Palavras-chave
vasa vasorum
- artéria carótida interna - circulação colateral - neovascularização fisiológica
- estenose das carótidas - angiografia
Keywords vasa vasorum - carotid internal artery - collateral circulation - neovascularization
physiologic - carotid stenosis - angiography
Introdução
A recanalização da artéria carótida interna (ACI) via vasa vasorum é um fenômeno raro.[1 ]
[2 ]
[3 ]
[4 ] O diagnóstico definitivo deve ser realizado pela arteriografia cerebral. Os métodos
usados de rotina em triagens podem subestimar os casos de circulação colateral pela
vasa vasorum da ACI.[2 ] Atualmente, estudos com o uso de angiotomografia ou angiografia por ressonância
magnética aumentam as possibilidades de identificação desses achados.[2 ]
A vasa vasorum é responsável pela nutrição da túnica adventícia e parte da túnica médica da artéria
carótida. Ela se origina diretamente do lúmen da ACI, mas pode surgir também das artérias
tireóidea superior e faríngea ascendente e, nesses casos, participam no processo de
revascularização via vasa vasorum .[5 ] Em estudo realizado em cadáveres, concluiu-se que esse padrão de neovascularização
da ACI por vasa vasorum é mais prevalente através de túnica adventícia das artérias proximais como carótida
interna, basilar e vertebral.[6 ] A formação neovascular também pode ser encontrada através do interior da placa/trombo,
assumindo aspecto menos tortuoso.
O presente artigo demonstra o padrão de circulação colateral em doenças obstrutivas
da artéria carótida interna através de anastomoses com a vasa vasorum e a contribuição do sistema faríngeo ascendente neste tipo de revascularização.
Relato dos Casos
Nove pacientes que apresentavam doença aterosclerótica que envolvia a bifurcação das
artérias carótidas comuns receberam diagnóstico de oclusão da carótida interna.
Estes pacientes foram identificados em avaliação de ataque isquêmico transitório (AIT)
ou através de triagem cardiovascular com doppler carotídeo, no Hospital Vila da Serra e no Biocor Instituto em Belo Horizonte/MG entre
os anos 2000 e 2012. Destes pacientes, cinco pertenciam ao sexo feminino e quatro
ao sexo masculino, com média de idade de 68 anos.
Sete pacientes apresentavam alterações neurológicas breves compatíveis com AIT. Foram,
então, após avaliação inicial, submetidos à arteriografia cervicocraniana, através
da qual se notou vasos serpiginosos múltiplos, configurando aspecto típico de neovascularização
por vasa vasorum ([Figs. 1 ] a [2 ]
[3 ]
[4 ]
[5 ]
[6 ]
[7 ]).
Fig. 1 Presença de vasa vasorum (seta) opacificando ACI.
Fig. 2 Bifurcação carotídea esquerda revela carótida com fundo cego (seta inferior). À observação
minuciosa pode-se notar a presença da vasa vasorum (seta superior).
Fig. 3 A aproximação do cateter, após visualização de oclusão da ACI em uma primeira injeção
de contraste, mostra a revascularização por vasa vasorum (seta).
Fig. 4 A aproximação do cateter até a bifurcação carotídea revelou a existência de neovascularização
por vasa vasorum (seta inferior) e pelo sistema faríngeo ascendente (seta superior).
Fig. 5 ACI com padrão vasa vasorum (setas).
Fig. 6 Revascularização por vasa vasorum (seta superior) e pelo sistema faríngeo ascendente (seta inferior).
Fig. 7 Único caso com oclusão carotídea bilateral com o padrão vasa vasorum (indicado pelas setas). Pode-se observar em (a), a ACI direita; e em (b), a ACI esquerda.
Um paciente, em investigação cardiovascular por doppler carotídeo, apresentava oclusão da ACI direita. No ano seguinte, novo doppler revelou a presença de fluxo no vaso. Seguiu-se investigação com angiorressonância
que evidenciou um padrão atípico de circulação. Para esclarecimento, foi realizada
arteriografia que mostrou o padrão de neovascularização por vasa vasorum ([Figs. 8A–C ]).
Fig. 8 Em (a), nota-se a coexistência de dois sistemas vasculares atípicos (indicados pelas
setas) que emergem da ACI ocluída. Em (b), seleção de um dos sistemas (vasa vasorum − seta). Em (c), seleção do outro sistema (artéria faríngea − seta inferior). Esses
sistemas se unem formando a ACI intracraniana (seta superior).
Em um paciente portador de fibrilação atrial, em triagem cardiovascular, foi observado
padrão de neovascularização por vasa vasorum sem lesões ateroscleróticas significativas nas carótidas ([Fig. 9 ]). Acredita-se que a obstrução carotídea seja decorrente de possíveis êmbolos de
origem cardíaca.
Fig. 9 Presença de neovascularização por vasa vasorum (indicado pelas setas).
Como este padrão de circulação colateral não acarreta riscos adicionais de novos eventos
isquêmicos foi adotada a conduta conservadora em todos os casos.
Discussão
Circulação colateral por vasa vasorum da ACI ocluída é um fenômeno raro que ocorre mais comumente em pacientes com doença
aterosclerótica avançada.[3 ]
[4 ]
[6 ] A proliferação de vasa vasorum em placas ateromatosas está relacionada aos fatores angiogênicos e vascular para
a íntima lesionada. Com a progressão da doença, com consequente oclusão carotídea,
a vasa vasorum passa a atuar como um meio de revascularização.[3 ]
[7 ]
Aspectos serpiginosos e múltiplos desses pequenos vasos os diferem da suboclusão carotídea
(string sign ), que é composto por filamento único e irregular, no mesmo trajeto da carótida interna.[8 ]
Takaba et al.[6 ] identificaram circulação por vasa vasorum com maior prevalência em pacientes entre 60 e 69 anos.
Os nove casos relatados neste artigo apresentaram reestabelecimento da circulação
carotídea por circulação colateral, distinguindo-os da doença suboclusiva da artéria
carótida, principalmente na angioarquitetura. É importante esse diagnóstico diferencial
para evitar tratamento cirúrgico desnecessário, já que não se encontra base científica
para seu emprego neste tipo de revascularização.