativas. Primeiramente, a identificação de biomarcadores inflamatórios
confiáveis de metástase pode aprimorar a estratificação de risco, o que permite abordagens
terapêuticas personalizadas e intervenções mais precoces em pacientes de alto risco.
Além disso, o foco nas vias inflamatórias envolvidas na progressão do osteossarcoma
pode oferecer novas estratégias terapêuticas para prevenir ou mitigar a metástase,
o que pode melhorar os desfechos de sobrevida nessa neoplasia maligna agressiva.
Este estudo teve como objetivo investigar a correlação entre marcadores inflamatórios
e a incidência de metástase em pacientes com osteossarcoma. Ao avaliar os níveis de
marcadores inflamatórios sistêmicos importantes, como PCR, VHS, RNL e RPL, em pacientes
com osteossarcoma, tentamos elucidar seu possível papel como biomarcadores preditivos
de doença metastática.
Materiais e Métodos
Delineamento Experimental
Este estudo utilizou uma metodologia retrospectiva, que abrangeu pacientes diagnosticados
com osteossarcoma com base em achados histopatológicos. A coorte foi composta por
indivíduos diagnosticados com osteossarcoma em nossa instituição entre janeiro de
2022 e agosto de 2024. As variáveis independentes analisadas incluíram sexo, idade,
localização do tumor e marcadores inflamatórios (PCR, VHS, fosfatase alcalina [FA],
lactato desidrogenase [LDH] e RNL), enquanto a variável dependente foi a incidência
de metástase. Exploramos como esses vários fatores independentes se relacionam e influenciam
a probabilidade de metástase em indivíduos com osteossarcoma.
População de Pacientes
Os critérios de elegibilidade foram: 1) confirmação histológica do diagnóstico de
osteossarcoma por biópsia; 2) avaliação de hemograma completo (incluindo PCR, VHS,
RNL, FA e LDH) antes da biópsia cirúrgica; e 3) identificação de metástase em exames
radiológicos. Por outro lado, excluímos indivíduos com outras comorbidades, como imunodeficiência,
infecções e diabetes mellitus. Além disso, pacientes com malignidades de baixo grau
e aqueles sem resultados completos de amostras de sangue para análise também foram
excluídos. O comitê de ética de nossa instituição aprovou o estudo, sob o número de
protocolo 2024.02.1.0930. Não houve necessidade de obtenção de consentimento livre
e esclarecido, uma vez que este estudo não realizou intervenções em pacientes.
Coleta de Dados
A partir dos prontuários médicos, registramos sistematicamente informações demográficas
e clínicas, incluindo sexo, idade, local do tumor, presença de metástase, local da
metástase e níveis séricos de PCR, VHS, RNL, FA e LDH. Os resultados do hemograma
completo foram obtidos no primeiro atendimento em nossa unidade. Os pacientes foram
categorizados com base na metástase. Para mitigar possíveis vieses, estabelecemos
critérios claros de inclusão e exclusão para a população do estudo. Além disso, os
autores responsáveis pela seleção e análise dos dados dos pacientes não tinham conhecimento
dos desfechos do osteossarcoma. Protocolos e instrumentos padronizados foram empregados
em nossa instituição para mensurar as variáveis relevantes e, assim, minimizar o viés
de informação. Além disso, os dados dos prontuários médicos hospitalares foram corroborados
com os laudos de nosso Departamento de Ortopedia e Traumatologia.
Análise Estatística
A análise de correlação foi feita pelo teste do Qui-quadrado de Pearson e o teste
exato de Fisher para a avaliação da associação entre características clínicas e laboratoriais
e a incidência de metástase. Os dados clínicos e laboratoriais foram submetidos à
análise de regressão logística para determinar quais características continuaram significativas
à avaliação concomitante. As variáveis incluídas nessa análise apresentaram valores
de p < 0,05 no exame de correlação bivariada anterior.
Resultados
Dados Demográficos e Características Clínicas
Este estudo contou com 40 pacientes que atenderam aos critérios de inclusão. Todos
os pacientes foram diagnosticados com osteossarcoma em nossa instituição entre janeiro
de 2022 e agosto de 2024. Usando um método de amostragem total, todos os pacientes
elegíveis foram incluídos sem seleção aleatória. Então, os pacientes foram divididos
em dois grupos, com ou sem metástase, com base nos resultados do exame radiológico.
A amostra foi composta por 20 (50%) homens e 20 (50%) mulheres. A proporção de pacientes
na primeira, segunda, terceira e quarta ou mais décadas de vida foi de 3 (7,5%), 21
(52,5%), 5 (12,5%) e 11 (27,5%), respectivamente. A idade mediana foi de 18 (variação:
9–82) anos. As proporções de localização do tumor fora, de 22 (55%) casos no fêmur,
7 (17,5%) casos na tíbia, 7 (17,5%) casos no úmero, e 4 casos em outras localizações:
1 (2,5%) na fíbula, 1 (2,5%) no rádio, 1 (2,5%) na ulna, e 1 (2,5%) na clavícula.
Entre os pacientes com metástase, 18 (90%) casos foram detectados no pulmão, e 2 (10%),
no cérebro ([Tabela 1]).
Tabela 1
Características clínicas dos pacientes
Variável
|
Pacientes (n = 40)
|
Idade mediana (variação) em anos
|
18 (9–82)
|
1ª década
|
3 (7,5%)
|
2ª década
|
21 (52,5%)
|
3ª década
|
5 (12,5%)
|
≥ 4ª década
|
11 (27,5%)
|
Sexo
|
Masculino
|
20 (50%)
|
Feminino
|
20 (50%)
|
Local
|
Fêmur
|
22 (55%)
|
Tíbia
|
7 (17,5%)
|
Fíbula
|
1 (2,5%)
|
Úmero
|
7 (17,5%)
|
Rádio
|
1 (2,5%)
|
Ulna
|
1 (2,5%)
|
Clavícula
|
1 (2,5%)
|
Presença de metástase
|
Sim
|
20 (50%)
|
Não
|
20 (50%)
|
Local da metástase
|
Pulmão
|
18 (90%)
|
Cérebro
|
2 (10%)
|
Correlação Entre Resultados Clínicos e Laboratoriais e Metástase
Os resultados dos exames de sangue periférico demonstraram que os níveis de neutrófilos,
monócitos, FA, LDH, VHS, PCR e RNL no grupo com metástase foram maiores em comparação
ao grupo de controle. Os resultados laboratoriais da análise de sangue periférico
também demonstraram a distribuição anormal da maioria dos marcadores (neutrófilos,
monócitos, eosinófilos, basófilos, FA, LDH, PCR, VHS e RNL), à exceção dos linfócitos.
Além disso, os dados com distribuição anormal foram analisados pelo teste de Mann-Whitney,
ao passo que os com distribuição normal, pelo teste t independente. Os resultados da análise indicaram que neutrófilos (p = 0,01), monócitos (p = 0,033), LDH (p < 0,001), VHS (p < 0,001), PCR (p < 0,001) e RNL (p = 0,012) têm uma correlação estatisticamente significativa com a incidência de metástase
em pacientes com osteossarcoma ([Tabela 2]).
Tabela 2
Correlação entre marcador inflamatório e presença de metástase
Variável
|
Metástase (média ± desvio padrão)
|
Sem metástase
(média ± desvio padrão)
|
Valor de p
|
Neutrófilos
|
8,10 ± 3,94
|
5,05 ± 1,66
|
0,010b
|
Linfócitos
|
2,04 ± 0,54
|
2,04 ± 0,74
|
0,240a
|
Monócitos
|
0,81 ± 0,47
|
0,52 ± 0,17
|
0,033b
|
Eosinófilos
|
0,21 ± 0,24
|
0,32 ± 0,26
|
0,091b
|
Basófilos
|
0,03 ± 0,02
|
0,04 ± 0,02
|
0,445b
|
Fosfatase alcalina
|
382,95 ± 367,71
|
180,20 ± 107,46
|
0,076b
|
Lactato desidrogenase
|
674,25 ± 828,77
|
240,35 ± 134,15
|
< 0,001b
|
Velocidade de hemossedimentação
|
67,47 ± 31,95
|
20,30 ± 1,84
|
< 0,001b
|
Proteína C- reativa
|
53,89 ± 53,63
|
4,24 ± 5,30
|
< 0,001b
|
Razão neutrófilo-linfócito
|
4,20 ± 2,47
|
2,49 ± 1,67
|
0,012b
|
Notas:
ateste t independente; bteste de Mann-Whitney.
A análise bivariada revelou que um alto nível de vários marcadores inflamatórios,
como neutrófilos (p = 0,008; razão de chances [RC] = 2,296; IC95% = 1,393–3,784), monócitos (p = 0,035; RC = 2,250; IC95% = 1,562–3,242), VHS (p = 0,001; RC = 7,207; IC95% = 1,092–47,577), PCR (p < 0,001; RC = 4,636; IC95% = 1,610–13,350), RNL (p = 0,004; RC = 2,513; IC95% = 1,283–4,919), FA (p = 0,017; RC = 2,333; IC95% = 1,592–3,421) e LDH (p = 0,001; RC = 3,273; IC95% = 1,329–8,060) foram significativamente associados à incidência
de metástase em pacientes com osteossarcoma ([Tabela 3]).
Tabela 3
Análise bivariada de marcadores inflamatórios e incidência de metástases
Variável
|
Metástase
|
Sem metástase
|
Valor de p
|
Razão de chaces (IC95%)
|
Neutrófilos
|
|
|
0,008
|
2,296 (1,393–3,784)
|
Elevados
|
8 (88,9%)
|
1 (11,1%)
|
|
|
Normais
|
12 (38,7%)
|
19 (61,3%)
|
|
|
Linfócitos
|
|
|
−
|
−
|
Elevados
|
0 (0%)
|
0 (0%)
|
|
|
Normais
|
20 (50%)
|
20 (50%)
|
|
|
Monócitos
|
|
|
0,035
|
2,250 (1,562–3,242)
|
Elevados
|
4 (100%)
|
0 (0%)
|
|
|
Normais
|
16 (44,4%)
|
20 (55,6%)
|
|
|
Eosinófilos
|
|
|
0,376
|
0,630 (0,194–2,039)
|
Elevados
|
2 (33,3%)
|
4 (66,7%)
|
|
|
Normais
|
18 (52,9%)
|
16 (47,1%)
|
|
|
Basófilos
|
|
|
−
|
−
|
Elevados
|
0 (0%)
|
0 (0%)
|
|
|
Normais
|
20 (50%)
|
20 (50%)
|
|
|
Fosfatase alcalina
|
|
|
0,017
|
2,333 (1,592–3,421)
|
Elevada
|
5 (100%)
|
0 (0%)
|
|
|
Normal
|
15 (42,9%)
|
20 (57,1%)
|
|
|
Lactato desidrogenase
|
|
|
0,001
|
3,273 (1,329–8,060)
|
Elevada
|
16 (72,7%)
|
6 (27,3%)
|
|
|
Normal
|
4 (22,2%)
|
12 (77,8%)
|
|
|
Velocidade de hemossedimentação
|
|
|
0,001
|
7,207 (1,092–47,577)
|
Elevada
|
19 (65,5%)
|
10 (34,5%)
|
|
|
Normal
|
1 (9,1%)
|
10 (90,9%)
|
|
|
Proteína C- reativa
|
|
|
< 0,001
|
4,636 (1,610–13,350)
|
Elevada
|
17 (77,3%)
|
5 (22,7%)
|
|
|
Normal
|
3 (16,7%)
|
15 (83,3%)
|
|
|
Razão neutrófilo-linfócito
|
|
|
0,004
|
2,513 (1,283–4,919)
|
Elevada
|
13 (76,5%)
|
4 (23,5%)
|
|
|
Normal
|
7 (30,4%)
|
16 (69,6%)
|
|
|
A análise multivariada mostrou que, entre os marcadores inflamatórios elevados, altos
valores de neutrófilos (p = 0,024; RC = 12,667; IC95% = 1,402–114,419), VHS (p = 0,009; RC = 19,000; IC95% = 2,119–170,383), PCR (p < 0,001; RC = 17,000; IC95% = 3,464–83,436), RNL (p = 0,006; RC = 7,429; IC95% = 1,778–31,040) e LDH (p = 0,009; RC = 9,333; IC95% = 2,180–39,962) foram associados à incidência de metástase
em pacientes com osteossarcoma ([Tabela 4]).
Tabela 4
Análise multivariada de marcadores inflamatórios e incidência de metástases
Marcadores inflamatórios
|
Valor
|
Erro padrão
|
IC95%
|
Razão de chances
|
Valor de p
|
Neutrófilos
|
2,539
|
1,123
|
1,402–114,419
|
12,667
|
0,024
|
Lactato desidrogenase
|
2,234
|
0,742
|
2,180–39,962
|
9,333
|
0,003
|
Velocidade de hemossedimentação
|
2,944
|
1,119
|
2,119–170,383
|
19,000
|
0,009
|
Proteína C- reativa
|
2,833
|
0,812
|
3,464–83,436
|
17,000
|
< 0,001
|
Razão neutrófilo-linfócito
|
2,005
|
0,730
|
1,778–31,040
|
7,429
|
0,006
|
Discussão
Os resultados deste estudo indicam que níveis elevados de neutrófilos, PCR, VHS, RNL
e LDH estão significativamente associados à presença de metástase em pacientes com
osteossarcoma. Esses resultados corroboram os da literatura existente acerca do papel
da inflamação sistêmica na progressão do câncer, em especial no desenvolvimento de
metástase.
Inflamação como Desencadeador de Metástase
A inflamação crônica há muito é reconhecida como uma característica marcante da progressão
do câncer.[12] No osteossarcoma, a inflamação no microambiente tumoral cria um ambiente favorável
para que as células neoplásicas escapem da vigilância imunológica e promovam a angiogênese,
o que facilita a invasão e a metástase.[13]
[14] A inflamação associada ao tumor não é apenas um efeito colateral: contribui ativamente
para a agressividade do câncer por meio de diversas vias. Citocinas pró-inflamatórias,
quimiocinas e células imunes são componentes integrais desse processo, pois criam
um ambiente que favorece o crescimento, a sobrevida e a disseminação das células tumorais.[15]
No osteossarcoma, a metástase, particularmente para os pulmões, é um determinante
crítico do prognóstico. O osteossarcoma metastático é caracterizado por um comportamento
tumoral mais agressivo, frequentemente associado a um maior grau de inflamação sistêmica.[1]
[16] Os marcadores identificados neste estudo (PCR, VHS, RNL e LDH) refletem aspectos
distintos, mas interconectados, desta resposta inflamatória, e indicam mecanismos
pelos quais a inflamação pode impulsionar a progressão metastática.
Proteína C Reativa (PCR) e Metástase
A PCR é uma proteína de fase aguda sintetizada no fígado em resposta a citocinas pró-inflamatórias,
principalmente interleucina 6 (IL-6) e fator de necrose tumoral alpha (FNT-α).[17] Níveis elevados de PCR têm sido consistentemente associados a um prognóstico ruim
e a um aumento do potencial metastático em vários tipos de câncer, incluindo o osteossarcoma.[6]
[18]
[19]
[20] A associação significativa entre níveis elevados de PCR e a presença de metástase
neste estudo sugere que a PCR pode ser um marcador substituto da extensão da inflamação
sistêmica e agressividade do osteossarcoma
A PCR amplifica a resposta inflamatória ao ativar o sistema complemento e promover
o recrutamento de células imunes para o microambiente tumoral. Esse estado inflamatório
intensificado facilita a progressão tumoral por meio de vários mecanismos. Primeiro,
a inflamação crônica pode aumentar a permeabilidade vascular e a angiogênese, ambas
essenciais para que as células tumorais invadam os tecidos circundantes e entrem na
corrente sanguínea. Segundo, as citocinas inflamatórias que aumentam a produção de
PCR, como IL-6 e FNT-α, demonstraram promover a transição epitelial-mesenquimal (TEM),
um processo pelo qual as células cancerígenas adquirem propriedades migratórias e
invasivas necessárias para a metástase.[4]
[5]
Além disso, a PCR tem sido implicada na supressão da imunidade antitumoral. Níveis
altos de PCR podem inibir a atividade das células T citotóxicas e das células exterminadoras
naturais (natural killer, NK, em inglês), essenciais para o reconhecimento e a eliminação de células cancerígenas
metastáticas.[21] Essa evasão imune permite que as células tumorais se disseminem com maior liberdade
e causem lesões metastáticas em órgãos distantes.
Velocidade de Hemossedimentação e Agressividade do Tumor
A VHS é outro marcador de inflamação sistêmica que reflete o grau de agregação de
hemácias e é influenciado pela presença de proteínas de fase aguda, como fibrinogênio
e PCR. A VHS elevada é indicativa de um processo inflamatório em andamento, e ela
tem sido associada a desfechos adversos em diversos tipos de câncer.[7]
[22] Este estudo demonstra uma correlação significativa entre VHS alta e a presença de
metástase, o que sugere que o aumento da inflamação sistêmica pode contribuir para
o comportamento agressivo do osteossarcoma metastático.
A associação entre VHS elevada e metástase pode estar relacionada ao ambiente inflamatório
crônico, que promove a progressão tumoral. Semelhante à PCR, a VHS elevada é provavelmente
induzida por citocinas pró-inflamatórias, como IL-6 e FNT-α, que são conhecidas por
desempenhar atuar na patogênese do osteossarcoma. Essas citocinas podem aumentar a
capacidade invasiva das células tumorais, ao promover a quebra da matriz extracelular
e facilitar a degradação das barreiras teciduais, o que permite sua migração e estabelecimento
em locais de metástase.[23]
Razão Neutrófilo-Linfócito Como Indicador Prognóstico
A RNL é um marcador amplamente estudado na resposta inflamatória sistêmica, e representa
o equilíbrio entre neutrófilos pró-tumorais e linfócitos antitumorais. A RNL elevada,
como observada neste estudo, tem sido correlacionada a prognóstico ruim e aumento
do potencial metastático de diversas neoplasias malignas, incluindo o osteossarcoma.
A associação significativa entre a RNL elevada e a metástase no osteossarcoma destaca
o papel dos neutrófilos na promoção do crescimento tumoral e dos linfócitos na defesa
contra a progressão neoplásica.[24]
Os neutrófilos contribuem para o processo metastático por meio de diversos mecanismos.
Os neutrófilos associados a tumores (NATs) podem promover a angiogênese por meio da
secreção de fator de crescimento endotelial vascular (FCEV), o que aumenta o suprimento
sanguíneo para a neoplasia e facilita a disseminação metastática. Os NATs também liberam
enzimas proteolíticas, como metaloproteinases de matriz (MPMs), que degradam a matriz
extracelular e promovem a invasão das células tumorais. Além disso, os neutrófilos
podem suprimir as respostas imunes adaptativas, inibindo a atividade de linfócitos
T citotóxicos e células NK, o que facilita ainda mais a evasão imunológica e a metástase.[25]
Por outro lado, os linfócitos, em especial os linfócitos T, são cruciais na imunidade
antitumoral. O baixo número de linfócitos, refletido pela RNL elevada, indica menor
vigilância imunológica e menor capacidade de controlar o crescimento tumoral e a metástase.
Assim, a RNL elevada sugere um desequilíbrio entre as forças pró-tumorais e antitumorais,
o que favorece a disseminação metastática.[25]
Lactato Desidrogenase e Metabolismo Tumoral
A LDH é uma enzima envolvida na glicólise anaeróbica, e seus níveis frequentemente
estão elevados em células tumorais de rápida proliferação.[26] Altas concentrações de LDH têm sido associadas à biologia tumoral agressiva, resistência
ao tratamento e desfechos ruins em casos de osteossarcoma.[2] Neste estudo, níveis elevados de LDH foram significativamente correlacionados à
presença de metástase, o que ressalta seu possível papel como marcador de agressividade
tumoral e potencial metastático.
A relação entre LDH e metástase pode ser compreendida no contexto do efeito de Warburg,
uma adaptação metabólica em que as células cancerígenas utilizam preferencialmente
glicólise para a produção de energia, mesmo na presença de oxigênio. Esse favorecimento
à glicólise aumenta a produção de lactato, que acidifica o microambiente tumoral e
promove a invasão neoplásica e a metástase. Níveis elevados de LDH refletem essa alteração
metabólica e geralmente são associados ao aumento da proliferação de células tumorais
e da capacidade metastática.[27]
Além disso, o próprio lactato pode atuar como uma molécula sinalizadora no microambiente
tumoral, ao promover angiogênese, evasão imune e remodelação tissular, processos que
facilitam a metástase. Altas concentrações de LDH também refletem as condições hipóxicas
dentro do tumor, que são conhecidas por impulsionar a seleção de clones celulares
metastáticos mais agressivos.[28]
Apesar da associação estatisticamente significativa entre os marcadores inflamatórios
e metástase aqui demonstrada, este estudo tem várias limitações. O delineamento retrospectivo
depende de prontuários médicos preexistentes, que podem ter qualidade e completude
variáveis. Essa dependência pode introduzir viés de seleção devido à inclusão apenas
de pacientes que atenderam aos critérios especificados e tinham dados completos à
disposição, com a possível exclusão de casos que poderiam influenciar os resultados.
Além disso, a natureza retrospectiva limita o controle dos fatores de confusão, como
variações nas técnicas diagnósticas ou protocolos de tratamento, que podem influenciar
os resultados do estudo. Essas limitações podem afetar a generalização dos achados
para populações mais amplas, o que ressalta a necessidade de estudos prospectivos
para a validação desses resultados e esclarecimento dos mecanismos etiológicos.
Conclusão
Este estudo demonstra que VHS e RNL altas e níveis elevados de PCR, neutrófilos e
LDH estão significativamente associados à metástase em pacientes com osteossarcoma,
o que destaca o valor prognóstico dos marcadores inflamatórios sistêmicos e seu possível
papel na orientação da estratificação de risco e estratégias terapêuticas personalizadas.
Bibliographical Record
I. Gede Eka Wiratnaya, Mohamad Dimas Ismail, Risang Haryo Raditya, I. Putu Dema Prasetya.
Níveis altos de marcadores inflamatórios sistêmicos associados à incidência de metástase
em osteossarcoma. Rev Bras Ortop (Sao Paulo) 2025; 60: s00451810033.
DOI: 10.1055/s-0045-1810033