Palavras-chave
articulação do cotovelo - luxações articulares - rádio - ligamentos articulares
Introdução
A luxação isolada da cabeça do rádio em adultos é uma lesão incomum; portanto, é fácil deixar de diagnosticá-la. Há pouco mais de 20 casos de luxação pós-traumática isolada da cabeça do rádio relatados na literatura mundial.[1] A maioria dos casos relatados é de luxação posterior da cabeça do rádio.[2] Apenas cinco casos de luxação anterior da cabeça do rádio foram relatados,[2]
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[6] e os pacientes chegaram ao hospital com restrição dos movimentos de supinação–pronação do antebraço e manutenção da extensão–flexão da articulação do cotovelo.[1] A redução fechada foi bem-sucedida na maioria dos casos.[7] Relatamos um caso incomum de luxação anterior isolada da cabeça do rádio com apresentação atípica em um adulto, com manutenção dos movimentos de supinação–pronação, mas restrição da extensão–flexão da articulação do cotovelo, em que a redução aberta precisou ser realizada porque a redução fechada foi ineficaz devido à presença de um orifício intracapsular em casa de botão na cabeça do rádio.
Relato de Caso
Um homem de 18 anos, estudante universitário, sofreu uma lesão no cotovelo esquerdo ao praticar luta greco-romana em uma academia. Ele caiu para trás com a mão estendida e o punho em flexão dorsal. Queixou-se de dor e inchaço no aspecto anterior do cotovelo esquerdo, e foi imediatamente levado ao pronto-socorro (PS) de nosso hospital. O cotovelo foi mantido em flexão e pronação parcial. O aspecto anterolateral do cotovelo esquerdo estava dolorido, e a cabeça do rádio era palpável anteriormente. Não havia aumento de volume ou dor sobre a ulna, o antebraço e a articulação rádio-ulnar distal. O paciente apresentava restrição dos movimentos de flexão–extensão e amplitude de movimentação ativa de 30 a 100 graus, mas sem restrição dos movimentos de supinação e pronação do antebraço. A condição neurovascular distal do membro superior esquerdo era normal. Uma radiografia foi realizada, e mostrou luxação anterior isolada da cabeça do rádio ([Fig. 1]). A redução fechada foi tentada no PS com o uso de manobras de supinação e pronação, mas foi ineficaz. Uma tomografia computadorizada do cotovelo foi feita para descartar a presença de qualquer fragmento ósseo pequeno que dificultasse a redução ([Fig. 2]). O paciente recebeu uma tipoia com manga para antebraço, uma bolsa de gelo e analgésicos, e foi aconselhado acerca da necessidade de redução aberta. A abordagem de Boyd foi usada para a exposição da cabeça do rádio. Um plano foi feito entre os músculos extensor ulnar do carpo (EUC) e o ancôneo. Um orifício intracapsular em casa de botão na cabeça do rádio foi observado durante o procedimento cirúrgico e corrigido. A cabeça do rádio foi reduzida, com flexão de 90 graus na articulação do cotovelo e antebraço em supinação completa. No entanto, a redução foi instável devido à ruptura do ligamento anular. Portanto, o ligamento anular foi reparado. Um fio de Kirschner rádio-ulnar foi introduzido para manter a redução da articulação rádio-ulnar proximal ([Fig. 3]), mantendo, assim, o ligamento anular livre de estresse, facilitando sua cicatrização. Uma tala gessada posterior foi colocada. A condição neurovascular distal pós-operatória era normal. O fio foi removido após 6 semanas ([Fig. 4]), quando começou a movimentação do cotovelo. O paciente foi submetido a um programa supervisionado de fisioterapia. Aos 12 meses de acompanhamento, a amplitude de movimento do paciente era de 0-140 graus no arco de flexão–extensão, com 70 graus de pronação e 85 graus de supinação ([Fig. 5]), o que condiz com os valores de referência da American Society for Surgery of the Hand. O paciente não apresentou nenhuma limitação na realização de atividades diárias, e retornou ao nível pré-lesão de atividade esportiva na escala de Tegner.
Fig. 1 Radiografia anteroposterior e em perfil do cotovelo esquerdo mostrando a luxação anterior isolada da cabeça do rádio.
Fig. 2 Imagem de tomografia computadorizada do cotovelo esquerdo mostrando a luxação anterior da cabeça do rádio sem fragmento ósseo intra-articular.
Fig. 3 Radiografia pós-operatória mostrando o fio de Kirschner introduzido pela articulação rádio-ulnar superior para a manutenção da redução.
Fig. 4 Radiografia anteroposterior e em perfil após a remoção do fio de Kirschner às 6 semanas.
Fig. 5 Amplitude de movimento aos 12 meses; (a) flexão, (b) extensão, (c) supinação, (d) pronação.
Discussão
A luxação anterior isolada da cabeça do rádio é muito pouco citada na literatura mundial. De modo geral, os pacientes apresentam manutenção da flexão–extensão na articulação do cotovelo, mas restrição dos movimentos de supinação–pronação do antebraço.[1] No caso aqui relatado, a apresentação era atípica, com restrição da flexão–extensão do cotovelo, mas manutenção dos movimentos de supinação–pronação do antebraço.
Vários mecanismos foram postulados para o deslocamento isolado da cabeça do rádio, como a ação de uma força de hiperpronação em um antebraço já em pronação, a queda para trás com o cotovelo estendido, ou a queda para frente com o cotovelo estendido, o antebraço em pronação e rolagem do corpo, aumentando a hiperpronação.[3] Neste caso, o mecanismo provável da lesão seria o primeiro. Takami et al[4] descreveram um mecanismo direto de lesão em que o trauma direto ocorre com o cotovelo semiflexionado e provoca o deslocamento anterior da cabeça do rádio.
Bonatus et al[3] especularam que a lesão ocorria em uma posição de hiperextensão e supinação, e também propuseram que a manobra de redução da luxação depende da posição inicial do antebraço. Os pacientes com antebraço em pronação necessitariam de uma força de supinação para redução e vice-versa. Isto ocorreu no presente caso, pois o paciente apresentou pronação, e a redução foi obtida com supinação.
A redução fechada da cabeça do rádio foi bem-sucedida na maioria dos casos.[7] Pouquíssimos casos exigiram a redução aberta. No presente caso, a redução fechada não foi eficaz, e, assim, a redução aberta foi realizada. Um orifício intracapsular em casa de botão na cabeça do rádio foi observado durante o procedimento cirúrgico, levando a uma tentativa frustrada de redução fechada. Ao liberá-lo, a cabeça do rádio foi reduzida com facilidade.
O ligamento anular é a estrutura mais importante que estabiliza a articulação rádio-ulnar proximal. A luxação da cabeça do rádio não é possível sem lesão do ligamento anular.[8] Neste caso, havia ruptura do ligamento anular; portanto, o reparo do ligamento anular foi realizado juntamente com a passagem de um fio de Kirschner rádio-ulnar superior. A estabilidade e função normal do cotovelo aos 12 meses de acompanhamento sugerem a cicatrização do ligamento anular.
O diagnóstico e a redução imediatos da luxação são de extrema importância. Existem algumas complicações associadas a essa lesão, como o cotovelo rígido, a instabilidade recorrente da cabeça do rádio, e os problemas relacionados à fixação do fio de Kirschner. A instabilidade recorrente da cabeça do rádio é abordada com base na congruência de sua redução. Se a cabeça do rádio puder ser reduzida de forma congruente, a reconstrução do ligamento anular é o procedimento de escolha. Se houver alguma incongruência, a cabeça do rádio deve ser excisada.[2]
Em resumo, a luxação anterior isolada da cabeça do rádio é uma lesão rara. A manobra de redução depende da posição do antebraço à apresentação. A redução fechada pode não ser eficaz em todos os casos. Após a redução, a estabilidade deve sempre ser verificada. Essas lesões devem ser tratadas com prioridade para evitar rigidez do cotovelo e instabilidade recorrente da cabeça do rádio. Com o tratamento rápido e um protocolo fisioterápico regular e supervisionado, o paciente pode recobrar a amplitude normal de movimento e a função do cotovelo.