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DOI: 10.1055/s-0044-1787549
Redução fechada assistida por Kapandji e fixação percutânea com fio de Kirschner em fraturas do úmero proximal em adolescentes: Nota técnica
Article in several languages: português | EnglishResumo
As fraturas proximais do úmero representam aproximadamente 3 a 5% de todas as fraturas pediátricas e em adolescentes, com maior incidência em crianças mais velhas, principalmente entre 10 e 15 anos de idade. Fraturas sem luxação ou com luxação mínima geralmente podem ser tratadas de forma conservadora. No entanto, o manejo das fraturas proximais do úmero com luxação ou instabilidade em adolescentes pode exigir intervenção cirúrgica; nesses casos, a redução fechada e a fixação percutânea (CRPP, na sigla em inglês) são as técnicas mais empregadas. A CRPP não é isenta de possíveis desafios e dificuldades potenciais. Este artigo tem como objetivo descrever uma técnica que pode facilitar a CRPP e minimizar as complicações associadas a esta abordagem cirúrgica.
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Introdução
As fraturas proximais do úmero são responsáveis por aproximadamente 3 a 5% de todas as fraturas pediátricas. A maior incidência é observada em crianças mais velhas, principalmente entre 10 e 15 anos de idade.[1] As crianças do sexo masculino tendem a ser mais acometidas do que as do sexo feminino. Essas fraturas são geralmente decorrentes de quedas, lesões esportivas ou traumatismos diretos na região do ombro.
O tratamento das fraturas proximais do úmero em adolescentes depende de vários fatores, incluindo características da fratura, idade e maturidade esquelética. Fraturas sem luxação ou com luxação mínima geralmente podem ser tratadas de forma conservadora com imobilização usando tipoias ou cintas. Entretanto, fraturas com luxação ou instabilidade em pacientes com potencial limitado de remodelamento podem necessitar de intervenção cirúrgica. A redução fechada e a fixação percutânea (CRPP) são técnicas cirúrgicas comumente empregadas para o tratamento de fraturas proximais do úmero com luxação ou instabilidade em adolescentes.[2] [3] [4] Embora esses procedimentos possam ser eficazes na obtenção do alinhamento anatômico e na promoção da consolidação da fratura, eles apresentam desafios e possíveis dificuldades. Este artigo tem como objetivo descrever uma técnica que pode facilitar a CRPP e minimizar as complicações associadas a esta abordagem cirúrgica.
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Descrição da técnica
A [Tabela 1] descreve as indicações para o tratamento cirúrgico das fraturas proximais do úmero. A redução é considerada em fraturas com desvio superior a 33% (Neer III ou IV) ou angulação superior a 40 graus em pacientes até 2 anos antes de atingir a maturidade esquelética (meninos com idade ≥ 14 anos e meninas com idade ≥ 12 anos).[5] O paciente é posicionado em decúbito dorsal ou em cadeira de praia modificada para permitir a obtenção de imagens ortogonais ([Figs. 1] e [2]). Subsequentemente, todo o membro superior é preparado com campo cirúrgico. Com o braço em adução, 2 fios de Kirschner de 2,0 mm são inseridos de forma percutânea e avançados até o sítio da fratura. Nesta posição, é mais fácil introduzir os pinos do que com o braço em abdução e rotação. É crucial evitar o nervo axilar durante a colocação percutânea dos pinos. O nervo está localizado a 6 cm da face anterolateral do acrômio e os pinos são colocados distalmente a esse ponto. Após a confirmação radiográfica da posição dos pinos, é realizada a redução fechada da fratura com tração, abdução e rotação. Caso a redução seja considerada inadequada, utiliza-se um pino de Steinmann de 2,5 mm para facilitar a redução (técnica de Kapandji). Ocasionalmente, o periósteo ou a cabeça longa do bíceps podem interferir no sítio da fratura, com necessidade de redução aberta por via deltopeitoral. Depois da redução, os pinos são avançados e o pino de Steinmann é removido. É importante evitar a penetração dos fios de Kirschner na superfície articular. A seguir, há realização de fluoroscopia contínua para observação da rotação interna e externa máxima e avaliação da estabilidade e da posição final dos pinos. Na presença de sinais de instabilidade da fratura, um terceiro pino cruzado de 2,0 mm é inserido. Os fios são então cortados, dobrados e mantidos fora da pele, permitindo sua retirada no consultório.
Indicações |
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Fraturas expostas. |
Fraturas associadas a comprometimento neurovascular. |
Elevação cutânea ou risco iminente de fratura exposta. |
Crianças mais velhas, próximas à maturidade esquelética, com fraturas com luxações e anguladas. |
Politraumatismo com necessidade de carga de peso precoce no membro superior acometido. |
Fraturas ipsilaterais de membro (cotovelo flutuante). |
No período pós-operatório, o membro acometido é colocado em tipoia acolchoada para manter certo grau de abdução. A fratura é acompanhada quinzenalmente para avaliação da cicatrização e a tipoia e os pinos são removidos após 4 semanas no consultório. Exercícios passivos e progressivos ativos de amplitude de movimento do ombro, incluindo elevação para frente e rotação externa com o braço ao lado, bem como exercícios de pêndulo, começam depois da remoção do pino.
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Discussão
A fise proximal do úmero apresenta notável potencial de remodelação, com tolerância significativa a deformidades em crianças com esqueleto imaturo. No entanto, a intervenção cirúrgica pode ser necessária em determinadas situações. Este artigo apresenta uma técnica simples e eficaz que facilita a CRPP, minimizando o tempo operatório e as complicações associadas a esta abordagem cirúrgica ([Tabela 2]).
Desafios |
Como evitar |
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Lesão do nervo axilar |
O nervo está localizado a 6 cm da face anterolateral do acrômio e os pinos devem ser colocados distalmente a esse ponto. |
Penetração da superfície articular |
Realização de fluoroscopia contínua para avaliação da posição final dos pinos em todas as projeções. |
Perda de fixação |
Realização de fluoroscopia contínua em rotação interna e externa máxima para avaliação da estabilidade. |
Necrose cutânea |
Avaliação da necessidade de incisões de relaxamento cutâneo no sítio de inserção do pino. |
Infecção no sítio do pino |
Administração de antibióticos profiláticos, cuidados com pinos e observação atenta |
A utilização da CRPP é associada a dois desafios principais: 1) a redução, pois o controle do fragmento proximal é bastante difícil devido às forças musculares e 2) a fixação, uma vez que alcançar o ângulo de entrada oblíquo necessário para que os pinos atravessem a fratura pode representar dificuldades.
A manobra de redução fechada requer a aplicação de tração axial, abdução e rotação externa do braço. No entanto, a inserção de fios de Kirschner nessa posição apresenta desafios significativos devido ao ângulo de entrada oblíquo necessário para atravessar a fratura no osso cortical duro. Para superar essa dificuldade, foi proposto o uso de uma guia de perfuração para garantir uma ancoragem mais segura do fio. No entanto, é comum que os pinos deslizem ao tentar uma trajetória distal-proximal.[6] Com base em nossa experiência, constatamos que a colocação percutânea de dois fios de Kirschner de 2,0 mm até atingir a fratura com o braço em adução é mais fácil do que a introdução dos pinos na posição de redução. Uma vez confirmada a posição adequada dos pinos à fluoroscopia, é realizada uma redução fechada da fratura e os pinos são avançados na epífise. Tradicionalmente, se essa manobra não obtivesse redução satisfatória, seria realizada uma redução aberta com abordagem deltopeitoral, o que não é isento de riscos. Na técnica proposta, nas situações em que a redução é inadequada em manobras fechadas, utiliza-se um pino de Steinmann de 2,5 mm para auxiliar a redução com uma manobra de tipo Kapanji. Essa técnica pode auxiliar a obtenção do alinhamento adequado da fratura, evitando a redução aberta. Recentemente, Goldstein et al.[6] propuseram o uso de uma pinça hemostática romba para fins semelhantes. Esse instrumento permite o acesso seguro ao sítio da fratura, alavanca o córtex do fragmento distal e o translada para alinhamento com o úmero proximal.
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Considerações finais
Em resumo, a maioria das fraturas proximais do úmero na população pediátrica e adolescente pode ser tratada sem cirurgia devido ao seu notável potencial de remodelação. Contudo, nos casos em que a angulação e o deslocamento excedem os limites aceitáveis, a nossa técnica de CRPP pode ser uma abordagem fiável para alcançar uma redução satisfatória e uma fixação estável. Este método é um meio reprodutível para tratamento de fraturas que exigem intervenção cirúrgica.
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Comitê de Ética
Estudos de técnica cirúrgica não requerem aprovação pelos Comitês de Ética de nossas instituições.
Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia Pediátrica, Sanatorio Allende, Córdoba, Argentina.
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Referências
- 1 Peterson CA, Peterson HA. Analysis of the incidence of injuries to the epiphyseal growth plate. J Trauma 1972; 12 (04) 275-281
- 2 Dobbs MB, Luhmann SL, Gordon JE, Strecker WB, Schoenecker PL. Severely displaced proximal humeral epiphyseal fractures. J Pediatr Orthop 2003; 23 (02) 208-215
- 3 Pahlavan S, Baldwin KD, Pandya NK, Namdari S, Hosalkar H. Proximal humerus fractures in the pediatric population: a systematic review. J Child Orthop 2011; 5 (03) 187-194
- 4 Swarup I, Hughes MS, Bram JT, Horn BD, Ganley TJ. Percutaneous pinning of pediatric proximal humeral fractures. JBJS Essential Surg Tech 2019; 9 (04) e33.1-e33.6
- 5 Kim AE, Chi H, Niknam K, Swarup I. Management of Pediatric Proximal Humerus Fractures: Current Concept Review. JPOSNA 2023; 5 (01) 1-12 . Available from: https://www.jposna.org/index.php/jposna/article/view/580
- 6 Goldstein S, Swarup I, Noonan KJ. Percutaneous fixation of pediatric proximal humerus fractures: Master's surgical technique. JPOSNA 2023; 5 (02) 1-10 . Available from: https://www.jposna.org/index.php/jposna/article/view/703
Endereço para correspondência
Publication History
Received: 30 May 2023
Accepted: 06 November 2023
Article published online:
01 August 2024
© 2024. The Author(s). This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution 4.0 International License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/)
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Referências
- 1 Peterson CA, Peterson HA. Analysis of the incidence of injuries to the epiphyseal growth plate. J Trauma 1972; 12 (04) 275-281
- 2 Dobbs MB, Luhmann SL, Gordon JE, Strecker WB, Schoenecker PL. Severely displaced proximal humeral epiphyseal fractures. J Pediatr Orthop 2003; 23 (02) 208-215
- 3 Pahlavan S, Baldwin KD, Pandya NK, Namdari S, Hosalkar H. Proximal humerus fractures in the pediatric population: a systematic review. J Child Orthop 2011; 5 (03) 187-194
- 4 Swarup I, Hughes MS, Bram JT, Horn BD, Ganley TJ. Percutaneous pinning of pediatric proximal humeral fractures. JBJS Essential Surg Tech 2019; 9 (04) e33.1-e33.6
- 5 Kim AE, Chi H, Niknam K, Swarup I. Management of Pediatric Proximal Humerus Fractures: Current Concept Review. JPOSNA 2023; 5 (01) 1-12 . Available from: https://www.jposna.org/index.php/jposna/article/view/580
- 6 Goldstein S, Swarup I, Noonan KJ. Percutaneous fixation of pediatric proximal humerus fractures: Master's surgical technique. JPOSNA 2023; 5 (02) 1-10 . Available from: https://www.jposna.org/index.php/jposna/article/view/703