Palavras-chave
pseudoartrose - tíbia - resultado do tratamento - técnica de Ilizarov
Introdução
As pseudoartroses são um dos problemas mais importantes enfrentados por cirurgiões
ortopédicos em todo o mundo no tratamento de fraturas dos ossos tubulares longos.
Além da dificuldade de consolidação, problemas graves como deformidade, infecção e
discrepância dos membros acompanham o quadro clínico.[1]
As fraturas podem evoluir com retardo ou não consolidação. As pseudoartroses são definidas
como a falta de consolidação de uma fratura, com evidências clínicas e/ou radiológicas
que o processo de cicatrização da fratura finalizou, e sua consolidação será altamente
improvável.[2]
Há a necessidade de um tratamento que estimule a consolidação óssea, trate a infecção
e resolva os problemas de discrepância de comprimento e deformidades angulares.[3] Em 1951, em Kurgan, na Rússia, Gavriil Abramovich Ilizarov iniciou o uso da fixação
externa e desenvolveu, com grande êxito, seu método para o tratamento de várias lesões
ortopédicas e traumatológicas.[4]
A possibilidade de alongar o osso de forma segura e previsível, pela tração gradual
segundo o princípio proposto por Ilizarov, permitiu o alongamento ósseo sob nova visão
biológica, bem como o desenvolvimento de uma nova técnica denominada de osteossíntese
de compressão-afastamento.[5]
Este trabalho, portanto, busca analisar os resultados e os dados clínicos e epidemiológicos
do tratamento das pseudoartroses infectadas da tíbia tratadas pelo método de Ilizarov
associado ao curativo de Orr.
Métodos
Este trabalho teve a aprovação do comitê de ética sob o número: 53773621.3.0000.5553.
Foram avaliados, retrospectivamente, 43 prontuários médicos de pacientes com diagnóstico
de pseudoartrose infectada da tíbia do Hospital Regional de Sobradinho, Distrito Federal,
no período de julho de 2012 a dezembro de 2019. Os critérios de inclusão relacionam-se
aos casos de pseudoartroses da tíbia infectadas tratadas pelo método de Ilizarov ao
menos seis meses após a retirada do fixador, em pacientes maiores de 18 anos, homens
e mulheres, que possuíam todos os dados disponíveis no prontuário. Foram utilizados
como critérios de exclusão os casos de pseudoartroses não infectadas, de pseudoartroses
da tíbia tratadas por outros métodos e de pseudoartrose congênita na tíbia, bem como
pacientes menores de 18 anos e com dados insuficientes no prontuário.
Os dados foram coletados dos prontuários eletrônicos por meio de planilhas, em um
formulário de coleta desenvolvido pelo próprio pesquisador, e os resultados ósseos
e funcionais foram avaliados de acordo com os critérios de avaliação de Paley et al.[6] ([Tabelas 1] e [2]>).
Tabela 1
Resultados ósseos
|
Obtenção de união óssea
|
Ausência de infecção
|
Deformidade angular menor que 7°
|
Discrepância de comprimento inferior a 2,5cm na tíbia
|
Excelente
|
Todos os critérios acima
|
Bom
|
Consolidação óssea, mais quaisquer dois dos outros critérios
|
Regular
|
União óssea, mais um dos outros critérios
|
Ruim
|
Não se obteve a consolidação óssea, ou ocorreu refratura, ou não alcançou nenhum dos
outros critérios
|
Tabela 2
Resultados funcionais
|
Claudicação significativa
|
Rigidez em equino de tornozelo
|
Distrofia de tecidos moles
|
Dor e inatividade
|
Excelente
|
Indivíduo ativo com nenhum dos quatro critérios
|
Bom
|
Indivíduo ativo com um ou dois dos critérios
|
Regular
|
Indivíduo ativo com três critérios ou com os quatro
|
Ruim
|
Indivíduo inativo, independentemente dos outros critérios
|
Para analisar dados de n = 43 pacientes com diagnóstico de pseudoartrose infectada
da tíbia, foram aplicados métodos estatísticos descritivos e inferenciais. As variáveis
qualitativas serão apresentadas por distribuição de frequências absolutas e relativas.
As variáveis quantitativas foram apresentadas por medidas de tendência central e de
variação e tiveram a normalidade avaliada pelo teste de D'Agostino-Pearson
, os testes de Qui-quadrado de aderência
, teste t Student
e a correlação linear de Person
também foram utilizados.[7] Foi previamente fixado erro alfa em 5% para rejeição de hipótese nula, e o processamento
estatístico foi realizado nos programas BioEstat versão 5.3 e STATA release 17.[8]
Técnica cirúrgica e tratamento ambulatorial
Cada paciente foi avaliado clínica e radiologicamente antes do procedimento cirúrgico.
Os aparelhos de Ilizarov foram montados durante o per-operatório de acordo com o tamanho
do segmento, verificando comprimento e largura necessários. As incisões geralmente
foram realizadas nas topografias das cicatrizes cirúrgicas prévias.
Os materiais implantados, quando presentes, foram removidos. Incisão anterior ou anteromedial
foi realizada para ressecção do tecido ósseo inviável. Considera-se inviável o tecido
necrótico ou a borda óssea menor do que 2/3 do diâmetro normal. As amostras ressecadas
foram encaminhadas para estudo histopatológico.
A montagem dos fixadores externos de Ilizarov foi realizada seguindo o padrão da escola
italiana,[5] utilizando fios de Kirschner 1.8 milímetros, juntamente com pinos de Schanz cônicos
de 6 milímetros. Os fixadores foram estendidos até o pé para minimizar deformidade
em equino nos alongamentos ósseos maiores que 4 centímetros ou nos casos de falhas
ósseas metafisárias distais. Foram realizadas corticotomias com serra de Gigli (técnica
americana).
O tipo de reconstrução óssea é utilizado conforme o tamanho da falha óssea a ser reconstruída.
Foi utilizado transporte bifocal nas falhas ósseas menores que 4 cm e transporte ósseo
trifocal nas falhas ósseas maiores que 4 cm. Nas falhas ósseas acima de 10 cm, foi
utilizado o transporte ósseo tetrafocal ou a reconstrução com fíbula; em um paciente,
foi realizada a tibialização da fíbula.
A ferida operatória localizada no local da ressecção do tecido ósseo inviável sempre
foi mantida aberta, o tamanho da ferida variou de acordo com o tamanho da ressecção
óssea, podendo ser menores que 4 cm nos transportes bifocais e maiores que 4 cm nos
trifocais, até mesmo maiores que 10 cm nas ressecções maiores. Os curativos foram
feitos com gazes umedecidas com óleo de girassol. Esses curativos profundos são trocados
semanalmente no ambulatório de ortopedia, seguindo a técnica proposta por Orr.[9] Não foram utilizados procedimentos adicionais, como cirurgias plásticas.
No pós-operatório, os pacientes geralmente receberam alta hospitalar nas primeiras
48 horas, com prescrições de medicamentos antimicrobianos e analgésicos, via oral,
para uso na primeira semana seguindo protocolo hospitalar pré-estabelecido. Após o
tratamento cirúrgico de ressecção, os antibióticos foram descontinuados, ou mesmo
não utilizados, ficando a antibioticoterapia reservada apenas para os casos de infecção
relacionadas aos trajetos dos pinos e fios.
Os pacientes foram orientados a manterem o membro elevado e a utilizarem órtese elástica
para dorsiflexão passiva para o tornozelo. Estimula-se a descarga de peso a partir
da terceira semana após a cirurgia. Além disso, o tratamento fisioterápico é amplamente
recomendado, porém, muitas vezes, ele é bastante prejudicado ou negligenciado devido
a fatores socioeconômicos.
O transporte ósseo é iniciado entre a 2ª e a 3ª semana após a cirurgia. Foi utilizada
a velocidade de 0,5 milímetros ao dia para a construção de cada regenerado, dividida
em duas etapas manipulações diárias.
Quando alcançado o fechamento da ferida por segunda intenção e a finalização do transporte
ósseo, um novo procedimento cirúrgico para enxertia de osso esponjoso autólogo retirado
da crista ilíaca foi realizado nos focos das pseudoartroses.
Após a enxertia, uma avaliação radiológica foi feita mensalmente para verificar a
união no local de pseudoartrose e a consolidação dos regenerados, como também das
possíveis complicações. O fixador foi removido quando a completa dinamização do aparelho
foi alcançada, quando a pseudoartrose estava consolidada, quando os regenerados estavam
corticalizados em pelo menos três dos quatro lados, quando não havia dor à palpação
óssea e quando os pacientes descarregaram carga total sobre o membro afetado. Após
a retirada do aparelho, foram utilizadas órteses protetoras do tipo bota durante pelo
menos um mês, para evitar casos de refratura.
Resultados
O presente estudo analisou dados de n = 43 pacientes com diagnóstico de pseudoartrose
infectada da tíbia. A [Tabela 3] apresenta a caracterização dos pacientes tratados, sendo a faixa etária entre 50-59
anos a mais frequente com 25,6%, o sexo masculino com 86% e a tíbia esquerda a mais
acometida em 53,5%, devido a acidentes motociclísticos em 37,2%.
Tabela 3
Características gerais
|
Frequência
|
χ2
|
Categorias
|
n = 43
|
%
|
p-valor
|
Faixa etária
|
|
|
0.8610
|
20 a 29 anos
|
7
|
16.3
|
|
30 a 39 anos
|
9
|
20.9
|
|
40 a 49 anos
|
7
|
16.3
|
|
50 a 59 anos
|
11
|
25.6
|
|
60 anos ou mais
|
9
|
20.9
|
|
Sexo
|
|
|
<0.0001*
|
Feminino
|
6
|
14.0
|
|
Masculino
|
37
|
86.0
|
|
Motivo do trauma
|
|
|
<0.0001*
|
Arma de fogo
|
2
|
4.7
|
|
Atropelamento
|
3
|
7.0
|
|
Motocicleta
|
16
|
37.2
|
|
Queda própria altura
|
1
|
2.3
|
|
Não especificado
|
21
|
48.8
|
|
Lateralidade
|
|
|
0.7604
|
Direita
|
20
|
46.5
|
|
Esquerda
|
23
|
53.5
|
|
O tempo de tratamento, como mostra a [tabela 4], pode ser estimado pela seguinte equação: Tempo de tratamento = 6.7 + Idade * 0.2895, a qual indica que a correspondência é diretamente proporcional ([Fig. 1]), 44,2% foram tratados entre 12-23 meses, em 46,5% o tipo de tratamento foi o transporte
ósseo bifocal e 46,5% trifocal, 88,3% apresentaram infecção no trajeto do pino.
Fig. 1 Correlação entre Idade do paciente (anos) e Tempo de tratamento (meses) de n = 43
pacientes com diagnóstico de pseudoartrose infectada da tíbia.
Tabela 4
Tratamento e complicações
|
Frequência
|
χ2
|
Caracterização
|
n = 43
|
%
|
p-valor
|
Tempo do tratamento em meses
|
|
|
0.0063*
|
11 meses ou menos
|
9
|
20.9
|
|
12 a 23 meses
|
19
|
44.2
|
|
24 a 35 meses
|
12
|
27.9
|
|
36 meses ou mais
|
3
|
7.0
|
|
Tipo de tratamento
|
|
|
<0.0001*
|
Bifocal
|
20
|
46.5
|
|
Trifocal
|
20
|
46.5
|
|
Tetrafocal
|
2
|
4.7
|
|
Tibialiazação da fíbula
|
1
|
2.3
|
|
Complicação
|
|
|
<0.0001*
|
Fratura do regenerado
|
2
|
4.7
|
|
Osteólise/soltura do pino
|
1
|
2.3
|
|
Infecção no trajeto do pino
|
38
|
88.3
|
|
Refratura
|
2
|
4.7
|
|
A [Tabela 5] descreve a avaliação dos resultados funcionais após o tratamento, observando-se
que 58,1% dos pacientes não apresentavam claudicação e 95,3% não apresentaram distrofia.
A [Tabela 6], por sua vez, mostra a caracterização do tempo de tratamento, o qual é maior quando
o paciente tem claudicação (24.2 meses) em comparação a quando o paciente não claudica
(17.6 meses), sendo p-valor =0.0469* (estatisticamente significante), conforme apresentado
na [Fig. 2].
Fig. 2 Tempo de tratamento conforme tipo de tratamento e claudicação em n = 43 pacientes
com diagnóstico de pseudoartrose infectada da tíbia.
Tabela 5
Avaliação dos resultados funcionais
|
Frequência
|
χ2
|
Características
|
n = 43
|
%
|
p-valor
|
Claudicação
|
|
|
0.3602
|
Sim
|
18
|
41.9
|
|
Não
|
25
|
58.1
|
|
Deformidade em equino
|
|
|
<0.0001*
|
Sim
|
5
|
11.6
|
|
Não
|
38
|
88.4
|
|
Distrofia
|
|
|
<0.0001*
|
Sim
|
2
|
4.7
|
|
Não
|
41
|
95.3
|
|
Dor/inatividade
|
|
|
<0.0001*
|
Sim
|
4
|
9.3
|
|
Não
|
39
|
90.7
|
|
Discrepância menor que 1,5cm
|
|
|
0.0008*
|
Sim
|
33
|
76.7
|
|
Não
|
10
|
23.3
|
|
Tabela 6
|
|
Tempo de tratamento (mês)
|
|
|
n
|
Média
|
DP
|
p-valor
|
Motivo do trauma
|
|
|
|
0.2876
|
Arma de fogo
|
2
|
16.0
|
14.1
|
|
Atropelamento
|
3
|
23.7
|
4.0
|
|
Queda de motocicleta
|
16
|
19.3
|
12.8
|
|
Queda da própria altura
|
1
|
25.0
|
—
|
|
Não especificado
|
21
|
20.9
|
8.9
|
|
Tipo de tratamento
|
|
|
|
0.0100*
|
Bifocal
|
20
|
15.6
|
6.4
|
|
Trifocal
|
20
|
23.8
|
11.6
|
|
Tetrafocal
|
2
|
33.5
|
2.1
|
|
Tibialiazação da fíbula
|
1
|
21.0
|
—
|
|
Claudicação
|
|
|
|
0.0469**
|
Sim
|
18
|
24.2
|
12.1
|
|
Não
|
25
|
17.6
|
7.6
|
|
Deformidade em equino do pé
|
|
|
|
0.4272
|
Sim
|
5
|
23.8
|
10.7
|
|
Não
|
38
|
19.9
|
10.2
|
|
Distrofia
|
|
|
|
n/a
|
Sim
|
2
|
37.0
|
2.8
|
|
Não
|
42
|
19.5
|
9.7
|
|
Dor/inatividade
|
|
|
|
0.1509
|
Sim
|
4
|
37.3
|
19.3
|
|
Não
|
39
|
18.6
|
7.2
|
|
Em relação aos resultados da anatomia patológica, foi possível localizar os resultados
em apenas 8 dos 43 pacientes avaliados, sendo estas 8 amostras positivas para osteomielite.
As culturas costumeiramente não foram solicitadas, já que foi optado por não utilização
de antibióticos após o tratamento de ressecção óssea e reconstrução.
Os desfechos ósseos e funcionais foram avaliados retrospectivamente, por meio da análise
das informações contidas nos prontuários médicos de todos os pacientes após o término
do tratamento, por meio dos critérios de Paley et al.[6] ([Tabela 1]).
Neste estudo, 72,09% dos pacientes obtiveram resultados ósseos excelentes ([Fig. 3]) e 23,25% apresentaram resultados considerados bons. Nenhum paciente obteve resultado
ósseo regular e 4,65% tiveram resultados ósseos ruins. Todos os pacientes obtiveram
a cura da infecção óssea e consolidação da pseudoartrose, os resultados regulares
e ruins foram relacionados a deformidades ou discrepâncias residuais, além de casos
de refratura.
Fig. 3 (a) Homem com pseudoartrose de tíbia direita esquerda com exposição do material de síntese;
(b) Radiografia após retirada do material, ressecção óssea e montagem do fixador de
Ilizarov objetivando transporte ósseo trifocal; (c, d) Radiografia mostra transporte ósseo; (e) Radiografia mostra o estado próximo ao término do transporte; (f, g) Fratura consolidada.
Quanto aos resultados funcionais ([Tabela 2]), o presente estudo encontrou o seguinte cenário: 55,81% dos pacientes apresentaram
resultados funcionais excelentes ([Fig. 4]); 6,97% tiveram resultados bons; 27,90%, regulares; e, por fim, 9,30% apresentaram
resultados ruins.
Fig. 4 (a) Homem no pós-operatório imediato do fixador de Ilizarov para tratamento de pseudoartrose
infectada; (b, c) Paciente durante o tratamento; (d, e, f, g) Resultado funcional após retirada do fixador de Ilizarov.
Em relação às complicações ocorridas durante o tratamento, foi observado que, em algum
momento do tratamento, em todos os pacientes, ocorreram infecções relacionadas aos
pinos de Schanz e aos fios de Kirschner, sendo que, em um deles, houve a soltura do
pino e, portanto, a necessidade de um procedimento adicional para debridamento cirúrgico
do trajeto e fixação de um novo pino. Em um outro paciente, esse processo infeccioso
levou à instabilidade do bloco distal do fixador, e isso foi resolvido com novo procedimento
de revisão do aparelho.
Dois pacientes incorreram com refratura após retirada do fixador e foram tratados
conservadoramente com aparelhos gessados e órteses do tipo bota. Um paciente apresentou
fratura do regenerado ósseo e foi tratado com órtese imobilizadora do tipo bota, evoluindo
com consolidação óssea sem deformidades.
Ao avaliar os desfechos de partes moles, todos os pacientes foram tratados sem necessidade
de procedimentos adicionais, tais como retalhos ou enxertos cutâneos. O curativo com
gazes umedecidas com vaselina líquida ou com óleo de girassol (curativo na técnica
de Orr)[9] foi o recurso utilizado; alcançou-se, assim, a cicatrização por segunda intenção
das feridas com cobertura de partes moles em todos os pacientes avaliados.
Discussão
Ilizarov postulou novos conceitos biológicos e técnicas de um sistema de fixação externa
que revolucionou o tratamento das pseudoartroses. Por meio desse sistema, é possível,
com osteossíntese mínima, corrigir deformidades, erradicar infecções, equalizar membros
e eliminar falhas ósseas, concomitantemente, manter a função articular e permitir
carga corpórea precoce.[6]
Em relação aos dados epidemiológicos idade, sexo e lateralidade, este estudo foi corroborado
por outro estudo[3] que incluiu 20 pacientes portadores de pseudartrose unilateral infectada da tíbia
tratados pelo método de Ilizarov, no qual 16 pacientes eram homens e quatro eram mulheres,
com média de idade de 32 anos (17-74). Quanto ao lado acometido, nove (45%) foram
do lado direito e 11 (55%), do lado esquerdo.
Em relação as opções e o tempo de tratamento, no presente estudo, os transporte ósseos
bifocal e trifocal foram os recursos mais utilizados e o tempo médio de tratamento
foi de 20,34 meses. Um estudo indiano[9] utilizou o transporte bifocal em 85% dos pacientes, diferentemente do estudo de
americano,[5] onde 10 pacientes receberam tratamento monofocal de compressão-distração, o tratamento
bifocal foi realizando em 7 pacientes e em três deles, o tratamento bifocal foi combinado
com a ressecção do infectado osso.
Esses dados diferem de outros trabalhos,[6]
[10] uma vez que um encontrou um tempo médio de consolidação de 12,57 meses, e o outro
apresentou tempo médio de acompanhamento de 40,8 meses. Outros autores,[11] no entanto, observaram que 85% dos pacientes foram tratados por transporte bifocal.
Em relação aos resultados ósseos deste estudo, observaram-se dados semelhantes aos
encontrados por Maini et al.,[12] os quais obtiveram 70% de resultados excelentes, 10% bons, 0% regular e 20% ruins.
Esse mesmo cenário foi encontrado por McNally et al.,[11] que apresentaram 60% de resultados excelentes, 15% bons, 25% regulares e 0% ruim,
e isso diverge de outro estudo,[13] no qual obtiveram 22% de excelentes resultados, 36,34% bons, 22% regulares e 18,18%
ruins.
Outros dois trabalhos apresentaram resultados comparáveis,[6]
[14] sendo que o primeiro alcançou os seguintes resultados ósseos: 60,87% excelentes,
26,09% bons, 8,7% regulares e 4,35% ruins. Já o segundo obteve como resultados excelentes
50%, os bons foram 29%, os regulares, 3,6%, e os ruins, 17,4%.
Os resultados funcionais nesse estudo foram os seguintes: 55,81% excelentes, 6,97%
bons, 27,90% regulares e 9,30% ruins. Esse cenário se assemelha a outro trabalho,[14] que obteve 55% de excelentes resultados, 30% de bons, 5% de regulares e 10% de ruins.
Esses dados diferem de outros quatro estudos,[6]
[13]
[15]
[16] os quais apresentaram as seguintes conclusões: o primeiro alcançou 26,7% de resultados
funcionais excelentes, 40% bons, 10% regulares e 28,3% ruins; o segundo encontrou
5,56% excelentes, 22,22% bons, 33,33% regulares e 38,89% ruins; já o terceiro obteve
25% excelentes, 39,2% bons, 14,3% regulares e 2,15% ruins; o quarto, por fim, apresentou
64% excelentes, 28% bons, 4% regulares e 4% ruins.
Existem complicações e intercorrências inerentes e habituais ao uso de fixador externo,
que são infecção nos trajetos dos pinos e fios, contraturas articulares, lesões vasculonervosas
e perda da estabilidade do aparelho. Entretanto, existem certas complicações próprias
aos transportes ósseos das pseudoartroses.[17]
A consolidação prematura e o retardo na ossificação do regenerado são complicações
oriundas da falta de equilíbrio em relação ao ritmo e à periodicidade do alongamento.
Outras complicações são a deformidade angular e a fratura do regenerado, que ocorrem,
na maioria das vezes, por retirada precoce do aparelho, como também por quedas do
paciente durante ou após o tratamento.[18]
Em relação às complicações ocorridas durante o tratamento, foi observado que, em algum
momento, todos os pacientes apresentaram infecções relacionadas aos pinos de Schanz
e aos fios e de Kirchner. Essa observação é corroborada por outro estudo,[18] o qual concluiu que a infecção superficial no trajeto dos pinos e/ou fios pode chegar
a até 100% dos casos e sempre está presente em alguma fase do tratamento.
Ao avaliar os desfechos de partes moles, todos os pacientes foram tratados sem necessidade
de procedimentos adicionais, tais como retalhos ou enxertos cutâneos. O curativo com
gaze vaselinada (curativo de Orr) foi o recurso utilizado, alcançando assim a cicatrização
das feridas com cobertura de partes moles em todos os pacientes avaliados.
O cirurgião de guerra H. Winnett Orr[9] desenvolveu o tratamento da osteomielite aguda por meio da drenagem e um de curativo
asséptico que deve ser colocado dentro e ao redor da ferida, o qual não deve ser retirado
ou trocado por várias semanas. Geralmente, dois ou quatro curativos são suficientes
para garantir a cicatrização; enquanto isso, o membro é mantido imobilizado com aparelho
gessado e os curativos são trocados por meio de uma janela feita no gesso.
Esse curativo com tamponamento com gaze vaselinada é usado desde a Primeira Guerra
Mundial ([Fig. 5]). A vaselina sólida impregna as gazes e não permite que haja a penetração dos brotos
de neoformação vascular nas margens delas, entretanto, ao mesmo tempo, permite o escoamento
das secreções. O crescimento do tecido vai empurrando gradativamente o tamponamento
para fora e, quando atingir o nível da pele, ocorre o recobrimento da ferida pelo
epitélio proveniente das bordas do próprio ferimento.[19]
Fig. 5 (a) Exemplo de curativo com gaze vaselinada de Orr; (b) Homem no intra-operatório do fixador de Ilizarov para transporte ósseo tetrafocal
em tandem; (c) Radiografia do pós-operatório imediato do fixador de Ilizarov para transporte tetrafocal;
(d) Algumas semanas após início do transporte ósseo e trocas do curativo de Orr; (e) Paciente após término do transporte, retirada do fixador de Ilizarov e trocas do
curativo de Orr; (f) Radiografia após retirada do fixador de Ilizarov e transporte tetrafocal.
Conclusão
O método de Ilizarov proporcionou uma mudança substancial no tratamento das infecções
ósseas, especialmente das pseudoartroses infectadas, e a versatilidade desse método
o transformou em uma ferramenta eficaz, uma vez que permite a cura do processo infeccioso,
bem como a correção das possíveis deformidades e dos encurtamentos dos membros.
Os dados epidemiológicos e os resultados ósseos e funcionais deste trabalho foram
corroborados por grande parte da literatura e demonstram a eficácia do método, na
qual foi obtida a resolução do processo infecioso, a consolidação óssea, além de fornecer
uma razoável recuperação funcional aos indivíduos avaliados.
As complicações são inerentes ao tratamento, devido ao período muitas vezes prolongado
até a obtenção da cura, e devem ser compreendidas e manejadas adequadamente pelo médico
assistente e pelo paciente, de forma a buscar minimizá-las ao máximo.
O manejo das partes moles também é um fator importante a ser levado em consideração.
O curativo com gaze vaselinada mostrou-se uma opção eficaz e barata no tratamento
das partes moles, uma vez que elimina a necessidade de procedimentos cirúrgicos adicionais,
bem como gera economia e menor desgaste físico e emocional aos pacientes.