Palavras-chave polimetilmetacrilato - preenchedores dérmicos - relatos de casos - revisão - risco
Introdução
A demanda por procedimentos estéticos minimamente invasivos que prometem resultados eficientes, satisfatórios e com curto tempo de recuperação tem aumentado nos últimos anos.[1 ] Procedimentos cosméticos como os preenchimentos dérmicos e volumizadores faciais e corporais emergiram como alternativas populares à cirurgia plástica convencional, com a promessa de rápida recuperação e a falsa sensação de menores riscos associados, o que vai ao encontro das expectativas dos pacientes.[2 ]
Nesse contexto , um tipo de preenchedor muito utilizado é o polimetilmetacrilato (PMMA), um componente plástico, inabsorvível, cujas esferas são inseridas em um veículo para permitir a aplicação por meio de injeções.[3 ] O PMMA foi inicialmente liberado para uso em nível ambulatorial no Brasil em 2009 pelo Ministério da Saúde, para o tratamento das lipodistrofias secundárias aos efeitos adversos dos antirretrovirais utilizados no tratamento do HIV.[4 ]
[5 ] No entanto, com o passar dos anos, o uso indiscriminado e inadequado desse material resultou em inúmeras complicações, tanto imediatas quanto tardias.[3 ]
As complicações imediatas do PMMA incluem reações inflamatórias, dor e infecções que ocorrem logo após a aplicação. Tais alterações podem variar de reações adversas menores, como eritema e edema, até efeitos adversos mais graves, como necroses teciduais, acometimentos oculares, infecções severas e, até mesmo, insuficiência renal por hipercalcemia.[5 ]
[6 ]
[7 ] As complicações agudas podem persistir e evoluir para formações granulomatosas, infecções recorrentes, doenças autoimunes e insuficiência renal crônica. Além disso, a migração do material para áreas indesejadas pode resultar em assimetrias e deformidades locais muitos anos após a sua aplicação.[8 ]
Por ser inabsorvível, a interação do PMMA com o tecido adjacente não permite que o material possa ser removido isoladamente. O caráter irreversível da aplicação do produto é um dos seus maiores limitantes.[3 ]
[5 ]
[8 ] A irreversibilidade do PMMA pode resultar no aparecimento de complicações tardias de tratamento complexo e que, em muitos casos, evoluem com deformidades permanentes. Diante de complicações como a presença de granulomas, reação inflamatória crônica, fibrose e infecções com formação de biofilme bacteriano, a única alternativa terapêutica é a remoção cirúrgica do produto, juntamente com o tecido saudável adjacente, resultando em sequelas permanentes.[5 ]
[8 ]
Essas reações podem ser intensificadas por técnicas inapropriadas de aplicação, indicações questionáveis, volumes inadequados de produto para a área alvo de tratamento ou por uma má seleção na qualidade dos materiais utilizados. Estudos[6 ] mostram que o procedimento deve ser realizado por cirurgiões plásticos ou dermatologistas qualificados que compreendam a anatomia da área a ser tratada, dominem a técnica correta e saibam tratar as eventuais complicações; porém, essas recomendações muitas vezes não são levadas em consideração.
Em vista desse cenário, faz-se necessária uma ampla investigação na literatura médica, a fim de compilar as evidências científicas disponíveis sobre o PMMA, para determinar quais são as possíveis complicações imediatas e tardias decorrentes do seu uso, a fim de aumentar a compreensão sobre a segurança desse material para fins estéticos e até mesmo questionar a liberação do uso dessa substância pelos órgãos competentes.
Objetivo
O objetivo deste trabalho é realizar uma revisão integrativa dos casos de complicações imediatas e tardias decorrentes do uso de PPMA relatados na literatura nos últimos 20 anos.
Materiais e Métodos
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura contemplando relatos de caso e séries de casos sobre complicações imediatas e tardias do PMMA. Foi realizada uma pesquisa por artigos publicados 2004 e 2024 nas bases de dados PubMed, Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Scopus, utilizando os descritores polimetilmetacrilato , preenchedores dérmicos e complicações .
Foram excluídos estudos publicados fora do período estipulado, estudos experimentais e aqueles não realizados com humanos. Os estudos que preencheram os critérios de inclusão foram lidos integralmente por dois revisores independentes, e, em caso de conflito, um terceiro pesquisador resolveu a discrepância.
Na leitura dos artigos, os seguintes dados foram coletados: nome da revista, autor, ano, país de origem, tipo de estudo (relato de caso ou série de casos), casuística, idade, profissional que realizou o procedimento (médico ou não médico), volume injetado, sítio anatômico tratado, sinais e sintomas apresentados após a injeção do PMMA, complicações imediatas, complicações tardias, tratamento das complicações, e se o preenchimento foi realizado no contexto do tratamento da lipodistrofia secundária à infecção por HIV ou com fins estéticos.
Resultados
Ao todo, 38 estudos preencheram os critérios de inclusão dessa revisão, totalizando 587 casos ([Fig. 1 ]): 17 artigos eram séries de casos e 21, relatos de casos individuais ([Tabela 1 ]);[9 ]
[10 ]
[11 ]
[12 ]
[13 ]
[14 ]
[15 ]
[16 ]
[17 ]
[18 ]
[19 ]
[20 ]
[21 ]
[22 ]
[23 ]
[24 ]
[25 ]
[26 ]
[27 ]
[28 ]
[29 ]
[30 ]
[31 ]
[32 ]
[33 ]
[34 ]
[35 ]
[36 ]
[37 ]
[38 ]
[39 ]
[40 ]
[41 ]
[42 ]
[43 ] 39% dos artigos (15/38) relatavam casos que ocorreram no Brasil, sendo o relato mais antigo5 publicado em 2008, e o mais recente,9 em 2024 ([Tabela 2 ]).
Fig. 1 Triagem dos artigos incluídos na revisão.
Tabela 1
Revista
Autores
Ano
Casuística
Referência
Revista Brasileira de Cirurgia Plástica
Goldman et al.
2024
209
[9 ]
Annals of Plastic Surgery
Durkin et al.
2023
3
[10 ]
Journal of the American Academy of Dermatology
Vengalil et al.
2023
1
[11 ]
Cytopathology
Saoud et al.
2023
1
[12 ]
Ophthalmic Plastic and Reconstructive Surgery
Parikh et al.
2023
1
[13 ]
Journal of Cutaneous and Aesthetic Surgery
Sivam et al.
2023
1
[14 ]
Journal of Drugs in Dermatology
Goldman et al.
2021
27
[15 ]
SKIN The Journal of Cutaneous Medicine
Dhaliwal et al.
2021
1
[16 ]
European Review for Medical and Pharmacological Sciences
Freire de Carvalho et al.
2021
1
[17 ]
Annals of Medicine and Surgery
Alimoradi et al.
2021
1
[18 ]
Jornal Brasileiro de Nefrologia
Manfro et al.
2021
2
[7 ]
Revista Brasileira de Cirurgia Plástica
Kurimori et al.
2019
1
[3 ]
Dermatologic Therapy
Goldman e Wollina
2019
2
[19 ]
Dermatologic Surgery
Ibrahim e Dover
2018
1
[20 ]
Georgian Medical News
Goldman et al.
2018
2
[21 ]
Open Access Macedonian Journal of Medical Sciences
Goldman e Wollina
2018
81
[22 ]
Contact Dermatitis
Shah et al.
2017
1
[23 ]
Revista Brasileira de Cirurgia Plástica
Souza et al.
2016
1
[24 ]
Diagnostic Pathology
Cannata-Ortiz et al.
2016
1
[25 ]
Aesthetic Surgery Journal
Limongi et al.
2016
11
[26 ]
Plastic Reconstructive Surgery – Global Open
Purnell et al
2016
1
[27 ]
Journal of Cosmetic and Laser Therapy
Friedmann et al.
2016
4
[28 ]
Medicina Intensiva
Boattini et al.
2015
1
[29 ]
Calcified Tissue International
Hindi et al.
2015
1
[30 ]
Skin Research and Technology
Cinotti et al.
2015
1
[31 ]
Archives of Endocrinology and Metabolism
Rados e Furlanetto
2015
1
[32 ]
Clinical Cases in Mineral and Bone Metabolism
Negri et al.
2014
4
[33 ]
Journal of the American Geriatrics Society
Costa et al.
2014
1
[34 ]
Aesthetic Plastic Surgery
Park et al.
2012
13
[35 ]
Journal of Plastic, Reconstructive & Aesthetic Surgery
Park et al.
2012
15
[36 ]
The Canadian Journal of Plastic Surgery
Solomon et al.
2012
153
[37 ]
Journal of Hand Surgery
Al-Qattan
2011
3
[38 ]
Journal of Plastic, Reconstructive & Aesthetic Surgery
Santana et al.
2010
1
[39 ]
Aesthetic Plastic Surgery
de Figueiredo et al.
2010
1
[40 ]
Kosmetische Medizin
Wollina
2009
1
[41 ]
Plastic and Reconstructive Surgery
Salles et al.
2008
32
[5 ]
Dermatology
Wolfram et al.
2006
4
[42 ]
Clinical and Experimental Dermatology
Sidwell et al.
2006
1
[43 ]
Total
587
Tabela 2
Autor
Ano
Número de casos
Referência
Goldman et al.
2024
209
[9 ]
Goldman et al.
2021
27
[15 ]
Freire de Carvalho
2021
1
[17 ]
Manfro et al.
2021
2
[7 ]
Kurimori et al.
2019
1
[3 ]
Goldman e Wollina
2019
2
[19 ]
Goldman A et al.
2018
2
[21 ]
Goldman e Wollina
2018
81
[22 ]
Souza et al.
2016
1
[24 ]
Limongi et al.
2016
11
[26 ]
Rados e Furlanetto
2015
1
[32 ]
Costa et al.
2014
1
[34 ]
Santana et al.
2010
1
[39 ]
de Figueiredo J et al.
2010
1
[40 ]
Salles et al.
2008
32
[5 ]
Total
373
Regiões Anatômicas e Volume Injetado
O sítio de preenchimento mais frequente foi o malar, seguido do sulco nasogeniano, da região glútea, dos lábios, da região nasal, da região frontal, da face, da região palpebral, da região zigomática, dos membros superiores, do mento, da mandíbula, do tórax, do tronco, dos membros inferiores e das regiões temporal, auricular e peniana ([Tabela 3 ]). Somente 2 (5%) estudos relatavam casos de preenchimento com finalidade reconstrutora para o tratamento da lipodistrofia decorrente do uso de antirretroviral.[30 ]
[33 ] A maioria dos estudos (89,4%) não informou o volume injetado durante o procedimento; contudo, foram registradas quantidades como 1,9 mL em região palpebral em 1 paciente,[10 ] 4 mL para tratamento facial,[17 ] e 2 casos de injeção de 400mL e 900mL de PMMA para preenchimento glúteo.[3 ]
[27 ]
Tabela 3
Região anatômica
Número de estudos (porcentagem)
Referência
Malar
12 (0.13)
[5 ]
[9 ]
[11 ]
[13 ]
[14 ]
[19 ]
[20 ]
[28 ]
[35 ]
[39 ]
[42 ]
[43 ]
Sulco nasogeniano
11 (0.12)
[9 ]
[20 ]
[24 ]
[28 ]
[31 ]
[35 ]
[37 ]
[39 ]
[40 ]
[41 ]
[42 ]
Glúteo
10 (0.11)
[3 ]
[5 ]
[7 ]
[18 ]
[21 ]
[27 ]
[29 ]
[30 ]
[32 ]
[33 ]
Nariz
8 (0.09)
[5 ]
[9 ]
[15 ]
[19 ]
[23 ]
[28 ]
[37 ]
[40 ]
Frontal
8 (0.09)
[5 ]
[9 ]
[11 ]
[12 ]
[28 ]
[35 ]
[37 ]
[42 ]
Lábio
7 (0.08)
[9 ]
[13 ]
[19 ]
[28 ]
[35 ]
[37 ]
[42 ]
Face (local específico não determinado)
7 (0.08)
[16 ]
[19 ]
[22 ]
[26 ]
[35 ]
[39 ]
[43 ]
Ocular
4 (0.04)
[9 ]
[10 ]
[35 ]
[42 ]
Zigomático
4 (0.04)
[9 ]
[17 ]
[42 ]
[43 ]
Membros superiores
4 (0.04)
[7 ]
[19 ]
[21 ]
[38 ]
Mento
4 (0.04)
[9 ]
[13 ]
[28 ]
[42 ]
Mandibular
2 (0.02)
[9 ]
[19 ]
Tronco
2 (0.02)
[5 ]
[22 ]
Membros inferiores
2 (0.02)
[25 ]
[33 ]
Tórax
1 (0.01)
[21 ]
Temporal
1 (0.01)
[9 ]
Auricular
1 (0.01)
[9 ]
Pênis
1 (0.01)
[5 ]
Profissional que Realizou o Procedimento
Ao todo, 6 de 38 estudos relatavam o profissional responsável pela realização do procedimento. Em 27 casos, o procedimento foi realizado por médicos, sendo 16 cirurgiões plásticos certificados, 9 dermatologistas e 2 urologistas. Seis preenchimentos foram realizados por profissionais não médicos, incluindo enfermeiros, esteticistas e dentistas.[3 ]
[5 ]
[11 ]
[13 ]
[28 ]
[31 ]
Complicações
As complicações relatadas foram divididas em imediatas (até 30 dias após a injeção de PMMA) e tardias (após 30 dias). Foram relatadas 10 diferentes complicações imediatas, sendo o eritema a mais frequente (26%), seguida do aparecimento de prurido (16%), edema (11%), insuficiência renal aguda (11%), nodulações (11%), e outras menos frequentes ([Tabela 4 ]).
Tabela 4
Imediatas
Tipo
Número de estudos (porcentagem)
Referência
Eritema
5 (0.26)
[13 ]
[23 ]
[37 ]
[38 ]
[42 ]
Prurido
3 (0.16)
[23 ]
[37 ]
[40 ]
Edema
2 (0.11)
[23 ]
[38 ]
Insuficiência renal aguda
2 (0.11)
[3 ]
[29 ]
Nodulação
2 (0.11)
[35 ]
[42 ]
Choque séptico
1 (0.05)
[29 ]
Disfunção hepática
1 (0.05)
[29 ]
Equimose
1 (0.05)
[37 ]
Insuficiência respiratória
1 (0.05)
[29 ]
Secreção seropurulenta
1 (0.05)
[40 ]
Tardias
Tipo
Número de estudos (porcentagem)
Referência
Granuloma
17 (0.21)
[5 ]
[9 ]
[10 ]
[12 ]
[13 ]
[14 ]
[16 ]
[18 ]
[21 ]
[22 ]
[26 ]
[30 ]
[33 ]
[38 ]
[39 ]
[41 ]
[42 ]
Nodulação
11 (0.14)
[9 ]
[11 ]
[19 ]
[24 ]
[26 ]
[28 ]
[31 ]
[34 ]
[35 ]
[37 ]
[43 ]
Alterações cutâneas
6 (0.08)
[25 ]
[26 ]
[27 ]
[28 ]
[38 ]
[42 ]
Sinais inflamatórios
5 (0.06)
[5 ]
[9 ]
[32 ]
[36 ]
[38 ]
Edema
5 (0.06)
[9 ]
[13 ]
[20 ]
[25 ]
[26 ]
Infecção
4 (0.05)
[9 ]
[17 ]
[28 ]
[42 ]
Necrose
3 (0.04)
[5 ]
[9 ]
[40 ]
Irregularidade facial
3 (0.04)
[26 ]
[36 ]
[42 ]
Hipercalcemia
2 (0.03)
[18 ]
[33 ]
Acometimento ocular
2 (0.03)
[13 ]
[17 ]
Insuficiência renal crônica
2 (0.03)
[7 ]
[21 ]
Redução de função renal
1 (0.01)
[33 ]
Neovascularização
1 (0.01)
[9 ]
Pigmentação
1 (0.01)
[9 ]
Lacrimejamento
1 (0.01)
[9 ]
Fístula
1 (0.01)
[9 ]
Reação alérgica
1 (0.01)
[13 ]
Psoríase
1 (0.01)
[17 ]
Nefrocalcinose
1 (0.01)
[18 ]
Linfadenite granulomatosa pulmonar
1 (0.01)
[18 ]
Pericardite
1 (0.01)
[21 ]
Síndrome sarcoidose-like
1 (0.01)
[21 ]
Eritema
1 (0.01)
[26 ]
Taquicardia
1 (0.01)
[27 ]
Hipercalemia
1 (0.01)
[32 ]
Nefrite
1 (0.01)
[33 ]
Prurido
1 (0.01)
[33 ]
Hipertensão
1 (0.01)
[33 ]
Rigidez
1 (0.01)
[36 ]
Seroma
1 (0.01)
[38 ]
Sarcoidose pulmonar
1 (0.01)
[43 ]
Em relação às complicações tardias, 30 diferentes tipos foram relatados. O aparecimento de granuloma foi a mais comum (21%), seguida de nodulações inespecíficas (14%), alterações cutâneas (8%), reações inflamatórias (6%), edema (6%), infecção (5%), necrose (4%), irregularidades na face (4%), hipercalcemia (3%), acometimento ocular (3%), insuficiência renal crônica (3%), entre outras ([Tabela 4 ]).
Tratamento
O uso de esteroides,[3 ]
[7 ]
[9 ]
[10 ]
[11 ]
[13 ]
[14 ]
[17 ]
[18 ]
[21 ]
[24 ]
[26 ]
[27 ]
[28 ]
[30 ]
[32 ]
[33 ]
[35 ]
[36 ]
[38 ]
[39 ]
[41 ]
[42 ]
[43 ] antibióticos[3 ]
[11 ]
[20 ]
[25 ]
[29 ]
[40 ]
[42 ]
[43 ] e abordagem cirúrgica,[3 ]
[7 ]
[9 ]
[10 ]
[12 ]
[13 ]
[17 ]
[23 ]
[24 ]
[26 ]
[27 ]
[28 ]
[35 ]
[36 ]
[38 ]
[39 ]
[40 ]
[42 ] incluindo 75 casos de excisão, foram as 3 formas de tratamento mais frequentes. Outras abordagens terapêuticas relatadas incluem o uso de: laser ,[9 ]
[15 ]
[19 ]
[21 ]
[22 ] fluoruracila,[9 ]
[14 ]
[28 ] ozônio,[9 ] xylitol,[9 ] alopurinol,[9 ] metotrexato,[17 ] vitamina D,[17 ] hidroxicloroquina,[17 ] colchicina,[21 ] hemodiálise,[7 ]
[29 ] suporte vasopressor,[29 ] intubação orotraqueal com suporte ventilatório,[29 ] calcitonina,[32 ]
[33 ] infusão salina,[32 ] bifosfonatos,[30 ]
[32 ]
[33 ] ciclofosfamida,[33 ] cetoconazol[33 ] e ácido hialurônico,[36 ]
[41 ] conforme a especificidade de cada caso.
Discussão
Há revisões da literatura[5 ] que destacam o grande número de complicações resultantes de preenchimentos com PMMA. Neste estudo, atualizamos as evidências quanto ao número de relatos de complicações decorrentes do uso de PMMA nos últimos 20 anos, e identificamos uma prevalência significativa de casos ocorridos no Brasil, que representaram mais do que 50% do total de artigos desta revisão. Fatores regulatórios relacionados à história da política de saúde pública brasileira no tratamento dos pacientes com HIV/AIDS podem ser uma explicação para esses achados.
Em 1996, com o surgimento do tratamento antirretroviral de alta potência, a melhora da condição da saúde de pacientes com HIV/AIDS era frequentemente acompanhada de alterações anatômicas estigmatizantes.[44 ] Em vista disso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) liberou o uso de preenchimentos com PMMA para fins reparadores nessa população.[45 ]
A evolução dos fármacos antirretrovirais resultou na diminuição do número de pacientes com lipodistrofias estigmatizantes. Entretanto, é intrigante observar que o número de complicações relacionadas ao uso estético do PMMA aumentou, sendo que, nesta revisão, somente em dois casos as complicações relatadas foram decorrentes do uso do PMMA com finalidade reparadora para o tratamento de pacientes com HIV/AIDS.[30 ]
[33 ]
Os resultados desta revisão evidenciam que a utilização atual do PMMA extrapola os limites seguros estabelecidos e as indicações formais para o seu uso, conforme determinado pelas agências reguladoras. Um exemplo disso são os relatos de casos de preenchimentos glúteos com volumes de até 900 mL de PMMA,[3 ] sendo que a recomendação do consenso brasileiro publicado por Blanco Souza et al.[46 ] em 2017 é a de que não se exceda o volume máximo de 100 mL nessa região.
Em vista disso, é evidente a importância de destacar alguns pontos quanto à liberação do uso do PMMA com finalidades estéticas. A ausência de fiscalização apropriada resulta em práticas inadequadas, como a realização desses procedimentos por profissionais não médicos, assim como por médicos não capacitados, inclusive fora de ambientes com infraestrutura adequada.[3 ]
[5 ]
[11 ]
[13 ]
[28 ]
[31 ] A maior parte dos artigos não identificou o prescritor dos preenchimentos realizados, porém, dos 6 estudos que o fizeram, de um total de 34 casos, apenas 16 foram realizados por profissionais certificados para a aplicação do material, o que pode ter contribuído para o aumento do risco relacionado ao procedimento.[5 ]
De 2004 a 2024, o número de complicações relacionadas ao uso do PMMA no Brasil foi significativamente maior do que no restante do mundo, totalizando 373 casos. Ainda que a utilização do PMMA com fins estéticos tenha sido questionada pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP),[47 ] ele ainda é muito utilizado como preenchedor no Brasil, ao passo que, em outros países, outros tipos de preenchedores reversíveis e absorvíveis são mais utilizados, como o ácido hialurônico, enxerto de gordura autóloga, ácido poli-L-lático e bioestimuladores de colágeno.[48 ]
Foram relatados mais casos de complicações tardias do que imediatas, sendo que as mais frequentes foram as formações granulomatosas (21%). Cabe ressaltar a potencial gravidade das complicações decorrentes de preenchimentos com PMMA, como choque séptico e insuficiência renal crônica,[7 ]
[21 ]
[29 ] além da incerteza quanto à segurança em longo prazo, tendo em vista os relatos[12 ] de granulomas de corpo estranho em locais distantes da aplicação do PMMA. Em vista disso, uma fiscalização mais rígida da distribuição, venda, prescrição e dos locais onde são realizados esses procedimentos, assim como a conscientização da população sobre os riscos relacionados ao PMMA podem contribuir para a diminuição da incidência de efeitos adversos.[6 ]
A ANVISA autoriza a aplicação de PMMA em duas situações: correção da lipodistrofia decorrente do uso de antiretrovirais e para correção volumétrica facial e corporal. Não há contraindicação de uso do PMMA nos glúteos, mas não deve ser utilizado com o objetivo de aumento do volume. A aplicação deve ser realizada somente por médicos qualificados para essa finalidade, os quais devem decidir, a partir de uma avaliação detalhada, a dosagem e o número de injeções apropriadas para cada paciente, levando em conta as particularidades e necessidades do indivíduo.[49 ]
É importante salientar que a ANVISA classifica o PMMA como um produto médico implantável de classe de risco IV. Essa classificação pressupõe um alto nível de controle regulatório devido aos potenciais riscos de complicação, como reações inflamatórias, infecções, migração do material e necrose tecidual, sobretudo por se tratar de material permanente e não reabsorvível pelo organismo, o que destaca a irreversibilidade desse método de preenchimento.[49 ]
No que diz respeito à segurança, alternativas mais seguras ao PMMA incluem o ácido hialurônico e a gordura autóloga. O ácido hialurônico apresenta maior biocompatibilidade, menor risco de complicações e a possibilidade de reversão com a aplicação da enzima hialuronidase. A gordura autóloga também é uma opção viável e segura, com menor risco complicações.[50 ]
Com relação às limitações desta revisão, destacamos uma incerteza: a maior incidência de complicações relatadas no Brasil é decorrente da maior frequência de procedimentos com PMMA ou realmente existe uma maior incidência de complicações? Essa é uma limitação significativa, uma vez que não dispomos de dados absolutos sobre o número total de procedimentos realizados no Brasil e no mundo. Outra limitação é o fato de a revisão se basear apenas nos casos de complicações documentadas na literatura, o que pode não refletir a realidade. É provável que o número de complicações seja muito maior do que o relatado, visto que complicações não publicadas em artigos científicos não foram contabilizadas.
Conclusão
O uso de preenchimentos de PMMA está relacionado ao aparecimento de complicações imediatas e tardias graves. A maioria dos casos de complicações não está relacionada ao uso para a correção de lipodistrofias em pacientes com HIV/AIDS, e 64% dos casos de complicação descritos na literatura médica dos último 20 anos ocorreram no Brasil. O PMMA é inabsorvível, e múltiplos procedimentos cirúrgicos invasivos podem ser necessários para tratar as sequelas decorrentes da sua utilização como preenchedor permanente. Existem alternativas ao PMMA que são reversíveis e apresentam menores riscos à saúde dos pacientes.
Bibliographical Record
Marcelo Moura Costa Sampaio, Alessandra Lima Costa, Luiz Henrique Megale Conteville Vianna, Pedro Burlacchini Sanches Marinho, Ionara Maria de Almeida Santos, Mariana Alcantara Rodrigues de Moraes. Os riscos do polimetilmetacrilato: Revisão integrativa de 587 casos de complicações. Revista Brasileira de Cirurgia Plástica (RBCP) – Brazilian Journal of Plastic Surgery 2024; 39: s00441801343. DOI: 10.1055/s-0044-1801343