CC BY-NC-ND 4.0 · Rev Bras Ortop (Sao Paulo) 2022; 57(03): 449-454
DOI: 10.1055/s-0041-1724071
Artigo Original

Questionários Disability of the Arm Shoulder and Hand e Michigan Hand: Explorando a responsividade e performance diagnóstica em amostra de pacientes ambulatoriais com e sem queixas nas mãos e punho[*]

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1   Serviço de Cirurgia da Mão, Hospital Alvorada, Moema, São Paulo, SP, Brasil
2   Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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1   Serviço de Cirurgia da Mão, Hospital Alvorada, Moema, São Paulo, SP, Brasil
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1   Serviço de Cirurgia da Mão, Hospital Alvorada, Moema, São Paulo, SP, Brasil
2   Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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1   Serviço de Cirurgia da Mão, Hospital Alvorada, Moema, São Paulo, SP, Brasil
2   Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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1   Serviço de Cirurgia da Mão, Hospital Alvorada, Moema, São Paulo, SP, Brasil
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1   Serviço de Cirurgia da Mão, Hospital Alvorada, Moema, São Paulo, SP, Brasil
2   Departamento de Ortopedia e Traumatologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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Resumo

Objetivo Verificar se, em uma população adulta com queixa não traumática dos membros superiores, (1) os questionários Disability of the Arm, Shoulder and Hand (DASH, na sigla em inglês) e Michigan Hand Questionnaire (MHQ, na sigla em inglês) estão suscetíveis ao “efeito de teto”, comparando com amostra de não-doentes; (2) determinar pontos de corte de performance diagnóstica e correlação interquestionários para DASH e MHQ em ambas as amostras.

Método Estudo prospectivo, comparativo e não randomizado. Incluímos 150 pacientes, 75 no grupo caso (com doença) e 75 no grupo controle (sem doença). Trata-se de amostra de pacientes recém-admitidos em ambulatório de cirurgia da mão. Os controles foram pareados de forma balanceada de acordo com a inclusão dos casos. Determinamos a presença de efeito de teto por meio da taxa de respostas máximas (> 15%) e associamos curvas receiver operating characteristic (ROC, na sigla em inglês) para a determinação de pontos de corte para a determinação de doentes, associados a medidas de sensibilidade e especificidade. Consideramos p < 0.05 para significância estatística.

Resultados Os questionários DASH e MHQ não demonstraram o efeito de teto para o grupo com doença. A porcentagem de pacientes do grupo caso com nota máxima foi de n = 18 (24%) no DASH e de 0% no MHQ. Para o grupo sem doença, 1 (1,33%) dos participantes pontuou com nota máxima para DASH, enquanto nenhum pontuou para o MHQ. Na determinação de casos, escores de DASH de 7,1 apresentam sensibilidade de 80% e especificidade de 60,3%. Para o MHQ, um escore de 76,9 apresenta sensibilidade de 56,2% e especificidade de 97,3%.

Conclusão Os questionários DASH e MHQ são ferramentas confiáveis na mensuração do impacto das morbidades das mãos e dos punhos nas atividades diárias dos pacientes e não são suscetíveis a efeito de teto. O questionário DASH é mais sensível para a identificação de doentes, enquanto o MHQ é mais específico. Em situações nas quais se espera um incremento funcional mais discreto (ou mais específico), o MHQ parece mais adequado.


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Introdução

A mão é um dos segmentos mais importantes do corpo humano para a realização das atividades diárias. É sabido que doenças dos membros superiores impactam na função e na qualidade de vida. Entretanto, há um enorme contingente de doenças a ser explorado, com apresentações e morbidades distintas. Existem várias maneiras de avaliar a função da mão e do membro superior. No cenário da pesquisa, os questionários de autoavaliação são de uso disseminado. Na cirurgia da mão, são de uso disseminado o questionário Disability of the Arm, shoulder and Hand (DASH, na sigla em inglês)[1] [2] e o questionário Michigan Hand Outcomes (MHQ, na sigla em inglês).[3]

O questionário DASH, criado em 1994 pelo Institute for Work and Health de Ontário, foi desenvolvido com o objetivo de mensurar o impacto causado por vários distúrbios dos membros superiores. Trata-se de um questionário autoaplicado no qual o paciente avalia a função do próprio membro superior com 30 itens que recebem uma nota de 0 a 5. A pontuação máxima do questionário é 100, e corresponde a incapacidade máxima, sendo 0 equivalente à ausência de incapacidade no membro superior.[2] [4]

O MHQ é um questionário específico para mãos e punhos com o objetivo de avaliar fatores importantes apontados pelos pacientes, terapeutas em mão e cirurgiões de mão. Ele consiste em 100 perguntas hipotéticas e é dividido em 6 partes: 1) função da mão toda; 2) atividades da vida diária; 3) dor; 4) desempenho no trabalho; 5) estética; 6) satisfação do paciente com a função da mão.[3] [5]

Uma das maneiras de avaliar a responsividade de um questionário é verificar a presença do efeito de teto do mesmo.[6] O efeito de teto ocorre quando uma grande quantidade de pessoas atinge a nota máxima no teste, mesmo quando alguma patologia está presente.[4] Nesta situação, existe a preocupação de se um determinado questionário é capaz de discernir os pacientes doentes dos não doentes.

De acordo com McHorney et al.,[7] o efeito de teto está presente quando > 15% dos pacientes atingem a maior nota possível na pontuação. Wang et al.[6] consideram o efeito presente quando a porcentagem é > 20%. O presente estudo parte da hipótese de que os questionários citados podem não ser adequados para a mensuração de diferenças entre grupos com doenças eletivas das mãos, pois o impacto destas condições é muito específico ou mínimo.

Dada a importância da avaliação objetiva da função de mãos e punhos, o presente estudo teve como objetivo mensurar a presença do efeito de teto para os questionários DASH e MHQ na avaliação de doenças comuns da cirurgia da mão, em um ambulatório de cirurgia da mão da cidade de São Paulo, SP, Brasil. Ademais, objetivou-se a determinação de pontos de corte para a determinação de doentes, associados às suas respectivas medidas de performance diagnóstica (sensibilidade e especificidade), para os questionários DASH e MHQ.


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Métodos

Estudo prospectivo, comparativo e não randomizado, desenvolvido no serviço de residência médica de cirurgia da mão de nossa instituição. Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) após a leitura e explicação da proposta do estudo. O presente estudo foi aprovado pelo comitê de ética sob o número 3.512.219. Participaram do estudo pacientes adultos provenientes do ambulatório do nosso hospital, localizado na cidade de São Paulo, SP, Brasil. Os controles foram coletados dentre o grupo de acompanhantes dos pacientes, bem como dentre voluntários do grupo assistencial do hospital.


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Critérios de Inclusão

Pacientes consecutivos adultos, com idades entre 18 e 70 anos, de ambos os sexos, pertencentes aos seguintes grupos:

Grupo 1: Pacientes com queixas clínicas nas mãos/punhos (dor, parestesia, nodulações e deformidades não traumáticas), admitidos para o estudo em estágio anterior a procedimentos terapêuticos (cirúrgicos e não cirúrgicos).

Grupo 2: Indivíduos sem quaisquer queixas referentes à mão e ao punho.


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Critérios de não inclusão

Tratamento cirúrgico prévio de qualquer patologia da mão e/ou do punho.

Recusa ao termo de consentimento.

Incapacidade de responder aos questionários (DASH e MHQ), devido a dificuldade cognitiva ou de escolaridade.


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Análise estatística

A análise descritiva foi exposta por médias associadas a desvios-padrão (DPs) para variáveis quantitativas. As proporções foram expostas, associadas aos intervalos de confiança (ICs) de 95%. Na análise inferencial, foram comparadas médias por meio do teste U de Mann-Whitney e de proporções pelo teste exato de Fisher. Associamos curvas ROC para determinação de sensibilidade e especificidade dos pontos de corte dos questionários DASH e MHQ. O ponto considerado ótimo foi aquele encontrado na região mais superior e à direta da curva (ponto presumido de maior acurácia da ferramenta). Adicionalmente, determinamos a consistência da curva receiver operating characteristic (ROC, na sigla em inglês) para DASH e MHQ por meio do cálculo da área abaixo da curva. Nesta análise, quanto mais próxima de um é a área, mais robusta é a curva ROC. Para a determinação de correlação entre os instrumentos, utilizamos a correlação de Spearman. Nesta, para fins de categorizar a correlação, utilizamo-la tal como proposta por Altman, que a define como: pobre, se < 20%; razoável, se entre 21 e 40%; moderada, se entre 41 e 60%; boa, se entre 61 e 80%; e muito boa, se entre 81 e 100%.[8] Para todas as análises inferenciais, consideramos um alfa de 5%.


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Cálculo Amostral

Considerando a diferença mínima para detecção do efeito de teto, que é de 20%, são necessários 73 pacientes para cada grupo, considerando-se o teste do qui-quadrado unicaudal, beta de 80% e alfa de 5%.


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Intervenções

Após a inclusão, foram aplicados, no mesmo momento, ambos os questionários (DASH e MHQ), e também foram obtidos dados demográficos: idade, gênero, escolaridade, profissão, comorbidades e doença que motivou a consulta.


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Desfechos

Disability of arm, shoulder and hand (DASH)

Questionário região-específico, autoaplicado. Mede a disfunção dos membros superiores. Em seu escore, considera a atividade de ambos os membros, de forma integral. Como o DASH mede disfunção, quanto maior seu escore, maior é a incapacidade auto-reportada. O DASH apresenta módulos adicionais que mensuram capacidade esportiva e atividades com instrumentos musicais. Para os fins do presente estudo, consideramos os 3 módulos: DASH-1, parte geral; DASH-2, atividades físicas e instrumentos musicais; e DASH-3, trabalho.


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Michigan Hand Questionnaire (MHQ)

Questionário região-específico, autoaplicado. É indicado para a avaliação geral de doenças da mão. Avalia dor, função, estética e satisfação. Sua avaliação diferencia entre mão esquerda e direita. Como o presente estudo apresenta um grupo de comparação sem doença, consideramos a média entre as mãos como medida de interesse. Como o MHQ mede função/satisfação, quanto maior seu escore, maior é a capacidade/satisfação auto-reportada.


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Desfechos primários

Determinação do Efeito de Teto

Escores de DASH e MHQ em ambas as populações, associados aos seus DPs. Para determinação da presença ou não dos efeitos de teto, comparamos a proporção de “notas máximas” do DASH e do MHQ em ambas as populações; com comparação da proporção de “notas máximas” do DASH e MHQ em ambas as populações, nos ativos economicamente e muito jovens (até 40 anos). Para o DASH, em relação ao efeito de teto, consideramos somente o módulo geral (DASH-1) para análise, visto que os outros módulos são de atividades complementares (esportes, instrumentos musicais, trabalho) ([Tabela 1]).

Tabela 1

Variável

Com doença

Sem doença

valor-p

Idade (média, DP)

41 (14,6)

38,7 (13,3)

0,33

Escolaridade superior ( n , %)

39 (53,4)

41 (56,2)

0,86

Renda (mediana, IQ)

2,9 (2,8 - 5,7)

3,8 (2,8– 6,8)

0,61

Sexo feminino ( n , %)

53 (72,6)

41 (56,2)

0,04

Escolaridade superior ( n , %)

39 (53,4)

41 (56,2)

0,86

Renda (mediana, IQ)*

2,9 (2,8 - 5,7)

3,8 (2,8– 6,8)

0,61

DASH-1 (média, DP)

22,2 (18)

7,9 (8,4)

< 0,001

DASH-2 (média, DP)

4,3 (14,9)

3,1 (10,8)

0,76

DASH-3 (média, DP)

29,8 (23,7)

8,8 (12,9)

< 0,001

MHQ (média, DP)

60,1 (14,8)

71,3 (17,1)

< 0,001


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Perfomance diagnóstica

Comparamos grupos com e sem doença e criamos curvas ROC com o objetivo de determinar valores de performance (sensibilidade e especificidade) para ponto de corte. O ponto de corte foi determinado ao analisar o ponto mais a superior e à direita no gráfico (análise visual da curva ROC). Adicionalmente, expomos as razões de verossimilhança positivos (RV + ) e negativos (RV-). Os valores de RV+ variam de 1 a infinito. Valores maiores de RV+ aumentam a probabilidade de doença se o teste for positivo. Os valores de RV- variam de 0 a 1. Valores menores (próximos a 0) aumentam a probabilidade de não doença se o teste é negativo.


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Desfechos secundários

Realizamos correlação dos questionários DASH (DASH-1, DASH-2 e DASH-3) e MHQ (média das duas mãos) em ambas as populações.


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Resultados

Foram obtidos 75 pacientes para o grupo caso (20 homens e 55 mulheres) e 75 para o grupo controle (32 homens e 43 mulheres). No grupo caso, as doenças encontradas consistiam em tenossinovites (n = 34; 45,3%); síndrome do túnel do carpo (n = 24; 32%); cistos sinoviais do punho/mão (n = 16; 21,3%); artrites dos punho/mão (n = 8; 10,6%).


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Explorando o efeito teto

Somente um paciente do grupo sem doença apresentou-se com nota máxima para o DASH-1 e, no grupo com doença, 18 pacientes atingiram a nota máxima (1,3% versus 24%; teste exato de Fisher; p = 0.00). Para o MHQ, nenhum dos grupos apresentou nota máxima em sua avaliação. Isto demonstra que, para o MHQ, mesmo em não doentes, a ferramenta identifica potenciais limitações que podem não ser percebidas pelos pacientes.


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Performance dos instrumentos: definição de doentes e não doentes

Para o módulo geral do DASH (DASH-1), identificamos ponto de corte de 7,1, com sensibilidade de 80% e especificidade de 60,3% ([Figura 1]). Para o módulo de trabalho (DASH-3), identificamos ponto de corte de 9,4, com sensibilidade de 78,1% e especificidade de 65,8%. Para o MHQ, identificamos ponto de corte de 76,9, com sensibilidade de 56,2% e especificidade de 97,3% ([Figura 2]). Para o módulo de atividades físicas e trabalho (DASH-2), a análise preliminar da consistência dos dados (cálculo da área sob a curva) indicou não existir consistência suficiente para determinação de pontos de corte. As razões de verossimilhança demonstram substancial habilidade do MHQ em determinar casos (teste positivo, probabilidade de doença alta), enquanto o DASH apresenta boa habilidade de identificar os não doentes (teste negativo, probabilidade de doença baixa) ([Tabela 2]).

Zoom Image
Fig. 1 Curva receiver operating characteristic (ROC) para DASH.
Zoom Image
Fig. 2 Curva receiver operating characteristic (ROC) para MHQ.
Tabela 2

Variável

Valor de corte

RV+

RV-

Area sob a curva

valor-p

DASH 1

7,1

2,0

0,33

0,77

< 0,001

DASH 2

Não calculado

Não calculado

Não calculado

0,51

0,86

DASH 3

9,4

2,28

0,33

0,78

< 0,001

MHQ

76,9

20,8

0,45

0,77

< 0,001


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Correlação entre os questionários DASH e MHQ nos grupos caso e controle

A relação entre os escores DASH e MHQ foi obtida através da correlação de Spearman. De acordo com a [Tabela 3], pode-se verificar que tanto no grupo caso quanto no grupo controle houve correlação entre as ferramentas, e esta obteve melhor performance entre o escore DASH-1 e MHQ média em ambos os grupos.

Tabela 3

Com doença

Correlação

Sem doença

Correlação

DASH 1 x DASH 2

-0,14

pobre

0,13

pobre

DASH 1 x DASH 3

0,74*

muito boa

0,76*

muito boa

DASH 2 x DASH 3

0,07

pobre

0,09

pobre

MHQ x DASH 1

-0,77*

muito boa

-0,61*

boa

MHQ x DASH 3

-0,77

muito boa

-0,49

moderada

Pode-se notar também que os resultados demonstram uma maior correlação no grupo caso do que no grupo controle.


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Discussão

No presente trabalho, pudemos avaliar ferramentas consagradas de função auto-reportada dos membros superiores e testar propriedades de responsividade e correlação. A hipótese de que o efeito de teto pudesse subestimar os valores de DASH e MHQ levantada no início do trabalho não foi confirmada, demonstrando boa especificidade dos instrumentos em doenças, mesmo que pouco mórbidas e debilitantes, tais como cistos sinoviais e tenossinovites. Nossa hipótese se baseava no fato de que pequenas doenças da mão eventualmente não impactassem de forma significante a performance para atividades de vida diária, que é o principal método de mensuração do DASH e do MHQ.[9] Os autores relatam que, para definir efeito de teto, deve se identificar > 15%[4] ou > 20%[6] dos pacientes com nota máxima nos testes em pacientes doentes.[10]

Neste contexto, identificamos na população não doente 1 caso (1,3%) de nota máxima. No grupo com doença, encontramos 18 (24%) dos participantes com nota máxima para o questionário, o que mostra a robustez psicométrica do questionário DASH para diferenciação entre doentes e não doentes. Já para o MHQ, ocorreu que em nenhum dos grupos os pacientes atingiram a nota máxima. Uma revisão recente sugere que o MHQ, por apresentar alta consistência interna, é mais capaz de identificar menores ganhos funcionais e, consequentemente, efeitos de tratamento menores.[11] Em contrapartida, o MHQ é uma ferramenta mais redundante quando o efeito de tratamento parece mais evidente. Na prática, quando se espera modesto ganho funcional, tal como na liberação de uma pequena corda na doença de Dupuytren, o MHQ apresenta melhor especificidade. Em condições nas quais o efeito de tratamento parece mais exuberante, tal como na descompressão do nervo mediano na síndrome do túnel do carpo, essa especificidade do MHQ parece se diluir, o que torna o DASH uma melhor opção – por se apresentar mais responsivo neste cenário e de mais fácil aplicação. É também relevante colocarmos na escolha a diferença clínica minimamente relevante, que é, na prática, o quanto um escore precisa modificar para que o paciente perceba o evento/intervenção. Este fenômeno já foi explorado pelos mesmos autores.[12]

Os resultados demonstram que tanto o DASH quanto o MHQ apresentam boa ou muito boa correlação. Os módulos de DASH (geral e trabalho) também se intercorrelacionam de forma bastante satisfatória. Já para o módulo de esportes e instrumentos musicais, obtivemos sempre correlações pobres, pois trata-se de um cenário – prática de esportes ou de instrumentos musicais – bastante heterogêneo entre as populações. Na prática, a diretriz dos desenvolvedores de DASH relata que este módulo deve ser utilizado somente para subpopulações específicas: de atletas e músicos. Destaque positivo se deve ao fato de que os coeficientes de correlação são mais robustos no grupo de doentes, o que fortalece a capacidade psicométrica dos instrumentos.

Em relação à aplicação dos questionários, algumas dificuldades podem ser notadas, como a grande quantidade de questões e a mudança de escala no questionário MHQ, causando desmotivação e confusão, respectivamente, no ato do preenchimento. McMillan et al.[13] fizeram uma comparação da responsividade dos questionários DASH, MHQ e Patient-Specific Functional Scale (PSFS, na sigla em inglês), e encontraram maior responsividade do DASH em pacientes com tumores, do MHQ em pacientes com síndrome do túnel do carpo e dores no punho, e do PSFS em pacientes com contratura dos dedos.

Apesar de diferentes entre si, ambos os questionários se mostraram instrumentos importantes na mensuração do impacto das doenças das mãos e punhos nas atividades diárias dos doentes. É nossa impressão que os questionários são, de certa forma, complementares: pois enquanto o MHQ consegue "discriminar mais” pequenas alterações do estado de saúde, o DASH[14] consegue identificar melhor os “casos" e excluir melhor os não-doentes (razão de verossimilhança negativa baixa). Na prática, parece sensato optar pelo MHQ quando diante de uma avaliação comparativa bem específica (por exemplo, comparação de duas alternativas de tratamento para rizartrose), e utilizar o DASH para estudos mais amplos, de viés populacional. Neste cenário, a utilização dos instrumentos de forma resumida pode ser uma alternativa. A forma abreviada do MHQ (Brief-MHQ, na sigla em inglês) parece ser uma boa opção frente à sua versão original. Estudos já demonstram capacidade psicométrica equivalente entre as formas abreviadas do Brief-MHQ,[15] [16] do DASH (Quick-DASH, na sigla em inglês) e de outros instrumentos consagrados.[17] Estas alternativas têm especial apelo quando é desejo do pesquisador mensurar múltiplos desfechos, pois abrevia as mensurações, sem que exista potencial perda de qualidade.


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Conclusão

Os questionários DASH e MHQ são instrumentos robustos, responsivos, e não são suscetíveis a efeito de teto, não confirmando a hipótese levantada inicialmente sobre o efeito. Os testes estão bem correlacionados principalmente em pacientes doentes. O questionário DASH é mais sensível para identificação de doentes, enquanto o MHQ é mais específico. Em situações nas quais se espera incremento funcional mais discreto (ou mais específico), o MHQ é mais adequado. Em situações nas quais se planeja avaliações populacionais, o DASH é mais adequado.


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Conflitos de Interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Agradecimentos

Agradecimentos a Giovanna Arcaro de Lima pelo suporte.

Suporte Financeiro

Não houve suporte financeiro de fontes públicas, comerciais, ou sem fins lucrativos.


* Trabalho desenvolvido no Serviço de Residência Médica de Cirurgia e Microcirurgia da Mão do Hospital Alvorada, São Paulo, SP, Brasil.


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Endereço para correspondência

Vinícius Ynoe de Moraes, PhD
Rua Borges Lagoa, 786, São Paulo, SP, 04041050
Brasil   

Publication History

Received: 19 June 2020

Accepted: 14 October 2020

Article published online:
30 June 2022

© 2022. Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. This is an open access article published by Thieme under the terms of the Creative Commons Attribution-NonDerivative-NonCommercial License, permitting copying and reproduction so long as the original work is given appropriate credit. Contents may not be used for commecial purposes, or adapted, remixed, transformed or built upon. (https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/)

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Fig. 1 Curva receiver operating characteristic (ROC) para DASH.
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Fig. 2 Curva receiver operating characteristic (ROC) para MHQ.
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Fig. 1 Receiver operating characteristic (ROC) curve for the Disability of the Arm, Shoulder and Hand (DASH) questionnaire.
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Fig. 2 Receiver operating characteristic (ROC) curve for the Michigan Hand Outcomes questionnaire (MHQ).