Palavras-chave
cartilagem articular - células-tronco mesenquimais - transplante de células-tronco
mesenquimais - ácido hialurônico
Introdução
O manejo dos defeitos da cartilagem é desafiador devido à capacidade limitada de reparação
tecidual. Diversas modalidades de tratamento têm sido realizadas para melhorar a cicatrização
e promover regeneração. As aplicações biológicas têm ganhado notoriedade nas últimas
décadas,[1] desde a primeira descrição do tratamento com implante autólogo de condrócitos[2] na década de 1990. Anos depois, a técnica de implantação celular foi aprimorada
com o uso de estruturas tridimensionais (scaffolds), aperfeiçoando os resultados clínicos
relatados com até uma década de seguimento.[3]
As células-tronco mesenquimais (CTMs) foram recentemente propostas como opção potencial
para restauração da cartilagem. As CTMs são conhecidas por apresentarem características
biológicas únicas, incluindo propriedades imunomoduladoras, anti-inflamatórias e de
liberação de citocinas prorregenerativas.[4]
[5]
[6] Elas podem ser isoladas de vários tecidos do corpo humano,[7]
[8]
[9] incluindo tecido adiposo (AD-CTMs), músculo, osso, sinóvia, polpa dentária e cordão
umbilical.[10] As AD-CTMs são obtidas facilmente, além de apresentarem um perfil proliferativo
e uma capacidade in vitro de diferenciação semelhantes às CTMs da medula óssea.[11] As AD-CTMs são consideradas uma fonte celular ideal pela disponibilidade, propriedade
não imunogênica, ação anti-inflamatória, e por não apresentarem relação de efeito
entre a idade do doador e a capacidade de proliferação e diferenciação.[12] A fim de aprimorar o reparo da cartilagem, as células podem ser cultivadas in vitro
em meios com estímulos exógenos (ácido hialurônico [HA] e fatores de crescimento)
e, uma vez que atinjam a concentração desejada, podem ser implantadas em matrizes
tridimensionais, como membranas de colágeno.
O protocolo ideal do cultivo de AD-CTMs para aplicação clínica ainda está por ser
determinado. O AH tem sido considerado um excelente veículo para a administração de
CTMs na reparação tecidual.[13] Trata-se de um biopolímero formado pelo ácido glucurônico e N-acetilglicosamina.
Há, entretanto, diversos produtos de AH disponíveis comercialmente, os quais diferem
em fatores como origem (animal ou sintética) e propriedades físico-químicas (concentração,
pesos moleculares, viscosidade e elasticidade).
Com o intuito de aprimorar a interação entre os scaffolds e as células e, assim, melhorar
o processo de reparo da cartilagem, o presente estudo analisou a interação entre AD-CTMs,
AH e membrana de colágeno. Há um lapso de informações sobre a resposta das AD-CTMs
quando expostas ao AH, assim como se produtos comerciais com características diferentes
influenciam na atividade celular. Há poucos relatos da interferência do AH como substrato
para as AD-CTMs in vitro prévia ou posteriormente à colocação na membrana biossintética
de colágeno tipo I/III.
O presente estudo tem como principais objetivos:
-
Avaliar in vitro a viabilidade das AD-CTMs humanas quando em contato com diferentes
formulações comerciais de ácidos hialurônicos;
-
Analisar o uso de ácido hialurônico como veículo das AD-CTMs em membrana de colágeno
tipo I/III.
Materiais e Métodos
Para a realização do presente estudo in vitro, foram obtidas cinco amostras de tecido
adiposo humano para isolamento de AD-CTMs, após assinatura do termo de consentimento
livre e esclarecido (TCLE) pelo doador, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
(CAAE 60075616.5.0000.0071). Os procedimentos relacionados à transferência do material
biológico, ao isolamento e à manipulação das células in vitro foram realizados em
parceria com a empresa StemCorp Serviços Biomédicos Ltda., licenciada pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) como Centro de Processamento Celular segundo
os critérios da Resolução da Diretoria Colegiada n° 214.
A coleta de entre 10 e 20 mL de tecido adiposo da região subcutânea abdominal foi
realizada pelo cirurgião plástico, no centro cirúrgico, durante procedimento de lipoaspiração.
Após a coleta, as amostras foram transferidas para um frasco estéril contendo 10 mL
de solução salina tamponada com fosfato (PBS, na sigla em inglês) 1X pH 7,4, 200U/mL
de penicilina, 200ug/mL de estreptomicina, 0,5ug/mL de anfotericina e 50ug/mL de gentamicina
(Gibco). As amostras foram transferidas para uma caixa térmica com monitoramento de
temperatura (4 a 8°C) e transportadas até o laboratório para isolamento celular.
As AD-CTMs foram isoladas utilizando os métodos previamente descritos por Vieira et
al.[14]
[15] Para o cultivo das células in vitro, foi utilizado o meio de proliferação Dulbecco's
Modified Eagle Medium low glucose (DMEM-LG, na sigla em inglês) (Gibco) suplementado
com 10% de soro fetal bovino (SFB), penicilina 100U/mL, estreptomicina 100ug/mL e
anfotericina 0,25ug/mL (Gibco). As trocas de meio foram realizadas a cada 3 dias.
Cada linhagem foi mantida incubada a 37°C em uma atmosfera úmida contendo 5% CO2 até atingirem confluência de 80%. Neste ponto, as células foram passadas para novos
frascos de cultivo, na proporção de área 1:3, utilizando o reagente TrypLE (Gibco).
Este procedimento foi repetido até atingir quantidades de células suficientes para
a realização dos experimentos descritos abaixo.
Para o procedimento de criopreservação, as células foram descoladas dos frascos de
cultivo utilizando TrypLE (Gibco), centrifugadas e suspensas em meio de congelamento
StemPro (Gibco) contendo 10% DMSO. O congelamento das células foi realizado gradualmente,
em criotubos, e elas foram transferidas posteriormente para um tanque de nitrogênio
líquido.
Caracterização das Células Isoladas
Foram estabelecidos os três critérios da Sociedade Internacional de Terapia Celular
para a caracterização de CTMs: 1–aderência a superfície plástica; 2–capacidade de
diferenciação in vitro em adipócitos, condrócitos e osteócitos; 3–expressão de marcadores
de superfície específicos (imunofenotipagem).[16]
Imunofenotipagem
Para o teste de imunofenotipagem, as células foram cultivadas até a passagem oito,
descoladas dos frascos de cultivo e centrifugadas a 200 g por 5 minutos em temperatura
ambiente. Em seguida, o sobrenadante foi descartado e as células foram homogeneizadas
e suspensas em PBS. As células foram, então, marcadas com anticorpos monoclonais:
CD29-PerCP-Cy5, CD31-PE, CD45-FITC, CD73-PE, CD90-PE, CD105-PE, HLA-ABC-FITC, HLA-DR-PE
(BD Biosciences, Franklin Lakes, NJ, EUA), incubadas em temperatura ambiente e protegidas
da luz por 30 minutos. Após este período, as células foram lavadas com PBS, centrifugadas
a 500 g por 5 minutos, ressuspensas em solução tampão e colocadas em um citômetro
de fluxo BD FACS Canto II (BD Biosciences, Franklin Lakes, NJ, EUA). Os dados obtidos
foram analisados no software FLOWJO (TreeStar, Ashland, OR, EUA).
Ensaio de diferenciação
A análise do potencial de diferenciação das AD-CTMs foi realizada com meios para diferenciação
de adipócitos, condrócitos e osteoblastos. Cada grupo celular foi cultivado na presença
do meio específico durante 14 dias. Após este período, as células foram coradas com
Oil Red O (adipogênica), Azul de Alcian (condrogênica) ou Alizarina Red S (osteogênica).
A capacidade de diferenciação foi avaliada pela coloração.
Ensaio de Viabilidade
Interação Célula/Ácido Hialurônico
Linhagens de AD-CTMs, na passagem seis, foram descoladas dos frascos de cultivo utilizando
solução de TrypLE (Gibco) e centrifugadas a 300 g por 5 minutos. Ao final do processo,
as células foram contadas na câmara de Neubauer e 3 × 105 células foram separadas e adicionadas em microtubos de 1,5 mL, centrifugadas novamente
a 300 g por 5 minutos e suspensas em 20 µl de cada solução. Foram analisados 9 grupos:
7 produtos de AH ([Tabela 1]), PBS 1X pH 7,4 (controle negativo) e meio de proliferação (SFB). As células foram
incubadas com as respectivas soluções por 24, 48 e 72 horas em temperatura ambiente.
Tabela 1
Número
|
Produto
|
Molécula
|
Concentração
|
Peso molecular (MDa)
|
Elasticidade (Pa 2.5 Hz)
|
Viscosidade (Pa 2.5 Hz)
|
Fonte
|
Molécula crosslink
|
1
|
Opus Joint
|
Hialuronato sódio
|
1,5%
|
5,4
|
145
|
100
|
Bacteriana
|
Não
|
2
|
SupraHyal Duo
|
Hialuronato sódio
|
1%
|
0,75
|
1,2
|
Bacteriana
|
Não
|
3
|
Fermathron
|
Hialuronato sódio
|
1%
|
1,19–2,03
|
0,84
|
Bacteriana
|
Não
|
4
|
Orthovisc
|
Hialuronato sódio
|
1,5%
|
1–2,9
|
60
|
46
|
Bacteriana
|
Não
|
5
|
Synolis VA
|
Hialuronato sódio + sorbitol
|
2 + 4%
|
2
|
329
|
143
|
Bacteriana
|
Não
|
6
|
Synvisc
|
Hilano
GF-20
|
0,8%
|
6
|
111
|
25
|
Aviária
|
Sim
|
7
|
Osteonil
|
Hialuronato sódio
|
1%
|
1–2
|
−
|
210
|
Bacteriana
|
Não
|
A viabilidade celular foi estimada pelo número de células vivas pelo kit LIVE/DEAD
Viability/Cytotoxicity Assay Kit (Thermo) e o equipamento Countess II FL (Thermo).
As imagens das células marcadas, obtidas no Countess, foram contadas com auxílio do
software Image J versão 1.8.0_172 (National Institutes of Health, Bethesda, MD, EUA).
Toda a parte experimental foi realizada em teste cego e cada produto de AH recebeu
uma numeração. Ao final das análises, os nomes comerciais foram revelados para fins
comparativos.
Interação Célula/Ácido Hialurônico/Membrana de Colágeno Tipo I/III
Para a análise da interação entre AD-CTMs, AH e membrana de colágeno tipo I/III, foram
selecionados os cinco ácidos hialurônicos que apresentaram a melhor taxa de viabilidade
no experimento anterior.
Linhagens de AD-CTMs, na passagem sete, foram descoladas dos frascos de cultivo utilizando
solução de TrypLE (Gibco) e centrifugadas a 300 g por 5 minutos. Ao final do processo,
as células foram contadas na câmara de Neubauer e 2 × 105 células foram adicionadas em microtubos de 1,5 mL, centrifugadas novamente a 300 g
por 5 minutos e suspensas em 40 µl de produto de AH (números 1, 2, 4, 5 e 7; [Tabela 1]), PBS 1X pH 7,4 e SFB. A mistura célula mais solução (AH, PBS, SFB) foi então adicionada
na superfície de membrana de colágeno tipo I/III (Chondro-Gide, Geistlich) e acondicionadas
em placas de 48 poços. As células foram incubadas por 1 hora em atmosfera de 5% CO2 a 37°C, o tempo de adesão das células na membrana, quando, então, foram adicionados
400uL de meio de proliferação. As células foram mantidas na mesma atmosfera por 24,
48 e 72 horas, com análise de viabilidade nestes períodos, utilizando a metodologia
descrita com o kit LIVE/DEAD (Thermo).
Resultados
Isolamento das AD-CTMs do Tecido Adiposo
Das cinco amostras de tecido adiposo, houve 100% de sucesso na obtenção de células
aderentes para a realização do estudo in vitro. A quantidade coletada para o isolamento
das células de cada paciente foram: A1 (11,27 g); A2 (18,57 g); A3 (12,16 g); A4 (20,99 g);
A5 (18,88 g). As amostras foram obtidas de pacientes do sexo feminino com uma média
de idade de 30,2 anos. Todas as linhagens apresentaram morfologia compatível às células
mesenquimais (longas e fusiformes, semelhantes a fibroblastos), com taxa de proliferação
esperada até as passagens avaliadas.
Caracterização das Células Isoladas
Imunofenotipagem
As cinco linhagens apresentaram características específicas de células-tronco mesenquimais.
Observamos porcentual positivo (> 80%) para os marcadores relacionados à aderência
CD29 e CD90; relacionados à caracterização de células mesenquimais CD73 e CD105; e
marcador de MHC classe I HLA-ABC. Observamos porcentual negativo (< 1%) para o marcador
hematopoiético CD45; o marcador endotelial CD31; e o marcador de MHC classe II HLA-DR
([Figura 1]).
Fig. 1 Imunofenotipagem das células aderentes obtidas do tecido adiposo. Os histogramas
em cinza representam a população de células não marcadas com anticorpos (controle
negativo). Os histogramas em vermelho representam a população de células marcadas
com os respectivos anticorpos descritos em cada linha. Os gráficos mostram o número
de células versus intensidade de fluorescência nos cinco casos.
Ensaios de Viabilidade
Interação Célula com Ácido Hialurônico
Observamos que o PBS apresentou a melhor taxa de viabilidade nos tempos analisados,
sendo, então, considerado a solução de referência para comparações com as demais soluções
([Tabela 2]). No momento 24 horas, o ácido 5 apresentou um valor médio de porcentagens de células
vivas (96,2% ± 1,7) semelhante à taxa observada com o PBS. Não observamos evidências
de diferenças entre o PBS e o ácido 1 (p = 0,075), o ácido 2 (p = 0,169), o ácido 3 (p = 0,090), o ácido 5 (p = 0,704) e o ácido 6 (p = 0,084). No momento 48 horas, o tratamento com ácido 5 também apresentou taxas semelhantes
às do PBS (95,8% ± 2,8). Porém, não observamos evidências de diferenças entre o PBS
e o ácido 1 (p = 0,097), o ácido 4 (p = 0,059) e o ácido 5 (p = 0,089). No momento 72 horas, todos os tratamentos apresentaram taxas menores de
células vivas em relação ao PBS.
Tabela 2
Momento
|
Tratamento
|
Média de % de células vivas
|
DP de % de células vivas
|
Média (IC95%)
|
valor-p
|
Média (IC95%)
|
valor-p
|
24h
|
AH 1
|
93,7 (90,3–97,3)
|
0,075
|
2,7 (1,4–5,3)
|
0,956
|
AH 2
|
94,4 (91,5–97,5)
|
0,169
|
2,9 (1,4–6,0)
|
0,839
|
AH 3
|
93,4 (91,4–95,4)
|
0,090
|
2,1 (1,0–4,2)
|
0,707
|
AH 4
|
92,9 (88,4–97,6)
|
< 0,001
|
3,7 (2,1–6,5)
|
0,470
|
AH 5
|
96,2 (93,3–99,3)
|
0,704
|
1,7 (0,8–3,5)
|
0,669
|
AH 6
|
95,3 (91,0–99,8)
|
0,084
|
2,2 (1,0–5,1)
|
0,854
|
AH 7
|
94,7 (92,2–97,4)
|
0,041
|
2,5 (1,1–5,6)
|
0,908
|
Meio
|
88,2 (84,1–92,5)
|
< 0,001
|
3,8 (2,2–6,5)
|
0,276
|
PBS
|
97,3 (93,2–100,0)
|
Referência
|
2,6 (0,6–11,4)
|
Referência
|
48h
|
AH 1
|
95,7 (91,7–99,9)
|
0,097
|
2,4 (0,7–7,5)
|
0,095
|
AH 2
|
94,5 (91,2–97,8)
|
0,001
|
1,2 (0,8–1,9)
|
0,865
|
AH 3
|
94,1 (91,6–96,6)
|
< 0,001
|
2,6 (1,7–4,0)
|
0,272
|
AH 4
|
95,0 (90,6–99,7)
|
0,059
|
3,0 (1,6–5,5)
|
< 0,001
|
AH 5
|
95,8 (93,4–98,3)
|
0,089
|
2,8 (1,5–5,3)
|
< 0,001
|
AH 6
|
93,5 (88,7–98,5)
|
0,003
|
3,4 (1,7–6,7)
|
< 0,001
|
AH 7
|
92,7 (87,1–98,6)
|
0,011
|
2,3 (1,8–2,9)
|
0,173
|
Meio
|
86,1 (81,9–90,4)
|
< 0,001
|
5,7 (2,8–11,5)
|
0,002
|
PBS
|
98,1 (96,2–100,0)
|
Referência
|
1,3 (0,4–4,6)
|
Referência
|
72h
|
AH 1
|
93,9 (88,5–99,8)
|
0,049
|
3,2 (1,3–8,2)
|
0,105
|
AH 2
|
94,3 (91,8–96,8)
|
< 0,001
|
3,7 (2,4–5,8)
|
0,308
|
AH 3
|
93,6 (91,7–95,4)
|
< 0,001
|
5,6 (2,6–12,4)
|
0,123
|
AH 4
|
91,6 (86,7–96,8)
|
0,002
|
3,1 (1,5–6,3)
|
0,299
|
AH 5
|
88,5 (80,3–97,5)
|
0,007
|
7,3 (3,4–15,6)
|
0,025
|
AH 6
|
93,3 (89,4–97,3)
|
0,002
|
4,6 (2,5–8,4)
|
0,059
|
AH 7
|
92,7 (90,0–95,4)
|
< 0,001
|
2,9 (2,3–3,7)
|
0,534
|
Meio
|
82,6 (70,3–97,2)
|
0,009
|
4,4 (2,7–7,2)
|
0,091
|
PBS
|
98,6 (97,2–100,0)
|
Referência
|
2,1 (0,6–7,4)
|
Referência
|
Interação Célula/Ácido Hialurônico/Membrana de Colágeno (I/III)
Após a avaliação dos resultados da primeira etapa (interação AD-CTMs + AH), foram
selecionados cinco AHs com melhor taxa de viabilidade, além do meio (SFB) e o PBS,
e observamos uma variabilidade no número de células vivas em relação aos diferentes
tratamentos e tempos analisados. O tratamento com SFB apresentou melhor estabilidade
entre os tempos analisados, com excelentes taxas de células vivas, > 95%. No tempo
zero, observamos uma variação na porcentagem de células vivas entre 87 e 99,96%. Após
24 horas, observamos uma variação entre 41 e 100%, sendo que os ácidos 5, 2 e 1 apresentaram
maior índice de variabilidade ([Figura 2A]). Em 48 horas, a porcentagem de células vivas variou entre 65,8 e 100% e a maior
variabilidade ocorreu com os ácidos 4, 5 e 7 ([Figura 2B]). Em 72 horas, a variação de células vivas foi de 60 a 100%, sendo as maiores variabilidades
com os ácidos 1 e 5 ([Figura 2C]).
Fig. 2 Porcentagem de células vivas por tratamento em (A) 24 horas, (B) 48 horas e (C) 72
horas.
Na análise das médias estimadas de células vivas, o tratamento com SFB apresentou
a melhor taxa de células vivas em 24, 48 e 72 horas, sendo significativo em 24 horas
(95,8%) em comparação com o PBS ([Tabela 3]). Em 48 horas, o tratamento com os ácidos 1 e 5 mostraram-se inferiores, com significância
estatística ([Tabela 3]). Após 72 horas, porém, não observamos diferenças em comparação com o PBS. Ao compararmos
todos os tratamentos, nos 3 tempos, observamos que os ácidos 1 e 5 apresentaram inferioridade
em relação ao SBF, com relevância estatística ([Tabela 4]).
Tabela 3
Momento
|
Tratamento
|
Média estimada (IC95%)
|
valor-p
|
24h
|
SFB
|
95,8 (93,4–97,4)
|
< 0,001
|
Ácido 7
|
86,3 (77,7–91,5)
|
0,826
|
Ácido 5
|
81,3 (72,3–87,3)
|
0,350
|
Ácido 4
|
86,6 (81,8–90,2)
|
0,801
|
Ácido 2
|
81,2 (61,8–90,7)
|
0,429
|
Ácido1
|
83,7 (74,4–89,6)
|
0,555
|
PBS
|
87,8 (74,5–94,1)
|
Referência
|
|
SBF
|
95,0 (93,3–96,3)
|
0,395
|
|
Ácido 7
|
93,0 (88,9–95,5)
|
0,755
|
|
Ácido 5
|
86,9 (79,3–91,8)
|
0,017
|
48h
|
Ácido 4
|
88,6 (78,6–93,9)
|
0,222
|
|
Ácido 2
|
92,9 (89,8–95,0)
|
0,699
|
|
Ácido 1
|
89,5 (86,7–91,7)
|
0,033
|
|
PBS
|
93,8 (90,9–95,7)
|
Referência
|
|
SFB
|
95,6 (93,3–97,0)
|
0,063
|
|
Ácido 7
|
89,7 (84,8–93,0)
|
0,765
|
|
Ácido 5
|
86,1 (78,2–91,1)
|
0,749
|
72h
|
Ácido 4
|
90,8 (81,7–95,4)
|
0,674
|
|
Ácido 2
|
92,5 (87,7–95,4)
|
0,298
|
|
Ácido1
|
85,5 (79,7–89,6)
|
0,671
|
|
PBS
|
88,4 (75,9–94,4)
|
Referência
|
Tabela 4
Momento
|
Comparação
|
Valor-p corrigido
|
|
SFB
|
x
|
Ácido 7
|
0,105
|
|
SFB
|
x
|
Ácido 5
|
0,003
|
|
SFB
|
x
|
Ácido 4
|
< 0,001
|
|
SFB
|
x
|
Ácido 2
|
0,497
|
|
SFB
|
x
|
Ácido1
|
0,028
|
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 5
|
0,497
|
24h
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 4
|
0,497
|
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
|
Ácido 4
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
|
Ácido 4
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
|
Ácido 2
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
48h
|
SFB
|
x
|
Ácido 7
|
> 0,99
|
SFB
|
x
|
Ácido 5
|
0,017
|
SFB
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
SFB
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
SFB
|
x
|
Ácido 1
|
0,033
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 5
|
0,197
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 1
|
> 0,99
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 1
|
> 0,99
|
Ácido 4
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
Ácido 4
|
x
|
Ácido 1
|
> 0,99
|
Ácido 2
|
x
|
Ácido 1
|
0,204
|
|
SFB
|
x
|
Ácido 7
|
0,002
|
72h
|
SFB
|
x
|
Ácido 5
|
0,012
|
SFB
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
SFB
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
SFB
|
x
|
Ácido1
|
< 0,001
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 5
|
> 0,99
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
Ácido 7
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 4
|
> 0,99
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
Ácido 5
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
Ácido 4
|
x
|
Ácido 2
|
> 0,99
|
Ácido 4
|
x
|
Ácido1
|
> 0,99
|
Ácido 2
|
x
|
Ácido1
|
0,213
|
Discussão
O presente estudo demonstrou que o ácido hialurônico é um produto biocompatível com
as células mesenquimais provenientes do tecido adiposo. Não foi possível estabelecer
uma relação entre a viabilidade e o tipo de preparação comercial do produto. A manipulação
celular também sofreu interferência de acordo com a viscosidade da formulação. O meio
com SFB resultou em uma melhor taxa de viabilidade em todos os tempos analisados (24,
48 e 72 horas), ∼ 95%, superior aos produtos testados. Houve diferença estatística
apenas em 24h (SBF versus PBS) e, neste tempo, os produtos de AH apresentaram desempenho semelhante ao do PBS.
Nos demais tempos, considerando o PBS como referência, não houve diferença.
O AH tem sido amplamente utilizado como biomaterial por suas características de biocompatibilidade
e biodegradabilidade. Entretanto, na literatura, há poucos dados quanto ao seu efeito
in vitro sobre as CTMs.[13]
[17]
[18] Ding et al.[17] avaliaram o efeito do AH sobre AD-CTMs provenientes da gordura de Hoffa, concluindo
que uma concentração de entre 25 e 75% de AH não afeta a proliferação celular. Os
autores concluíram que a presença de AH não é tóxica, não alterou a expressão do marcador
CD44 (receptor de AH), e tampouco apresentou indução da diferenciação condrogênica
das células no curto intervalo de 7 dias, caracterizando o AH como veículo apropriado
para injeção das AD-CTMs.[17]
Succar et al.[19] avaliaram o efeito de diferentes concentrações de AH de alto peso molecular (0,5
a 5,0 mg/mL) nas CTMs, mensurando a aderência e a proliferação em superfície plástica
e em ensaios de adesão da cartilagem. Uma das hipóteses é que a alta viscosidade influenciaria
negativamente a ligação com as células, o que se confirmou ao ser verificado que quanto
maior a concentração, menor a aderência, e que o AH tem efeito dose-dependente na
cinética do crescimento celular nas concentrações > 1 mg/mL.[19] Durante o nosso estudo, percebemos a interferência negativa da viscosidade elevada
na manipulação celular; entretanto, não conseguimos estabelecer relação com a concentração
dos produtos. Uma limitação é que, nas análises de interação célula + AH + membrana,
não avaliamos os produtos com a menor concentração devido ao resultado insatisfatório
observado na viabilidade celular.
Assim, acredita-se que o peso molecular e a viscosidade possam ser os responsáveis
pelas diferenças encontradas. Dentre as marcas pesquisadas, o Suprahyal (Meiji Seika,
Pharma, Tóquio, Japão) apresentou a maior quantidade de AD-CTMs viáveis no término
do período analisado, sendo o produto com o menor peso molecular testado (0,75 MDa).
Este resultado pode estar relacionado com a evidência de que AH de alto peso molecular
age como inibidor da angiogênese e da proliferação celular, além de ter efeito anti-inflamatório
e imunossupressor.[6] Portanto, pode-se sugerir que a viabilidade celular pode estar diretamente relacionada
à concentração e ao peso molecular do AH utilizado e que isto pode ser um fator determinante
no sucesso do tratamento da lesão condral.[20] Deve-se mencionar que os resultados são pertinentes à influência do AH nas AD-CTMs
no contexto da engenharia tecidual, e não à sua utilização como viscossuplementação
no tratamento da osteoartrite.
O presente estudo não está isento de limitações. Trata-se de um estudo laboratorial
com resultados experimentais que não devem ser extrapolados para a rotina clínica,
embora possam nortear pesquisas futuras. Um número reduzido de amostras foi analisado,
apesar do alcance estatístico da amostra.
Conclusões
O SFB apresentou melhor desempenho para a manutenção da viabilidade das AD-CTMs em
comparação com produtos comerciais de AH, sem e com membrana de colágeno. Além disso,
o AH pode ser um meio para a associação de células-tronco mesenquimais do tecido adiposo.